Meirelles sai em defesa de Lula após Fraga, Bacha e Malan alertarem para risco fiscal
O ex-ministro Henrique Meirelles – um dos nomes cotados para ministro da Economia – saiu em defesa de Lula, após em uma carta aberta publicada na Folha de S. Paulo, os economistas Armínio Fraga, Edmar Bacha e Pedro Malan criticam as declarações recentes de Lula sobre responsabilidade fiscal e suas críticas ao mercado financeiro.
O grupo começa o texto dizendo compartilhar das mesmas preocupações sociais que o presidente. “Não dá para conviver com tanta pobreza, desigualdade e fome aqui no Brasil.”
No entanto, eles destacam que a alta do dólar e a queda da bolsa não são produto da ação de um grupo de especuladores mal-intencionados, batendo de frente com a fala de Lula durante a COP27 – a 27ª conferência do clima da Organização das Nações Unidas.
Eles também destacam a importância da bolsa de valores como fonte para capital de investimento e lembrar que dólar alto por muito tempo é sinônimo de inflação. No final, o grupo afirma que a área social perde recursos porque não são prioridades do governo.
Defesa de Meirelles
Em publicações no seu Twitter, Meirelles afirma que responsabilidade social pode e deve andar de mãos dadas com a responsabilidade fiscal, e que, sem esse compromisso, cresce a percepção de risco do país.
Mas aproveitou para dar um puxão de orelha em Lula: “Esse compromisso com a responsabilidade fiscal não é um interesse “do mercado” em oposição aos interesses do povo.”
Esse compromisso com a responsabilidade fiscal não é um interesse “do mercado” em oposição aos interesses do povo.
— Henrique Meirelles (@meirelles) November 17, 2022
Em seguida, diz que o interesse do povo precisa vir acompanhado de limites para a criação de novos gastos e de corte de despesas.
Meirelles finaliza dizendo que abrir uma excepcionalidade já no primeiro ano da nova administração não fere essa lógica. “Ela é necessária porque o Orçamento aprovado para 2023 não contempla os gastos que foram criados. E seria impensável o corte do Auxílio de R$ 600 no momento de crise que atravessamos.”
Responsabilidade fiscal é o que permite essa sustentabilidade. O presidente eleito @LulaOficial governou com muito sucesso, seguindo essa linha, e acredito que seguirá esse caminho no novo governo.
— Henrique Meirelles (@meirelles) November 17, 2022
Não existe contradição entre responsabilidade fiscal e responsabilidade social. Para cumprir integralmente uma política social, é preciso gerar emprego e renda. E, para isso, tem que haver um direcionamento claro do governo pela sustentabilidade dos gastos públicos.
— Henrique Meirelles (@meirelles) November 17, 2022
Veja a carta na íntegra
Caro presidente eleito Lula,
Assistimos a sua fala nesta quinta (17) cedo na COP27, no Egito. Acredite que compartilhamos de suas preocupações sociais e civilizatórias, a sua razão de viver. Não dá para conviver com tanta pobreza, desigualdade e fome aqui no Brasil.
O desafio é tomar providências que não criem problemas maiores do que os que queremos resolver.
A alta do dólar e a queda da Bolsa não são produto da ação de um grupo de especuladores mal-intencionados. A responsabilidade fiscal não é um obstáculo ao nobre anseio de responsabilidade social, para já ou o quanto antes.
O teto de gastos não tira dinheiro da educação, da saúde, da cultura, para pagar juros a banqueiros gananciosos. Não é uma conspiração para desmontar a área social.
Vejamos por quê.
Uma economia depende de crédito para funcionar. O maior tomador de crédito na maioria dos países é o governo. No Brasil o governo paga taxas de juros altíssimas. Por quê? Porque não é percebido como um bom devedor. Seja pela via de um eventual calote direto, seja através da inflação, como ocorreu recentemente.
O mesmo receio que afeta as taxas de juros afeta também o dólar. Imagino que seja motivo de grande frustração ver isso tudo. Será que o seu histórico de disciplina fiscal basta? A verdade é que os discursos e nomeações recentes e a PEC (proposta de emenda à Constituição) ora em discussão sugerem que não basta. Desculpe-nos a franqueza. Como o senhor sabe, apoiamos a sua eleição e torcemos por um Brasil melhor e mais justo.
É preciso que se entenda que os juros, o dólar e a Bolsa são o produto das ações de todos na economia, dentro e fora do Brasil, sobretudo do próprio governo. Muita gente séria e trabalhadora, presidente.
É preciso que não nos esqueçamos que dólar alto significa certo arrocho salarial, causado pela inflação que vem a reboque. Sabemos disso há décadas. Os sindicatos sabem.
E também não custa lembrar que a Bolsa é hoje uma fonte relevante de capital para investimento real, canal esse que anda entupido.
São todos sintomas da perda de confiança na moeda nacional, cuja manifestação mais extrema é a escalada da inflação. Quando o governo perde o seu crédito, a economia se arrebenta. Quando isso acontece, quem perde mais? Os pobres!
O setor financeiro recebe juros, sim, mas presta serviços e repassa boa parte dos juros para o resto da economia, que lá deposita seus recursos.
O teto, hoje a caminho de passar de furado a buraco aberto, foi uma tentativa de forçar uma organização de prioridades. Por que isso? Porque não dá para fazer tudo ao mesmo tempo sem pressionar os preços e os juros. O mundo aí fora está repleto de exemplos disso.
Então por que falta dinheiro para áreas de crucial impacto social? Porque, implícita ou explicitamente, não se dá prioridade a elas. Essa é a realidade, que precisa ser encarada com transparência e coragem.
O crédito público no Brasil está evaporando. Hora de tomar providências, sob pena de o povo outra vez tomar na cabeça.
Respeitosamente,
Arminio Fraga, Edmar Bacha e Pedro Malan
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