‘Governo parece gostar de inflação’, diz presidente da Febraban
O presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney, disse ao Estadão que a alta de tributos para o setor tornará mais caras linhas de crédito importantes para a recuperação econômica, como financiamento imobiliário e de veículo, crédito consignado e capital de giro.
Ele diz que a medida não ajuda o Banco Central, que está sozinho no “dificílimo” desafio de mitigar os efeitos da inflação de dois dígitos.
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:
Depois de uma novela de meses, o governo aumentou a tributação dos bancos para fazer o Refis do Simples. O que o sr. achou dessa opção?
Isaac Sidney: Ao aumentar impostos, o governo errou e escolheu, de novo, onerar o consumidor, o que vai encarecer ainda mais o crédito bancário. É intrigante que, havendo setores muito mais lucrativos e com volumes elevados de incentivos fiscais, os bancos venham a ser penalizados com mais carga tributária.
Nesses dois anos de pandemia, os bancos foram essenciais para preservar empregos e empresas com R$ 8,5 trilhões em crédito, irrigando toda a economia. Fomos o 16º setor mais rentável em 2020, ou seja, 15 outros ficaram à frente no quesito rentabilidade, mas só os bancos estão pagando a conta.
Qual a consequência para o crédito?
Sidney: É, no mínimo, uma péssima sinalização para quem precisa de crédito. Qualquer porcentual de aumento de imposto para os bancos impacta diretamente no custo dos empréstimos, que já estão caros.
A incidência de mais impostos sobre o crédito, mesmo com um pequeno aumento temporário, pressiona o spread (a diferença entre o custo de captação do dinheiro pelo banco e o que ele cobra do cliente), e pior, num momento em que a sociedade está suportando uma forte subida da taxa básica de juros, que o Banco Central, corretamente, se vê na contingência de agir para conter a escalada da inflação.
A medida, embora possa até mirar nos bancos, acerta uma vez mais o consumidor e torna mais caras linhas importantes no processo de recuperação econômica, como financiamento imobiliário e de veículo, crédito consignado e capital de giro.
Como a medida pressiona a inflação?
Sidney: A inflação está nas nuvens, rodando a 12% ao ano. A impressão que fica é de que o governo gosta de inflação e não se importa com as consequências de mais pressão inflacionária, algo que a sociedade não aceita mais. Aumento de impostos pressiona ainda mais a estrutura de custos das famílias e das empresas, retroalimentando o processo inflacionário. Isso é básico.
É incrível como se cogita aumentar imposto num momento em que a economia desacelera e quando a Selic e a inflação estão nas alturas.
Além de mostrar insensibilidade com as pessoas e as empresas, particularmente as micro e pequenas, que mais precisam de crédito, aumentar imposto não ajuda nada o BC (Banco Central), que já estava sozinho mesmo, no dificílimo desafio de mitigar os efeitos já fortemente sentidos da inflação de dois dígitos.
Busca-se um troféu para ter a narrativa contra bancos, na suposição de que aumentar impostos do setor rende dividendos políticos e pode dar votos, mas quem é alvejado com um tiro certeiro é o consumidor.
Como o aumento da CSLL influencia nos juros bancários?
Sidney: Tudo que pesa na intermediação financeira desemboca nos juros bancários, e os impostos representam 20% do spread. Portanto, mais CSLL para os bancos significa, no final do dia, mais juros para o tomador do crédito.
Nos últimos 12 meses, com a elevação da Selic e do custo de captação, já houve aumento das taxas médias de juros para o crédito às famílias e para as empresas.
Este aumento de impostos é muito ruim e seus efeitos serão os de sempre, que já deveriam ter sido evitados: custos maiores para quem mais precisa de crédito num cenário já bem adverso em que a inflação está corroendo o poder de compra das pessoas.
Qual o impacto geral para a economia?
Sidney: Aumento de imposto é sempre nocivo por ser fonte de custos. Vai dificultar ainda mais o processo de recuperação da economia, que estará em ritmo de desaceleração em 2022, dadas as condições financeiras e monetárias mais severas.
O que o governo deveria ter feito para compensar o custo fiscal do Refis dos pequenos negócios?
Sidney: O que infelizmente não fez. Para enfrentar as dificuldades fiscais, evitar impactos negativos no custo do crédito e propiciar a retomada consistente da economia, só há um caminho: perseverarmos na aprovação da agenda de reformas estruturais em tramitação no Congresso.
O ministro Guedes descumpriu a promessa feita de que o aumento seria só aquele do ano passado?
Sidney: Independentemente de promessa, não é razoável que os bancos tenham, em 2021, suportado um aumento de cinco pontos porcentuais de CSLL, sob o compromisso de que a majoração seria circunstancial e por apenas seis meses, e agora, pouco tempo depois, haja nova imposição de ônus sobre um dos setores que mais têm ajudado na recuperação econômica. Acho lamentável, pois cumprimos nossa parte e já pagamos mais impostos do que outros setores.
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