Arena do Pavini

Fundos perdem R$ 25,9 bi em junho com investidor fugindo de prejuízos em multimercados e ações

06 jul 2018, 23:15 - atualizado em 06 jul 2018, 23:15

Por Arena do Pavini – Os fundos de investimentos fecharam junho com resgates líquidos de R$ 25,9 bilhões, concentrados em carteiras de renda fixa, multimercados e ações. A saída foi provocada principalmente pela instabilidade dos mercados, que provocou perdas em diversas carteiras desses fundos e levaram o investidor a procurar outras alternativas menos voláteis, avalia Carlos André, vice-presidente da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). No ano passado, os fundos haviam captado R$ 16,1 bilhões em junho.

Com a saída de junho, a captação líquida dos fundos no primeiro semestre caiu para R$ 36,4 bilhões, bem abaixo dos R$ 129,3 bilhões do mesmo período do ano passado e da média dos últimos cinco anos, de R$ 48,3 bilhões.

As saídas de fundos coincidem com o aumento de aplicações em outros ativos mais conservadores, como poupança. As cadernetas fecharam o primeiro semestre com a maior captação desde 2014. “O diagnóstico é que que a instabilidade dos mercados leva a um movimento de busca por instrumentos mais tradicionais, o que na prática nem sempre é a decisão mais adequada no momento pois ao mudar de estratégia na volatilidade, se não tiver tranquilidade, o investidor pode cristalizar uma perda em um produto em que volatilidade faz parte da estratégia”, explica André. “O investidor precisa entender que a volatilidade para baixo também faz parte do jogo e que se ele não precisa do dinheiro agora, pode esperar e recuperar a perda, até porque o gestor também vai buscar compensar essa perda e reduzir o risco do fundo”, explica.

Mesmo considerando duas movimentações grandes, de um fundo de renda fixa de tesouraria de um banco que resgatou R$ 25 bilhões e um fundo de participações reclassificado como de ações, que significou entrada de R$ 9,8 bilhões na categoria, os resgates são expressivos.

Patrimônio total de R$ 4,3 trilhões e mais 1,4 milhão de investidores

Apesar dos resgates em junho, houve também um crescimento do patrimônio total em fundos, de R$ 3,8 trilhões em junho de 2017 para R$ 4,3 trilhões em junho deste ano, um aumento de 13,6%. O número de fundos também cresceu, de 15.427 para 16.505, e os gestores também aumentaram de 564 para 574. O total de investidores aumentou 1,4 milhão, de 13 milhões para 14,4 milhões.

Renda fixa lidera resgates, mas fundo distorce dado

Os maiores resgates no ano foram de renda fixa, com R$ 21,8 bilhões de saída, enquanto a maior captação do semestre foi de multimercados, com R$ 33,6 bilhões. Ações vêm em seguida, com R$ 18,6 bilhões e previdência privada, R$ 8,5 bilhões. Mas, se for descontado o fundo de tesouraria de um grande banco, que representou um resgate de R$ 25 bilhões, os renda fixa terminariam o mês com uma captação pequena, de R$ 3,2 milhões, observa André. Já os de ações teriam uma queda de R$ 9,8 milhões em sua captação, para R$ 9,8 bilhões.

Queda de captação em maio junto com perdas

Essa tendência de captação perdeu força justamente em maio, em meio à piora do cenário externo e à greve dos caminhoneiros, observa André, e atinge o auge em junho. No mês passado, os fundos de renda fixa perderam R$ 15,9 bilhões, os multimercados, R$ 11,4 bilhões e os de ações, R$ 1,8 bilhões. Até Previdência, que costuma ter um comportamento mais estável, fechou junho com resgates de R$ 400 milhões.

Mudança na tendência de diversificação pelo juro baixo

Com isso, junho representou uma mudança na tendência de diversificação dos investidores em fundos, que vêm reduzindo as aplicações em renda fixa e ampliando as em multimercados e de ações. No patrimônio total dos fundos, a parcela de renda fixa caiu no semestre, de 48,2% em junho de 2017 para 45,2% neste ano. Já os multimercados passaram de 19,8% para 21,3% e os de ações, de 4,1% para 5,5%.

Dólar subiu 16% e Ibovespa caiu 4,8% e mexeram com carteiras

A queda de rentabilidade dos fundos multimercados, de ações e renda fixa acompanhou os mercados. O dólar foi destaque no primeiro semestre, com alta de 16,6%, enquanto o índice IMA Geral, que acompanha os juros de todos os títulos públicos no mercado, subiu 2,4%. O IMA-B, que acompanha os títulos longos do governo corrigidos pela inflação, fechou o semestre com alta de 1,2% apenas. Já o juro do CDI acumulou variação de 3,17% no semestre.

O Índice Bovespa teve queda de 4,8%. “A piora da rentabilidade ocorreu em meados do mês de maio, pela exacerbação da volatilidade”, afirma André.

Fundos long/short lideram ganhos no semestre

Nesse ambiente, os fundos multimercados long/short, que usam arbitragens entre ativos ou mercados, lideraram em rentabilidade, com 5% no caso dos direcionais e de 7,3% nos neutros no semestre.

Multimercados macro rendem 3,4% no semestre e perdem depósitos

Já os fundos macro renderam em média 3,4% no semestre, perto do CDI de 3,17%, e os livres, 4,1%. Mas esses números são médias, e muitos gestores badalados acabaram tendo prejuízos em maio e junho ou no acumulado do ano. Com isso, a tendência de captação dessas carteiras também mudou e os fundos macro terminaram junho com resgates de R$ 3,9 bilhões. Foi o pior momento desses fundos desde maio do ano passado, quando as denúncias de Joesley Batista contra o presidente Michel Temer derrubaram os mercados e esses fundos também tiveram prejuízos.

Retorno de investidores pode demorar mais

Mas o retorno da rentabilidade foi rápida, o que fez esses fundos recuperaram a captação rapidamente. Desta vez, André acha que esse cenário não deve se repetir.

“Daqui para frente, vamos ter de observar bastante a volatilidade de mercado”, diz André. Assim como houve captação forte em 2017 e no começo de 2018, em junho houve saída representativa de multimercados, efeito colateral da volatilidade mais forte, lembra. Já em ações, a saída não foi tão forte, o que ele acredita se deva ao fato de o investidor em ações estar mais acostumado com oscilações do que os de multimercados. “Havendo redução da volatilidade, o dinheiro que saiu dessas classes deve voltar, mas não deve retornar no mês seguinte, mesmo com recuperação”, acredita. “A volta será mais lenta que a saída no momento de estresse.”

Para André, se o mercado continuar convivendo com períodos de volatilidade acentuada, o fluxo de recursos para multimercados e ações não será rápido. Já se a volatilidade ficar baixa, com o juro baixo, a recuperação será mais rápida. “Mas os que saíram na perda demoram mais para voltar pois a perda acaba marcando mais o investidor do que os ganhos”, diz.

Instabilidades devem continuar no segundo semestre

Segundo André, no segundo semestre, alguns aspectos podem contribuir positivamente e negativamente para os fundos de investimento. Primeiro, a proximidade da eleição pode trazer mais volatilidade para os mercados, como ocorreu em maio e junho E os investidores tendem então a procurar opções mais conservadoras. Já o setor avançou bastante nos serviços de assessoria e suitability, o que deve reduzir os casos de investidores que aplicam em fundos com mais risco do que podem suportar ou que resgatam sem avaliar as perdas. “Estamos mais preparados para orientar investidor a não tomar decisão errada”, diz.

Juro baixo favorece carteiras de maior risco

Outro fator favorável aos fundos é que, ao contrário de outros anos, o país entra no período eleitoral com juros mais baixos. Isso deve influenciar os investidores pois as alternativas tradicionais de renda fixa terão retornos mais baixos e podem incentivar a diversificação.

Renda fixa também perdeu

André lembra que também os fundos de renda fixa com exposição a papéis com taxas prefixadas ou corrigidos pela inflação mais juros prefixados sofreram com o aumento da volatilidade a partir da segunda metade de maio. “Mas, pelo passado mais recente, nos últimos dez dias, essa volatilidade diminuiu, até pela ação do Tesouro Nacional e do Banco Central, e isso leva a crer que o mercado entrou em um regime de maior estabilidade”, diz.

Mas André lembra que o país continua no período pré-eleitoral e isso pode trazer volatilidade adicional, sem contar com as contribuições normais do cenário externo e no front doméstico. “Mas aparentemente estamos em período de menor volatilidade”, diz.

Investidor busca outras aplicações mais conservadoras

A percepção de André é que, apesar do resultado fraco da renda fixa, que teria uma pequena captação em junho se descontados os R$ 25 bilhões de saída do fundo de tesouraria de um banco, é que houve uma parte dos recursos que saíram de multimercados e foram para em geral, incluindo fundos. “Mas minha impressão é que Tesouro Direto, CDB, LCI e LCA podem ter se beneficiado, recebendo parte desses recursos, mas nós na Anbima não temos como confirmar isso”.

Ele diz que foi o que aconteceu com os fundos dedicados a fundos de pensão, que fecharam com um resgate R$ 5,9 bilhões até maio. A explicação é que a alta dos papéis do Tesouro corrigidos pela inflação passaram a pagar juros reais perto de 6% e as fundações resolveram aplicar diretamente neles.

Apesar das perdas em junho, os fundos Renda Fixa Duração Alta Grau de Investimento foram destaque de rentabilidade no semestre, com 4,5% de ganho. Já em ações, todas as categorias perderam no semestre, com as menores perdas dos fundos ações livres, -3,5%, e índices ativos, -4,3%.