‘Nova commodity’ pode ditar nova onda econômica global; EUA, China e outros 8 países já contam com planos de investimentos
O hidrogênio verde (H2V) — combustível produzido através da eletrólise da água (H2O), utilizando energia proveniente de fontes renováveis como solar, eólica, hidrelétrica e geotérmica — promete ser um ativo de extrema importância na nova onda econômica global. Seu processo de produção é totalmente livre de emissões de carbono.
Entre os diferenciais, a “nova commodity” pode substituir o carvão como redutor na produção de aço verde, além de poder ser usado para a produção de amônia, essencial para a fabricação de fertilizantes.
Atualmente, a produção de aço é responsável por cerca de 8% das emissões globais de gases de efeito estufa e a produção de fertilizantes por aproximadamente 2%, de acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA) e o Rocky Mountain Institute (RMI).
Para o professor da Universidade de Waterloo, Jesse Van Griensven Thé, pode-se esperar um mercado para essa commodity no curto prazo.
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“Este mercado está se desenvolvendo rapidamente, mesmo antes de a produção alcançar volumes suficientes para suprir a demanda crescente. Atualmente, empresas estão firmando Pre-Purchase Agreements (PPA), em que produtores e compradores concordam em transações futuras de hidrogênio verde (H2V)”, diz.
À medida que a produção mundial de H2V atingir milhões de toneladas, Van Griensven espera que surja uma bolsa de valores específica para o ativo, facilitando ainda mais as transações e estabilizando o mercado.
Desafios atuais da nova onda econômica
Segundo o professor, a nova onda econômica global enfrentará desafios significativos devido a cinco fatores principais: envelhecimento demográfico, desacoplamento da economia mundial da China, conflitos militares, escassez mineral e a falta de políticas efetivas por instituições governamentais.
“Esses obstáculos já estão causando atrasos substanciais no desenvolvimento de unidades produtivas de hidrogênio verde e na transição energética para a eliminação de emissões de gases de efeito estufa. A população nos países com capacidade de investimento está envelhecendo, resultando em uma força de trabalho em declínio e uma redução nas poupanças destinadas a investimentos. A partir de 2025, a retirada de recursos por parte dos aposentados deve aumentar, provocando um aumento nas taxas de juros e uma diminuição nos novos projetos de mitigação das mudanças climáticas”, vê.
Ele ainda comenta que o desacoplamento econômico da China está forçando empresas e países a investirem em novas unidades de produção, como fábricas, minas e infraestrutura. “Por exemplo, os EUA estão destinando mais de US$ 200 bilhões para novas fábricas de semicondutores, além de abrir novas minas para lítio e metais raros. Essa competição por investimentos está desviando subsídios que poderiam ser direcionados para energias limpas”, analisa.
Fora isso, a escassez mineral é outro ponto critico na visão de Van Griensven. “Até 2050, será necessário mais cobre do que todo o minerado desde a pré-história até 2024, além de uma produção de lítio dez vezes maior que a de 2024”, alerta.
O professor afirma ainda que, embora avanços tecnológicos possam melhorar a eficiência, as estimativas do World Economic Forum (WEF) indicam que a demanda por esses minerais continuará a crescer significativamente. “É imperativo modificar as legislações mundiais para acelerar a implantação de unidades de mineração, reduzindo os prazos de 10 a 15 anos para apenas um ou dois”, discorre.
Hidrogênio verde deve ser usado para equipamentos de grande escala
O especialista em combustíveis acredita que as vantagens do H2V se estendem apenas para equipamentos de larga escala, entre eles locomotivas, aviões e navios.
“O H2V é um produto nobre e temos boas alternativas para carros, tal como o etanol e a bateria para carros elétricos. Portanto, o primeiro passo para o H2V em carros deve ser na produção de aço verde para fabricação de veículos leves”, diz.
Nações na vanguarda do hidrogênio verde
Entre os países que estão destinando recursos para infraestrutura, tecnologias de produção e políticas de incentivo ao H2V, estão: EUA, Alemanha, Austrália, Coreia do Sul, Holanda, Japão, China, França, Noruega e Espanha.
No Inflation Reduction Act (IRA) de 2022, os EUA incluíram subsídios significativos para hidrogênio verde, com créditos fiscais de até US$ 3 por quilo de hidrogênio produzido por eletrólise usando energia renovável.
Na Alemanha, os investimentos giram em torno de € 9 bilhões no desenvolvimento de tecnologias de hidrogênio, como parte de sua Estratégia Nacional de Hidrogênio, que inclui € 2 bilhões para parcerias internacionais. O país também está envolvido em projetos como o H2Global, que visa facilitar o comércio internacional de hidrogênio verde.
A Austrália, aproveitando seus vastos recursos renováveis, anunciou um fundo de US$ 370 milhões para projetos de hidrogênio renovável. O país tem parcerias internacionais significativas, incluindo acordos com o Japão e a Coreia do Sul para exportação de hidrogênio verde.
Já a Coreia do Sul lançou uma estratégia nacional de hidrogênio com um investimento de US$ 37 bilhões até 2040, que inclui a construção de infraestrutura de produção e distribuição de hidrogênio.
Na Holanda, os planos de investimento buscam o desenvolvimento do “Vale do Hidrogênio”, em Groningen. O governo holandês está fornecendo subsídios e incentivos fiscais para estimular a produção e uso de hidrogênio verde.
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O Japão tem focado no uso do hidrogênio para transporte e energia, com grandes investimentos em pesquisa e desenvolvimento de tecnologias de hidrogênio. O governo japonês conta com políticas de apoio e subsídios para promover a adoção de hidrogênio, especialmente no setor de transporte.
A China, maior consumidor e produtor de hidrogênio no mundo, conta com grandes investimentos para ampliar sua produção. A nação desenvolve o maior projeto de hidrogênio verde do mundo, em Xinjiang.
A França, por sua vez, está investir € 7 bilhões até 2030 em sua estratégia de hidrogênio verde, que inclui desenvolvimento de infraestrutura e incentivos para indústrias utilizarem hidrogênio, além de menores custos na produção. O professor da Universidade de Waterloo comenta que grande parte do H2V produzido no país será realizado em usinas nucleares, o chamado “hidrogênio rosa”.
Como parte do seu plano de recuperação pós-Covid-19, a Espanha está investindo € 1,5 bilhões em projetos de H2V, com uma estratégia nacional que visa produzir 4 GW de capacidade de eletrólise até 2030.
A Noruega foca em projetos inovadores focados em hidrogênio de baixa emissão e investe em tecnologias de captura e armazenamento de carbono (CCS) para produzir hidrogênio azul e verde.
Por fim, Van Griensven ressalta que, embora o Brasil tenha grandes oportunidades e partes interessadas, a burocracia e a falta de novas regulamentações estão impedindo o avanço nessa lista.
Dados do Ministério de Minas e Energia (MME) apontam que o Brasil tem potencial técnico para produzir 1,8 bilhão de toneladas de hidrogênio por ano.