Opinião

Fernando Camargo: Fora do mainstream

08 abr 2019, 17:55 - atualizado em 08 abr 2019, 18:44

Por Fernando Camargo, sócio e gestor da Trópico Investimentos – Siga no Twitter

Esta semana tive uma conversa insólita.

O responsável por uma plataforma de investimentos nova me perguntou se eu conhecia gestores diferentes, menos conhecidos, focados, bons e com técnica.

Finalmente alguém que cansou desta “babação de ovo”, que sempre vai atrás dos mesmos gestores, com as mesmas ideias e sempre mesmas respostas para problemas diferentes. Sabemos que o futuro é imprevisível e que o passado não necessariamente explica o futuro, por isto aumentar a amplitude de opiniões, abordagens e ideias é sempre uma ótima forma de tentar entende-lo. A conversa durou duas horas e já valeu a semana somente pela iniciativa de procurar os diferentes.

Ter 20 pessoas na equipe entre outras regras de alocação que não mudam desde 1994 pode levar muitos a esquecer o que realmente importa. As plataformas, que fazem o papel do canal de distribuição do passado, permitiu que diversos gestores, bons e criativos, não precisassem ter área comercial. Só por isto, procurar por equipes grandes como critério já pode ser uma bobagem.

O mercado financeiro é muito regulado, existe também uma boa parte das pessoas de uma equipe que é operacional; e com a tecnologia, muito da burocracia já não necessita mais de tanta gente para olhar. E isto vale também para equipes de análise. A tecnologia evoluiu muito no mercado financeiro e as informações estão muito mais acessíveis do que antes. Diferencial de verdade é capacidade de tomar decisão sob pressão fazendo pouca bobagem, ter experiência de ter passado por muita coisa diferente, track record e liderança.

Ou seja, mais do que nunca, é evidente que quem importa para um bom fundo é o gestor e sua forma de ver o mundo, sua capacidade de liderança e carisma, não quantas pessoas existem na gestora, qual o tamanho do escritório e nem se tem selinho para o estacionamento. Gerir recursos é um negócio de pessoas e muitas vezes, regras de corte confusas eliminam exatamente o que é mais importante para um bom investimento: a cachola do gestor.

Um alocador das antigas, amigo meu de muitos anos, acredita na maldição do escritório novo. Ele é sem dúvida, um dos mais competentes achadores de gestores talentosos no começo de carreira que eu já vi. Segundo ele, quando a gestora muda do escritório simples que estavam e vai para um novo, muito maior, cheio de mármore, letreiro luminoso e sala grande de reunião, pode esperar, os retornos vão despencar. Gestor novo em lugar assim desde o começo, ele me diz que nem olha. “só para fundo fácil”, diz ele. Fundo complicado precisa de time que sofre. Até hoje conversamos muito sobre isto e esta hipótese simplista dele, nunca deu errado. Aparentemente é o oposto do que procuram hoje, né? Quanto mais bem instalado em um prédio bonito da Faria Lima, mais fácil para chegar de patinete, então deve ser bom!

Mais uma regra questionável é de fundos de patrimônio de pelo menos R$ 50 MM para serem analisados. O mercado brasileiro ainda é limitado em volume. Claramente quanto maiores os fundos menos descorrelacionados com o mercado eles são, mais próximos dos índices de referência ficam e menos alpha marginal tendem a gerar. Fundos menores tendem a ser mais ágeis e com mais ideias diferentes, empresas menores e opções não triviais, que podem ser usadas para aumentar o retorno dos investimentos.

Parece, entretanto, que o jogo de não assumir riscos não é somente exclusividade dos investidores. Consultores, alocadores e distribuidores também tem adorado a peleja de entupir seus clientes de mais do mesmo, somente usando este tipo de regra de corte e por conseguinte, deixando muitos bons gestores fora dela.

A beleza está na diversidade.

Investir tem a ver com conhecer pessoas inteligentes e essas limitações deixam muita gente boa de fora do radar em um momento que, finalmente, cada vez mais investidores se interessam pelo mercado de renda variável. Apesar de pequeno ainda, já estamos próximos de 1 milhão de CPF´s na bolsa e isto é para se comemorar. Precisamos ter mais diversidade e opções para serem consideradas. No limite, é uma postura que lembra a dos bancos, não de plataformas abertas, criativas e inovadoras.

Tem muita gente boa fazendo ótimos trabalhos. Investindo direito e com teses sólidas. Alguns são gestores experientes, mas ainda pequenos, de jeito tímido e muitos tem perfil introspectivo. Adivinha se alguém fala com eles? A maioria nem sabe que eles existem, nem sequer procuram. Só vão nos óbvios. Se estiverem fora do eixo SP-RJ então, daí que ficam na última gaveta mesmo. Só quando forem tirar férias e o avião fizer escala lá. E mesmos assim, não pode estar chovendo.

Como investidor apaixonado por gestores criativos e suas ideias, sempre procuro por inteligência, não só por quem é o mais famoso. Procuro avidamente por independência intelectual e criatividade. Sair do mainstream é quase uma obrigação para encontrar isto. Gente capaz e criativa faz investir valer a pena. Nutra relacionamentos que te tragam insights, não considere volume como diferencial, nem escritório bonito e muito menos se impressione por muita gente zanzando pelo ambiente. Isto é mais ruído do que outra coisa.

Seja um value investor e busque sair do conforto dos mesmos gestores, procure valor onde outros só veem check list; seja contrarian, afinal, investir com as massas pode trazer conforto, mas na margem, também tende a gerar retornos mais próximos à média do mercado. Mais do que isto, caros para este tal retorno marginal ajustado no tempo. Não caia nesta!

E isto não quer dizer que os famosos, grandes, são ruins ou que você não deve olhar para eles. Significa somente que construir seu ecossistema é mais amplo do que só esses. E é mais cômodo criar regras limitadoras, muitas vezes sem qualquer sentido, do que se perguntar se esta barreira vale a pena.

Por que sempre os mesmos? As mesmas histórias? Quem ganha com isto? O investidor ou o analista indicando só fundos consagrados? Conhecer a história do mercado da casa não é importante? Quantos anos de track record são o mínimo para ser levado a sério? Passou de verdade pelas crises, ou naquela época era reserva do bandeira sentado na janelinha?

Questione-se sempre.

A maior parte das pessoas gosta mesmo é de um barranco para poder se apoiar. Faz o mínimo é só querem mais do mesmo para não serem questionadas. Afinal, é um trabalho difícil descobrir bons gestores de verdade. Não é fácil fazer as perguntas certas e mais do que isto, saber avaliar as respostas. Só este item já vale outro texto.

Defina critérios corretos, caso a caso e use-os da forma correta. Se interesse pelo assunto e não trate gestores como uma lista de supermercado com itens para serem checados. Se ninguém faz isto para você, crie a sua. Faça você mesmo. Se está pagando alguém para fazer, exija nomes, ideias e retornos ajustados ao risco diferenciados. Conheça a história toda, não só a parte bonita. Bom gestor tem calo, cicatriz e muita história para contar. Se não tem história, desconfie. Analise os questionários que foram feitos e as respostas dadas. Nem que você não goste no começo. Desenvolver este hábito ajudará a encontrar ótimos gestores ainda pequenos e com muito valor a ser criado. E como diria Charlie Munger, “quando passar por você um cavalo selado, não perca tempo e suba nele sem pestanejar”. Afinal, é o seu dinheiro.

Boa busca!