Política

Infectologista diz à CPI que deixou secretaria de combate à Covid por veto do Planalto

02 jun 2021, 17:31 - atualizado em 02 jun 2021, 17:31
Luana Araújo
Se o veto ao meu nome foi por conta da minha posição científica, técnica, necessária para exercer esse cargo, a mim só me resta lamentar (Imagem: REUTERS/Adriano Machado)

A infectologista Luana Araújo, convidada pelo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, para assumir uma secretaria especial de combate à Covid-19, disse nesta quarta-feira à CPI que deixou o cargo após apenas 10 dias porque não foi aprovada pelo Palácio do Planalto.

Em seu depoimento, Araújo relatou ter sido informada que, apesar do convite de Queiroga, não poderia ser nomeada porque seu nome não passaria pela Casa Civil.

Em seguida, corrigiu, afirmando não ter certeza se a instância correta era mesmo essa, mas confirmando que havia sido vetada.

“Ele (o ministro) me disse isto: que lamentava, mas que meu nome não ia passar pela Casa Civil”, disse à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).

“O ministro, com toda a hombridade que ele teve ao me chamar, ao fazer o convite, me chamou ao final e disse que lamentava, mas que a minha nomeação não sairia, que meu nome não teria sido aprovado.”

De fato, as nomeações para cargos de segundo e terceiro escalão no governo federal passam pela Casa Civil e são assinadas pelo ministro da pasta e pelo ministro da área específica.

Graduada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e com mestrado em saúde pública pela Universidade John Hopkins, nos Estados Unidos, Araújo foi escolhida para o cargo pelo ministro da Saúde e contou aos senadores que chegou a trabalhar por 10 dias, mesmo sem a nomeação, até ser dispensada.

Após o anúncio público de sua nomeação por Queiroga, suas posições contrárias ao chamado “tratamento precoce”, defendido pelo presidente Jair Bolsonaro com medicamentos sem eficácia comprovada, foram divulgadas em reportagens.

Em postagens em redes sociais, a médica afirmou que o Brasil estava na “vanguarda da estupidez mundial” ao defender esse tipo de terapia, que chamou de “neocurandeirismo”.

A médica disse não saber se essa foi a razão do veto a seu nome, mas considerou trágica a hipótese de a negativa à nomeação ter como motivos seus posicionamentos de embasamento científico.

“Se o veto ao meu nome foi por conta da minha posição científica, técnica, necessária para exercer esse cargo, a mim só me resta lamentar”, declarou à CPI.

“Não sei se foi isso, mas se foi, considero isso trágico.”

Na semana passada, o ministro da Saúde indicou em audiência na Câmara dos Deputados que houve veto político à Araújo.

“Nós encaminhamos o nome dela para as instâncias do governo. Nós vivemos num regime presidencialista. Eu fui indicado por quem? Pelo presidente da República. É necessário que exista validação técnica e também política”, disse Queiroga.

Araújo disse ainda que, ao tentar montar uma equipe para a secretaria, teve dificuldades porque os melhores nomes não estavam dispostos a trabalhar para o governo.

Questionada sobre se teria falado sobre “tratamento precoce” com o ministro, a médica negou, dizendo que isso nunca foi assunto com o ministro.

A infectologista reiterou suas críticas à utilização da cloroquina, seja para prevenção, seja para tratamento da doença. Acrescentou que o medicamento já tem ineficácia comprovada no caso de uso contra a Covid-19.

“Essa é uma discussão delirante, esdrúxula, anacrônica e contraproducente. Quando eu disse que um ano atrás nós estávamos na vanguarda da estupidez mundial, eu infelizmente ainda mantenho isso em vários aspectos, porque nós ainda estamos aqui discutindo uma coisa que não tem cabimento. É como se a gente estivesse escolhendo de que borda da Terra plana a gente vai pular, não tem lógica”, afirmou.

Sobre a chamada imunidade de rebanho natural, em que uma população conseguiria estar protegida de uma doença a partir da contaminação de um grande número de pessoas, Araújo avaliou que não é uma “estratégia inteligente”.

A médica explicou que por se tratar de um vírus com base em material genético de RNA, o coronavírus tem grande capacidade de mutação, o que torna a imunidade de rebanho natural “impossível de ser atingida”.

Segundo ela, a estratégia para imunizar a população em larga escala passa pela vacinação, que consegue alcançar um grande número de pessoas ao mesmo tempo em um período idealmente curto. Araújo lembrou, ainda, que a vacinação traz uma imunidade de rebanho “sem sofrimento”.

Questionada sobre a realização da Copa América no Brasil, avaliou que a situação da pandemia no país é “no mínimo sensível” e ponderou que mesmo o uso de protocolos rígidos ameniza os riscos, mas não os anula.

Lembrou, ainda, que já não há mais tempo hábil para vacinar os envolvidos na realização dos jogos que ainda não tenham sido imunizados, razão pela qual considerou que o momento não é “oportuno” para a realização desse tipo de evento.

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