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Geovana Donella: Conselho é bom e o M&A gosta

19 fev 2021, 21:31 - atualizado em 19 fev 2021, 21:31
Empresas Governança Corporativa Escritório Startup
“Pode funcionar como narrativa, mas está longe de ser a rotina e, sobretudo, a função dos conselhos, especialmente quando se trata de um processo de fusão e aquisição”, afirma (Imagem: Divulgação)

Fui chamada várias vezes ao longo da minha vida profissional para avaliar a situação de empresas. Em um desses casos, olhei para os números, analisei o mercado e falei para o dono: “Estou vendo aqui duas situações: ou você compra outras empresas ou vai ser comprado”. Ele me respondeu que tinha caixa e fomos às compras.

A primeira imagem que vem à mente das pessoas quando se fala em “reunião do Conselho” remete ao cinema e a TV. Diante de alguma crise, um grupo que mistura pessoas envolvidas com a operação e outras que raramente pisaram na empresa conspiram e destituem o CEO.

Pode funcionar como narrativa, mas está longe de ser a rotina e, sobretudo, a função dos conselhos, especialmente quando se trata de um processo de fusão e aquisição.

O Conselho é um elemento fundamental do sistema de governança corporativa. Esse sistema é responsável por cuidar, dirigir, monitorar e incentivar uma empresa.

Para deixar ainda mais claro, costumo fazer um paralelo com o corpo humano. O Conselho seria a cabeça, aquele que analisa os dados e ajuda ou define as estratégias de curto, médio e longo prazo. Ele também monitora a performance e as decisões gerenciais, supervisiona o gerenciamento de riscos, faz questionamentos e pede informações sempre com objetivo de corrigir rumos.

Seguindo nossa analogia, a espinha dorsal desse sistema é o CEO, o sujeito que vai pegar as decisões ou recomendações do Conselho e traçar um planejamento, colocar os mecanismos de gerenciamento (os braços) e as pessoas (as pernas) para executar o plano. Os órgãos são os diversos departamentos e o sangue, que irriga tudo, os regulamentos.

Esse sistema de governança vai cuidar das dimensões econômicas, sociais e ambientais. Da intersecção desses valores, nasce o prestígio de uma empresa que pode torná-la atrativa para investimento e uma vencedora em seu setor de atuação porque é confiável.

Colocado dessa forma, pode dar a impressão de estarmos falando apenas de megacorporações. Mas não. Serve para uma multinacional tanto quanto a padaria do seu João.

Por isso existem dois tipos de Conselho. O primeiro é o de Administração, nos quais os conselheiros têm poder de voto e decisão.

No Brasil, são uma exigência legal para empresas S/A. Há também os Conselhos Consultivos, que assessoram a diretoria, mas não têm dever fiduciário (responsabilidade legal) sobre as decisões.

Mesmo assim, os Conselhos Consultivos podem ajudar bastante a jornada de crescimento de uma empresa de porte pequeno ou médio. Governança é, antes de tudo, saber para onde se vai. Você imagina um carro sem direção? Pois é.

“Se a empresa for a compradora (buy side), o conselho precisa avaliar se a proposta é consistente com o plano estratégico de médio e longo prazo”, diz (Imagem: Site/Itaú BBA)

Conselhos e M&A

No contexto de um processo de fusão e aquisição, como os Conselhos podem ajudar? Os benefícios e cuidados têm particularidades dependendo do lado da negociação.

Se a empresa for a compradora (buy side), o Conselho precisa avaliar se a proposta é consistente com o plano estratégico de médio e longo prazo. Uma aquisição representaria o melhor uso dos recursos existentes? Quais são as sinergias com a empresa-alvo?

Agora, no caso dos sócios ou proprietários estarem em busca de investimento ou venda (sell side), o Conselho vai ajudar a entender qual a melhor estratégia, considerando-se o momento do mercado e as perspectivas da própria empresa. A estratégia faz sentido? A proposta na mesa atende aos melhores interesses dos stakeholders?

Um Conselho bem formado vai auxiliar durante o processo de venda a fim de garantir que o valuation da empresa seja realista e que a transação não empaque na fase de due dilligence, que se tornou ainda mais rigorosa depois da pandemia.

A voz da experiência

De forma geral, um Conselho Consultivo para uma empresa menor é a oportunidade de trazer a bordo profissionais com maior experiência e conhecimento do mercado que os próprios donos ou diretores. Não dá para convidar o amigo palpiteiro, por mais bem intencionado que ele seja.

Pelo fato de já ter atuado em vários Conselhos, para mim é intuitivo: como poderia ser útil das formas descritas acima se não tivesse passado por isso antes? Já montei empresas, comprei e vendi negócios, fiz negócios no Brasil e no exterior, em empresas familiares e multinacionais.

O Presidente de um Conselho precisa ter muita capacidade de negociação, conhecimento profundo do mercado e de questões macro, como política e economia, ser flexível e determinado ao mesmo tempo na condução dos debates, dotado de senso de justiça e capaz de formar um grupo diverso.

Diferentes pontos de vista enriquecem bastante o debate. Na Solstic, temos uma mulher presidente e outra conselheira, mas, de forma geral, a diversidade é um desafio ainda a ser conquistado.

De acordo com a consultoria Deloitte, as mulheres ocupam 17% das vagas na média global, contra 8% no Brasil.

Os processos de M&A podem representar oportunidades de crescimento e sinergia fabulosos, desde que conduzidos com profissionalismo e atenção aos detalhes.

Há muitas armadilhas no caminho (erros de avaliação, falta de transparência nos dados da empresa adquirida, problemas de cultura organizacional subestimados, etc.) e isso explica porque em mais da metade dos casos o resultado é diferente do pretendido.

O Conselho, formado e comandado por gente experiente, é a cabeça do sistema agindo no melhor interesse do corpo, com envolvimento, integridade e competência. É ele quem vai te ajudar a manter seu negócio saudável e será fundamental quando chegar a hora de um M&A.

*Geovana Donella é presidente do Conselho Consultivo da Solstic Advisors, Conselheira de Administração e especialista em Governança Corporativa de empresas familiares.

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