Igor Rodrigues: bitcoin como reserva de valor para o país
Em setembro, tivemos a adoção do bitcoin (BTC) como moeda oficial de El Salvador, adicionando a criptomoeda ao dólar americano como moedas nacionais.
Há poucas análises a serem feitas acerca de moeda fiduciária local, já que todos os países têm essa soberania de controle e impressão, porém, até chegar ao Bitcoin, precisamos dar um contexto geral de como o dólar americano se tornou reserva de valor de países, com o advento do Acordo de Bretton Woods, e as consequências de quando houve o abandono dessas regras.
O Acordo de Bretton Woods dá nome a uma série de disposições acertadas por 45 países aliados, em julho de 1944, cujo objetivo era definir os parâmetros que iriam reger a economia global após a Segunda Guerra Mundial.
O sistema financeiro a partir de Bretton Woods seria amplamente favorável aos Estados Unidos, que dali em diante teria o controle de boa parte da economia mundial, bem como de todo o seu sistema de distribuição de capitais.
O dólar americano se tornou moeda forte a partir da paridade com o ouro e nenhum dos outros países poderia ter sua moeda valorizada ou desvalorizada em mais de 1% em relação ao dólar.
Sendo assim, a grande referência de moeda seria sempre o dólar americano frente às demais moedas e também com um lastro definido ao ouro.
Isso correu bem pelos 20 anos seguintes, até que os EUA precisaram imprimir mais dólares para financiar o déficit orçamentário, devido à corrida espacial e à guerra do Vietnã, que aconteciam simultaneamente.
Para manter a paridade ao dólar, os outros países foram então obrigados a também imprimir mais moedas, resultando em pressão inflacionária a todos os países.
Foi então que, em 15 de agosto de 1971, o então presidente americano, Richard Nixon, colocou fim ao Acordo de Bretton Woods e à conversibilidade do dólar em ouro, anunciando a sua vontade de realinhar as taxas de paridade do dólar.
Naquele momento, o passivo norte-americano já era quase sete vezes maior que o estoque de ouro.
Para toda ação, há uma reação. Um dos principais resultados do abandono da paridade ao ouro foi uma forte subida nos índices de inflação dos EUA, conforme o quadro a seguir.
A adoção do dólar como reserva de valor é feita atualmente por vários bancos centrais ao redor do mundo, incluindo o Brasil. O dólar também é tido como moeda padrão em mercados internacionais de commodities e como padrão de preços de empresas globalizadas.
Se o poder de impressão de moedas fiduciárias está na mão de governos e bancos centrais, e os EUA têm a mais potente máquina de impressão, como seria então possível ter algum instrumento de proteção contra a inflação em dólares?
Qualquer meio alternativo que pudesse trazer essa proteção precisaria ser seguro, armazenado de forma privada, ter um fornecimento fixo ou quase fixo para evitar a impressão de novas moedas e ser transferível.
Satoshi Nakamoto foi o primeiro a trazer essa discussão na publicação do whitepaper do bitcoin, em 2009, quando apresentou que:
A raiz do problema com a moeda convencional é toda a confiança necessária para fazê-la funcionar. O banco central deve ser confiável para não depreciar a moeda, mas a história das moedas fiduciárias está cheia de violações dessa confiança.
Os bancos devem ser confiáveis para manter nosso dinheiro e transferi-lo eletronicamente, mas eles o emprestam em ondas de bolhas de crédito com apenas uma fração na reserva.
Assim, o Bitcoin pode ser um meio alternativo e plausível de reserva de valor ao ouro e ao dólar. Neste momento, seria o melhor candidato entre as criptomoedas de estrutura similar, devido à sua ampla adesão social e aos movimentos que estamos vendo, como em 7 de setembro deste ano, quando El Salvador implementou o bitcoin como moeda corrente no país e iniciou seu processo de acumulação de reservas.
Igor Rodrigues é diretor de trading da MezaPro, unidade de negócios da 2TM voltada a clientes institucionais e de alta renda.