Fim da Conta Poupança? Ainda vale a pena investir na poupança?
Por Gustavo Cerbasi, para o BTG Pactual Digital
Existia uma grande família, que vivia separada por dois lugarejos. A distância entre eles era de aproximadamente 50 quilômetros.
No Natal, tradicionalmente uma família percorria a pé os 50 quilômetros para passarem as festividades juntos. Esta caminhada era revezada anualmente entre os dois lugarejos, pois o trajeto, além de longo, era feito em uma estrada asfaltada, sob o sol escaldante do verão, maltratando todos os “peregrinos” que percorriam o caminho.
Entre uma geração e outra, uma garota, cansada de fazer esta “ultramaratona”, queria saber o real motivo da caminhada. Claro, foi repreendida pelos demais membros da família, afinal, “como poderia afrontar uma tradição de décadas?”.
Com o intuito de resolver este mistério, a garota foi procurar seu bisavô. Por ser a pessoa mais velha da família, deveria saber o porquê da caminhada interminável.
“Minha filha”, ele disse, “Nós éramos muito pobres e não tínhamos cavalos, e a caminhada era feita em uma trilha estreita. Percorrer a pé era a única alternativa. Com certeza, se tivéssemos um carro e uma boa estrada, chegaríamos mais rápido”.
A tradição de Investir na Poupança
A história acima foi para ilustrar o que exatamente ocorre com a Conta Poupança na vida dos brasileiros.
Esta modalidade de investimento foi criada pelo Imperador Dom Pedro II, no século 19, destinada a pessoas de baixa renda. A remuneração na época era de 6% ao ano (a mesma taxa usada até 2012), sob a garantia do governo.
Até pouco tempo atrás, este investimento era o mais acessível (e seguro) para o público em geral, e essa “tradição” seguiu de geração em geração, até os dias de hoje. Como resultado, a conta poupança continua sendo um produto muito popular. Segundo uma pesquisa realizada pelo SPC/CDL, 69% dos investidores ainda aplicam seu dinheiro na conta poupança e um dos principais motivos é a facilidade e a popularidade do produto.
Nos últimos anos, tivemos a popularização de outros produtos, como os títulos públicos (através do Tesouro Direto), maior oferta de fundos, com a concorrência obrigando as instituições a diminuírem o valor de aplicação inicial, fora os bancos digitais, democratizando o bom rendimento de um produto como o CDB.
Se as pessoas financeiramente inteligentes daquela época acessassem os produtos financeiros de hoje, com certeza não investiriam na conta poupança. Afinal, eles só optaram pelo caminho mais lento por não ter oportunidades mais aceleradoras de alcançar os seus objetivos.
Porque ainda investir em Poupança?
Basicamente, existem 3 motivos que fazem com que as pessoas ainda apliquem dinheiro na conta poupança:
Motivo #1 – Segurança
O maior receio das pessoas em parar de investir na conta poupança é em relação à segurança. Mas, será que isto possui fundamento?
Os Bancos utilizam os depósitos realizados pelos investidores em Conta Poupança, CDB, LCI’s e LCA’s para repassar aos clientes que necessitam de recursos em forma de empréstimos ou financiamentos. Em caso de quebra da instituição financeira, todos os seus recursos, independentemente de estarem em qualquer um dos produtos acima (incluindo saldo em conta corrente), estarão cobertos pelo FGC até o limite de R$ 250 mil por instituição financeira e CPF.
Assim, temer aplicar em um ótimo CDB é um erro, uma vez que você estará garantido pelo FGC.
Em relação à segurança do Tesouro Direto, ele é emitido pelo Tesouro Nacional (Governo), a instituição no país que possui a menor probabilidade de não honrar suas dívidas. Isto deve-se aos seguintes fatos:
1 – No momento que o governo não conseguir honrar suas dívidas, todo o ambiente econômico (inclusive bancos) também estará em situação crítica e provavelmente dando calotes antes do próprio governo, e
E por último (e não menos importante) estão os Fundos de Investimento em Renda Fixa. Ainda que não são cobertos pelo FGC, também possuem um nível de segurança alto, pois boa parte da sua carteira está aplicada em títulos públicos (mencionados acima), reduzindo significativamente as chances de uma quebra.
Se o seu receio é com a segurança, entendo perfeitamente, pois a Conta Poupança é o produto mais conhecido pelos brasileiros. Sugiro que inicie um estudo sobre investimentos a curto prazo, como Tesouro Selic, Fundos DI e CDB’s. Desta forma, você vai criar a confiança necessária para iniciar o processo de mudança.
Motivo #2 – Facilidade para Resgatar
Muitas pessoas aplicam em conta poupança pensando na facilidade da aplicação ou resgate.
Atualmente, com aplicativos cada vez mais intuitivos, todos os investimentos possuem a mesma facilidade de aplicação e resgate.
Existem alguns produtos que possuem data de carência de resgate, onde você não poderá sacar antes de uma data pré-determinada. Mas os sites, as lâminas, os gerentes e assessores de investimento tem a obrigação de lhe dar esta informação.
Outro ponto importante é sobre a forma que a conta-poupança gera o rendimento.
Cada aplicação na Conta Poupança, assim como um recém-nascido, possui seu “mesversário”. Cada vez que esta aplicação completa 1 “mês de vida”, recebemos os juros referentes aos 30 dias anteriores ao aniversário. Por outro lado, caso queira resgatar o dinheiro antes desta data, todos os juros acumulados neste período serão perdidos.
Só para exemplificar: se o aniversário da sua aplicação é dia 7, todo dia 7 você receberá os juros referentes aos 30 dias anteriores. Caso você queira resgatar o dinheiro no dia 6, por exemplo, não receberá os juros acumulados entre o último dia 7 até aquela data. Por isso é extremamente importante você analisar a data de aniversário da conta poupança antes de fazer qualquer tipo de resgate.
A data de aniversário é sempre da aplicação. Isto quer dizer que, ao investir na conta poupança em datas diferentes, você terá inúmeras datas de aniversário. Neste caso, ao realizar um saque, o débito ocorrerá das aplicações onde a data de aniversário é igual ou anterior à data de resgate, priorizando as datas mais próximas.
Se o objetivo é investir por apenas alguns dias, investir na conta poupança não é o melhor lugar para você. Neste caso, os Fundos de Renda Fixa DI e CDB’s são a melhores opções para investimentos a curto prazo.
Motivo #3 – Isenção de Imposto
Finalmente, e não menos importante, temos a famosa isenção do imposto de renda sobre rendimentos na conta poupança. Esta isenção dá uma falsa sensação que os outros produtos, por serem tributáveis, são menos rentáveis.
Entretanto isto não é verdade, por dois motivos:
1 – Existem produtos, como CDB’s, LCI’s, LCA’s, Tesouro Selic e até Fundos DI que, ao serem ofertados com uma boa taxa e dependendo da Taxa Selic, vencem a conta poupança em qualquer situação.
2 – Se você não resgatar o dinheiro exatamente no dia do aniversário, perderá a rentabilidade acumulada do último período. Se o dinheiro a resgatar não possui um planejamento, vale a pena pagar um imposto e migrar seus recursos para o investimento com apuração diária de juros (como mencionei no item 1).
Conclusão
Em uma outra época, não existiam alternativas de investimento para boa parte da população. Investir na poupança era o produto mais seguro, rentável e fácil para resgatar no Brasil.
Entretanto, existe uma falsa crença, passada entre gerações, de que investir na poupança é a única opção. Porém, atualmente existem outras alternativas mais rentáveis, seguras e fáceis para aplicar.
No próximo artigo, apresentarei a regra atual da conta poupança. Com isto, teremos base para compararmos com os demais produtos disponíveis no mercado.
Até a próxima.