Gabriel Casonato: Venda para a Natura é a salvação da Avon?
Por Gabriel Casonato, editor do Agora Financial
Caro leitor,
No universo corporativo, são raras as vezes em que uma grande empresa brasileira decide adquirir uma das principais concorrentes no exterior.
O caminho, normalmente, é sempre o inverso, na medida em que as gringas costumam ser mais bem geridas e capitalizadas, possuindo mais “poder de fogo” para eventuais aquisições.
Na última quarta-feira (22), no entanto, a ordem natural se inverteu.
A fabricante brasileira de cosméticos Natura anunciou que chegou a um acordo para a compra do controle da americana Avon.
Em uma operação que envolve a troca de ações, os negócios das duas empresas serão combinados e o grupo resultante será controlado por uma nova sociedade, a Natura Holding – ou Natura &Co.
Ela terá participação de 76% dos acionistas da brasileira e de 24% dos investidores da americana, com as ações ficando listadas no Novo Mercado da B3.
De acordo com comunicado feito pela Natura, quando concluída, a aquisição a tornará a quarta maior empresa de beleza do planeta.
Com a Avon, a Natura &Co terá faturamento anual superior a 10 bilhões de dólares, mais de 40 mil colaboradores e presença em 100 países.
A expetativa é que a combinação dos negócios resulte em sinergias estimadas entre US$ 150 milhões e US$ 250 milhões anuais.
A quantia deve ser reinvestida para aumentar a presença da empresa nos canais digitais e mídias sociais, em pesquisa e desenvolvimento, iniciativas de marca e expansão da presença geográfica do grupo.
Em resposta ao deal, as ações da Natura fecharam a quarta-feira com forte alta de 9,43%, a maior do Ibovespa. Já os papéis da Avon em Nova York (NYSE: AVP) dispararam 9,06% no dia do anúncio.
O otimismo do mercado se justifica a partir de uma possível reviravolta que a venda do controle possa provocar na companhia, que vem tentando se reerguer e meio a uma crise sem precedentes.
Quando foi nomeada CEO da Avon, em maio de 2012, Sheri McCoy tinha no currículo uma trajetória de trinta anos na Johnson & Johnson (NYSE: JNJ).
Lá, liderou a área global de P&D – entre outras divisões – e se acostumou a figurar no ranking das mulheres de negócios mais poderosas do mundo, elaborados por revistas como Fortune e Forbes.
No entanto, todas essas credenciais não impediram que a contratação da executiva fosse alvo da desconfiança de parte dos investidores.
Quase seis anos depois, em março de 2018, Sheri deixou seu cargo no auge da maior crise dos quase 135 anos de história da Avon.
Durante sua gestão, o valor de mercado da companhia despencou em mais de 80%. O faturamento, que estava em US$ 11 bilhões em 2011, caiu pela metade no ano passado.
Um dos alvos das críticas foi a venda a venda de 80% dos negócios da Avon na América do Norte para o fundo de investimento Cerberus.
Fechado em dezembro de 2015 por US$ 605 milhões, o acordo envolveu ainda a cessão de 16% da operação global.
Na época, muitos analistas criticaram o negócio, afirmando que as fatias haviam sido vendidas por um preço de “queima de estoque”.
Naquela altura, porém, a Avon já vinha sofrendo com seu principal erro do ponto de vista estratégico, o de insistir em investir unicamente no modelo de vendas diretas.
Enquanto praticamente todas as empresas do setor vinham apostando na diversificação de canais, a Avon optou por não acompanhar essa transformação.
A Natura, que por muito tempo também foi questionada por seguir essa mesma abordagem, começou a inaugurar suas lojas físicas em 2016.
Para piorar, mesmo em seu território, a Avon passou a sofrer perdas. E para uma outra brasileira, o Boticário, que junto com a marca Eudora passou a investir também em vendas diretas.
De uma participação de mercado de 7,8% no segmento de beleza e de cuidados pessoais, o Boticário saltou para uma fatia de 10,6%, em 2016, segundo a Euromonitor. E desbancou da terceira posição justamente a Avon, que nesse intervalo caiu de 8% para 6%.
Por fim, o surgimento de novos concorrentes no chamado porta a porta, como a Hinode, também ajudou a dificultar o cenário para a americana.
Até que os executivos que ficaram na companhia finalmente resolveram ouvir o conselho dos especialistas e vender a operação.
E, patriotismo à parte, não poderiam ter escolhido um comprador melhor.
Também prejudicada pelo aumento da concorrência, a Natura já vem há algum tempo apostando e aquisições.
Foi assim com a rede australiana Aesop, em 2012, e com a britânica The Body Shop, em 2017, as quais contribuíram para a brasileira ampliar sua fatia no mercado global.
Paralelamente a isso, a Natura vem conseguindo se manter lucrativa e gerar valor aos acionistas – depois de praticamente dobrar de valor no ano passado, a ação já acumula outros 36% de alta em 2016.
Portanto, é perfeitamente compreensível que os investidores de Avon estejam animados com a venda do controle para a brasileira.
A expectativa, em linhas gerais, é que a empresa finalmente os recursos e a expertise suficientes para implantar todas as transformações necessárias para recuperar sua relevância.
Ainda acho cedo para cravar se vale a pena comprar a ação…
Mas depois de tamanha destruição de valor e da primeira reação do mercado ao deal, AVP pode sim ser uma aposta interessante para aqueles que gostam de cases de turnaround.