Futuro de bebês geneticamente modificados pode depender de Putin
Em meados deste ano, depois que um bioquímico russo anunciou planos de seguir os passos de um pesquisador chinês e criar bebês geneticamente modificados, uma revista acadêmica de 150 anos que reflete o consenso científico atual fez um apelo global para detê-lo.
“O tempo é vital”, disse a revista Nature. Os perigos de alterar o DNA humano que serão passados para a prole simplesmente não são compreendidos o suficiente para permitir que Denis Rebrikov, vice-reitor de um prestigiado instituto russo e diretor de laboratório de outro, continue, argumentou a publicação britânica.
Seis semanas após o apelo da Nature, alguns dos principais geneticistas da Rússia convocaram uma reunião secreta com autoridades de saúde em um local no sul de Moscou que incluía um convidado especial com acesso incomum ao Kremlin: a filha mais velha de Vladimir Putin, segundo três pessoas que compareceram à reunião.
Concluindo que, na Rússia, apenas Putin pode decidir como regulamentar uma tecnologia emergente capaz de alterar o código de todas as células vivas, os geneticistas queriam apresentar suas opiniões conflitantes sobre as intenções de Rebrikov na presença de Maria Vorontsova, uma endocrinologista cujas opiniões sobre bioética são cada vez mais influentes, disseram as pessoas.
Por três horas, Vorontsova ouviu atentamente os argumentos a favor e contra o uso planejado por Rebrikov da técnica de edição de genes conhecida como Crispr, disseram os participantes. Rebrikov trabalha com um casal surdo que pretende evitar que um filho herde o problema, neutralizando os genes defeituosos GJB2 durante a inseminação artificial.
Os proponentes da cruzada de Rebrikov, que estavam na sessão de portas fechadas, disseram que saíram otimistas de que Vorontsova possa defender a causa. Ela não disse “sim” ou “não”, afirmaram, mas concordou que o progresso científico não pode ser interrompido e que a edição de DNA humano deve ser proibida no setor privado e confinada a instalações estatais para maximizar sua supervisão.
Os oponentes de Rebrikov, incluindo a grande maioria dos especialistas, dizem que aprovar o pedido que ele pretende enviar ao Ministério da Saúde em outubro apenas incentivaria outros cientistas a conduzir experimentos arriscados com espermatozoides, óvulos e embriões humanos antes que uma estrutura global possa ser implementada para regular uma das áreas mais polêmicas da ciência.
Vorontsova, especialista em distúrbios do crescimento pediátrico, não respondeu aos pedidos de comentários enviados ao Centro Nacional de Pesquisa em Endocrinologia, onde trabalha, ou à Associação Russa de Assistência à Ciência, onde faz parte do comitê executivo. O Kremlin nunca confirmou publicamente que Vorontsova é filha de Putin.
O porta-voz de Putin, Dmitry Peskov, não quis comentar sobre a edição de genes, dizendo que não é “uma questão presidencial”. A ministra da Saúde, Veronika Skvortsova, quando questionada se a proposta de Rebrikov receberá o sinal verde, disse à Bloomberg que “um comitê de ética lidará com essa questão muito complicada”.