Felipe Miranda: Private equity para pessoas físicas
Ainda ontem…
Não chorei de saudade, como escreveram João Mineiro & Marciano. Mas o que fazer com essa dor que me invade?
Arrisquei o palpite de Corinthians 1 x 0 Palmeiras. Quase acertei, foi por um triz (contém ironia, melhor explicar). Veja bem, se até o talebianismo tem suas falhas, por que o Mancinismo, aquele grande movimento filosófico iniciado ao final do ano de 2020, não teria?
Há uma frase de que gosto muito no livro “Princípios do Estrategista”: as ideias do Taleb são tão boas que se dessem dinheiro seria sacanagem. Claro que também contém ironia, mas especula-se muito sobre Nassim Taleb não ter ganhado dinheiro como gestor.
A verdade é que ninguém sabe muito do seu track record. O acesso à informação sobre fundos lá fora é muito mais restrito do que aqui dentro. Aliás, cuidado com o que você deseja.
Talvez sejamos felizes e não saibamos. Ontem mesmo, ouvi que um grande family office chileno com investimentos no Brasil costuma dizer assim: por ano, costumamos ter um IPO e três grandes block trades; vocês reclamam de barriga cheia.
Além da opacidade em torno de alguns fundos de investimento, a própria natureza do trabalho de Nassim Taleb como gestor dificulta a mensuração de seus resultados em termos agregados. Ele e seu sócio, Mark Spitznagel, não trabalham com o conceito de um grande flagship.
A ideia ali é você passar para eles qual o seu portfólio e eles montarem uma carteira de hedge para melhor proteger os seus individuais.
Então, há vários fundos taylor-made, com propósitos específicos. São carteiras de seguros individualizadas, de tal sorte que a própria especulação sobre a competência ou falta dela de Nassim Taleb como gestor pode ser bastante capciosa.
Mas essa é quase só uma divagação.
O título da newsletter de hoje oferece uma ambiguidade.
Ele pode ser interpretado como uma necessidade de o investidor pessoa física começar a olhar para fundos de private equity, investimentos alternativos e ilíquidos em geral. Confesso ser pertinente. Essa é mesmo uma de minhas autoimpostas motivações para 2021.
Estimular o investidor a olhar com mais carinho para esse nicho. É justamente para onde caminham mercados desenvolvidos e onde podem estar melhores oportunidades de retorno.
A outra interpretação é de introjetar nas pessoas físicas uma mentalidade de private equity para ao menos uma parte de suas carteiras. Isso nos leva ao texto de ontem.
Na edição anterior do Day One, falei da possibilidade de métodos mais tradicionais e ortodoxos estarem de algum modo enferrujados para lidarmos com casos de exponencialidade.
Apresentei algumas alternativas. Mais à noite, troquei mensagens com outro gestor de ações. Ele trouxe provocações ótimas: “Estamos certos ou isso é bolha? Locaweb (LWSA3) vale R$ 13 bi… olha BIDI, além dessas que você citou hoje no seu texto…”.
Ele não sabe dizer ao certo se são preços de bolha, ou se estamos certos. Eu também não sei. Pode ser uma coisa ou outra, a depender do cenário prospectivo.
Não há como julgar se estamos certos a priori, do ponto de vista do resultado — apenas como uma análise de cenários à frente, com pensamento probabilístico.
Se as empresas entregarem, de fato, curvas exponenciais e dobrarem receita por alguns trimestres subsequentes, como algumas têm feito, então ficará óbvio, a posteriori e sob o viés de retrospectiva, que não havia bolha alguma. Caso contrário, todos serão taxados de grandes idiotas por não terem percebido a exuberância irracional.
Assim, além da proposta de valuation de ontem, outra me veio à cabeça: e se, em vez de uma abordagem individual, microeconômica e idiossincrática aplicada a cada caso, desse lugar para uma proposta de tratar todos esses casos quase como opções fora do dinheiro, trazendo a ideia talebiana do Barbell Strategy para o lado de ativos muito arriscados (pouco dinheiro em muito risco, dispersos numa estratégia 1/N, em que N tende ao infinito), que, em termos práticos, não difere muito da proposta de vários private equities.
Pragmaticamente, se você separar uma parte de seu portfólio, digamos 10-15% para comprar cinco desses cases considerados exponenciais, basta que um ou dois deles acabem dando certo.
É quase como se você mesmo criasse o seu próprio private equity. Você sabe que várias das suas investidas vão dar errado, mas uma ou outra multiplicação por 10x vai pagar a conta consolidada.
Essa é uma ideia talebiana que pode dar bastante dinheiro. Seria isso um evento raro?
Três coisas da velha economia agora, só para não dizer que não falei das flores:
1 — A Rio Tinto publicou guidande de produção hoje. Apesar de o minério de ferro ter caído, com atribuições de que se trata de preocupação com possível aumento dos embarques para a China, não vi substancial elevação de oferta. Some-se ao prognóstico semelhante para Vale (VALE3) e BHP e veremos dificuldades em responder ao aumento da demanda asiática.
O governo chinês já chegou a tentar comprar um pedaço de Carajás. Pediu preço e tudo. Claro que isso me parece inviável de acontecer, mas mostra um pouco do que a Vale representa. A 3,5x Ebitda, com minério pressionado e potencialmente superando Brumadinho no curtíssimo prazo, Vale é uma grande compra.
2 — Você não consegue entender o case da 3R Petroleum (RRRP3) se não entender a própria Petrobras (PETR3;PETR4). A estatal não é feita para operar o varejo, poços pequenos e médios e onshore. Os poços de que a Petrobras está se desfazendo podem ser simplesmente maravilhosos nas mãos de gente que sabe operar.
3 — Repare no quanto foi gerado de ágio na operação entre Intermédica (GNDI3) e Hapvida (HAPV3). Curto e grosso, quem paga essa operação é o governo. Vai ficar por anos sem pagar imposto, no equivalente para fazer as aquisições necessárias para continuar jantando a Unimed. Com isso, a empresa vai pular de 17% para 30% de share. Não dá para competir. Apenas isso.