Felipe Paletta: Reducionismo – a arte de tornar as coisas mais simples do que realmente são…
Sempre me incomodou como as passagens históricas, da forma pela qual a gente aprende na escola, são extremamente romantizadas.
Talvez você conheça a história da queda do grande imperador Napoleão Bonaparte, na que ficou conhecida como a Campanha Russa, na França, ou como Guerra Patriótica, na Rússia.
Com um império que chegou a ter sob seu domínio quase toda a Europa Ocidental e grande parte da Europa Oriental, de Portugal à Polônia, Napoleão chegou a controlar mais de 50 milhões de pessoas – quase um terço da população europeia.
Isso até a invasão à Moscou, no ano de 1812.
Na escola, o que aprendi era que Napoleão teria subestimado as condições climáticas do país, cego pelo desejo de ampliar geograficamente o chamado bloqueio continental.
Isto é, para competir economicamente com o forte Reino Unido, potência mundial dominante da época pelo seu Imperialismo, precisaria encontrar formas de ampliar o embargo comercial dos bretões com o resto do mundo.
Bom, de certa forma, não há nada errado com as premissas: a motivação era essa e o exército francês realmente sucumbiu ao frio.
Mas tratar os acontecimentos desta forma é reduzir, ou simplificar muito, o que realmente aconteceu. Ou ainda, ignorar a versão Russa da história.
O progresso está na reflexão
E isso é importante porque identificar precisamente os erros, como defende o megainvestidor Ray Dalio, é tão mais importante do que tentar encontrar boas oportunidades de investimento.
Como investidor, posso te dizer que esse reducionismo acontece o tempo todo e explica muito dos erros que cometemos.
Mesmo aqueles gastam tempo analisando os fundamentos de uma empresa, acabam tentando simplificar em poucos vetores certos acontecimentos que podem elevar ou diminuir o que seria o “preço justo” de uma empresa.
Isso, claro, na tentativa de simplificar o processo de análise. E, então, para que possam gastar mais tempo simulando o que aconteceria nos cenários A, B ou C.
A questão é que, na maior parte das vezes, o verdadeiro valor nasce justamente em quanto tempo foi gasto na interpretação de todos os vetores que criam ou destroem valor para um empresa.
Assim, você passa, definitivamente, a controlar as premissas e não ser controlado por elas.
Quando o lendário investidor Warren Buffett diz que você deve investir em empresas nas quais conhece e deve entender como elas ganham dinheiro, é exatamente isso que quer dizer.
Eu sei, até aqui tudo parece muito teórico, pouco prático, mas me dê uma chance de tentar tornar tudo mais claro.
A tática da terra arrasada
No livro “Napoleão 1812”, o brilhante escritor Nigel Nicolson faz uma reconstrução desse evento histórico e traz algumas conclusões muito interessantes.
Napoleão não subestimou as condições climáticas da Rússia, subestimou – na realidade – os reflexos de seus movimentos, afinal, seu exército de mais de 300 mil soldados era múltiplas vezes superior.
Seu exército era tão grande que, dado a tecnologia da época, não havia qualquer comunicação entre as primeiras fileiras e os que estavam na lanterna.
Como os russos adotaram a estratégia de terra arrasada, fugindo das cidades e queimando tudo que podiam antes da chegada dos franceses, os primeiros soldados morriam de fome antes mesmo do exército se dar conta do que estava acontecendo.
Ou seja, quando reduzimos a derrota de Napoleão ao frio russo, simplesmente ignoramos os seus erros estratégicos e todo sacrifício e planejamento russo.
No mercado, essa leitura incorreta poderia te custar muito caro.
Como contornar esse problema?
Minha primeira dica é: esqueça o tal do “preço justo” ou “preço alvo”.
O que faço, nos meus modelos de projeção, é o inverso do que a maioria dos analistas costumam fazer.
O benefício dessa abordagem é que: a expectativa de lucro e receita das empresas é algo que consigo controlar em meus modelos e comparar com o histórico das companhias.
Isso, inclusive, evita a fixação em um preço (só vou vender quando bater R$ X), já que esse “preço alvo” muda o tempo todo.
E o legal desta abordagem é o seguinte: a expectativa de lucro e receita de empresa é algo que consigo controlar e comparar com o histórico das companhias.
Estou disposto, inclusive, a abrir para você minha estratégia no último episódio da série “A Plena Ascensão”, que vai ao ar amanhã às 9 horas (não perca).
Para dar um exemplo, vou falar sobre uma empresa que recomendei várias vezes desde março aqui na newsletter e que faz parte da minha carteira de dividendos a quase dois anos.
Estou falando das ações da B3 (B3SA3), as ações da Bolsa de Valores do Brasil.
No começo de julho, mais precisamente no dia 9, comentei que, mesmo depois da forte alta das ações desde março, ao preço de R$ 56 por ação, o mercado estaria precificando um crescimento médio de 16% ao ano do lucro para os próximos 10 anos e que, mesmo sendo bem alto, a média histórica dos últimos 10 anos da empresa apontavam para um crescimento médio de aproximadamente 18%.
E é aí que entra aquela parte de entender como a empresa ganha dinheiro.
Com a forte queda da taxa de juros, vimos aumentar rapidamente o número de investidores na Bolsa e, consequentemente, o volume de negociações em Bolsa, quando comparado ao padrão histórico.
Ou seja, apesar do mercado já estar precificando um crescimento de lucro bem alto, o cenário para os próximos anos é muito mais otimista, o que, a meu ver, continuava a justificar a compra das ações.
Resultado: de lá para cá as ações subiram 16%.
Veja, o que estou querendo dizer é que as pessoas costumam dar muito mais importância para as coisas que acontecem no curto prazo e se deixam levar por convicções temáticas que na maior parte das vezes não têm relevância.
Por isso, tente ir por um caminho diferente. Fazer o que ninguém está fazendo e se questionar o tempo todo.
Pegue os seus investimentos atuais e reflita. Será que não está caído na narrativa de comprar empresas de tecnologia? De migrar todo seus investimentos para o exterior?
Eu tomaria bastante cuidado.
Escrevo essa carta para que você seja mais crítico e pense de forma realmente independente, para não aceitar como verdade a superficialidade do retrato da queda do império de Napoleão Bonaparte.
P.S.: Composta por Tchaikovsky, em 1882, a música de fundo da versão em áudio dessa newsletter retrata o antagonismo entre a inicial vitória francesa e a posterior revanche russa, em 1812.
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Gostou dessa newsletter? Então me escreva no e-mail ideias@inversa.com.br.
Um abraço e até a próxima!