Coluna do Fernando Luiz

Gastos do governo e inflação é que verdadeiramente preocupam

22 out 2024, 15:10 - atualizado em 22 out 2024, 15:10
brasil pib selic inflação
brasil pib selic inflação (Imagem: REUTERS/Adriano Machado)

Recentemente, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, comentou muito superficialmente sobre a possibilidade de novo aumento da taxa Selic, sem dar pistas sobre o que pode acontecer.

Limitou-se a dizer que as decisões serão avaliadas reunião a reunião e de acordo com os dados.

Ressaltou, porém, que o mercado de trabalho está apertado e o crescimento econômico está robusto e mais alto do que o esperado, o que pode pressionar a inflação. Também voltou a levantar preocupações em relação às apostas online, as famosas “bets”.  

No que tange à inflação, de fato, basta olhar a curva de juros e o que os bancos estão falando para ver as expectativas de subida dos preços. Isso falando de futuro porque o IPCA de setembro já foi divulgado e ficou em 0,44%, aumento de 0,46 ponto porcentual em comparação com agosto, que havia sido negativo em -0,02%.

Mas daquilo que foi dito pelo presidente do BC a gente precisa separar o que realmente é preocupante do que não é.

E o que é preocupante? Esta questão da alta inflacionária preocupa porque a economia está sendo acelerada da forma errada, com estouro fiscal e sem os investimentos necessários do setor privado.

E tudo isso impacta no risco de crédito. Se bem que, observando o que aconteceu este ano, a quantidade de emissões privadas já foi, até setembro, maior do que foi no ano passado.

É que os spreads para essas emissões privadas têm caído, estão nas mínimas. Isso quer dizer o seguinte: o diferencial entre o risco da empresa versus o risco do tesouro para emprestar dinheiro, está nas mínimas. Então, muitas empresas estão conseguindo captar dinheiro no mercado a taxas muito atraentes para que elas possam rolar a dívida e se realavancar. 

O outro lado dessa moeda é que olhando a taxa de investimento privado, ela está caindo. Isso quer dizer que as empresas estão captando dinheiro barato, mas não estão investindo, fazendo com que o PIB real esteja mais alto do que o PIB potencial.

Esse, basicamente, é o problema. E só acontece porque o governo gasta muito de forma irresponsável. Está injetando dinheiro na economia e inflando um crescimento onde a demanda cresce, mas a oferta não cresce na mesma proporção. É isso que está gerando inflação.

E os investidores da economia real não estão investindo porque estão com medo, já que o governo está gastando demais e, pior, com uma ânsia arrecadatória muito alta.

Como alocador de recursos, o governo é extremamente incompetente, muito pior do que a economia privada. Então, a economia, quase inteira, está descompassada. O gasto do governo não para de subir, a arrecadação não para de subir e as empresas não estão investindo.

Eu acho que esse é um problema muito maior do que a questão das bets que, entendo que até devem, sim, ser liberadas. Acredito que esse mercado precisa ser regulado, mas é mais um ativo financeiro, que você resolve com aumento de imposto, um limite para reagrupar esse dinheiro.

O que tem chamado a atenção do governo e do BC é que o tíquete médio com apostas em bets está crescendo consideravelmente. O Banco Central publicou uma nota técnica revelando que os gastos mensais só no mês de agosto foram de R $ 21 bilhões.

E aí tem uma questão que precisa ser muito bem discutida, porque é um tema controverso, o fato de beneficiários do Bolsa Família também estarem apostando um tíquete médio de R$ 100 por mês.

O percentual dos beneficiários é de 70%, muitos deles chefes de família, segundo o Banco Central. Não vou me aprofundar nesse ponto, mas um benefício concedido para ajudar, no mínimo não está sendo bem utilizado.

Mas, voltando ao que interessa, a aposta online existe no mundo inteiro, em vários lugares.

É mais uma questão de tratar direito o assunto. As pessoas têm que poder fazer aquilo que querem fazer, do jeito que podem fazer e o governo, como órgão regulador, precisa ver para onde quer direcionar a economia. Tem imposto de 90% no cigarro, tem imposto de 50% em carro, tem imposto de 60% a 70% em bebida alcoólica.

O governo libera as apostas e coloca o imposto de 95% em cima do que as empresas ganharem e arrecada, ou melhor, rearrecada uma boa parte desse dinheiro que sai do bolso das pessoas.

Não vejo este como o centro do problema. A preocupação é a forma irresponsável que o governo está usando o fiscal, isso é, colocando ênfase em gastar dinheiro de forma errada. Isso, sim, precisa acabar para o bem de todos.