Colunistas

Felipe Miranda: João e Maria – a história de dois pequenos investidores

27 jan 2020, 11:33 - atualizado em 27 jan 2020, 11:33
Na opinião de Felipe Miranda, podemos e devemos ter carteiras “ortodoxas” para os filhos

Maria está a caminho, prevista para chegar em julho. Ela vem para fazer dupla na história com João. Se for parecida com o irmão — torço para que sim —, formarão uma bela parceria. Espero que puxe a beleza da mãe, a sorte do pai, os valores de ambos.

Não sou daqueles que dão lotes de ações de Petrobras e Vale para sua prole como presente de Dia das Crianças. Afinal, elas são… bem… como eu poderia dizer… crianças. Imagino que meias bege dadas pelo tio ou camisas marrons entregues pelo avô conseguem lhes ser mais interessantes do que a intangibilidade de PETR4 ou VALE3.

Mas que isso não signifique, de modo algum, a negligência com a educação financeira e a construção patrimonial desde a primeira infância, em prol da apropriação máxima dos benefícios do horizonte de longo prazo — não há aliado maior, seja pelos efeitos tributários concretamente mais vantajosos, seja pela tendência à convergência dos preços aos valores intrínsecos lá na frente, fugindo da aleatoriedade e da randomicidade típicas do curto prazo.

João Pedro já carrega bons lotes de NTN-B 2050 há vários anos e é cotista relevante dos fundos da Vitreo, aqueles que replicam as carteiras da Empiricus. Para ele, tento combinar investimentos nas nossas ideias com o novo uniforme do Corinthians (embora JP, mesmo sendo mais um louco para o bando, prefira os do Cristiano Ronaldo, para ligeiro desgosto do pai).

Acho que está dando certo e, portanto, pretendo repetir a dose para a irmã. Aliás, dadas as minhas questões psíquicas, dificilmente algo me perturbaria mais do que a suspeita de conferir-lhes qualquer tipo de tratamento diferente.

Já tenho comigo os investimentos que farei para ela nos próximos meses. Divido-os aqui sob a perspectiva de que, eventualmente, possam servir também aos papais, às mamães e aos avós de plantão. Com filhos e esposas felizes, meu caro, todos estão felizes. Suspeito que os netos caminhem sobre a mesma linha.

Farei isso sob a abordagem típica adotada para minha própria administração patrimonial, separando o todo em quatro caixas menores. Na verdade, essa proposição é a mesma normalmente sugerida nos tradicionais private bankings, nos espectros do high (e do ultra-high) net-worth e nas grandes gestoras de fortunas.

As quatro subdivisões são: i) colchão de liquidez; ii) previdência; iii) investimentos no exterior; e iv) investimentos locais em carteiras voltadas a ganho de capital e/ou renda.

Essa é uma boa composição arquetípica que pode ser útil a qualquer investidor, muito embora hoje, na prática, ainda esteja restrita ao grupo dos multimilionários. Evidentemente, porém, formações de portfólios devem obedecer às idiossincrasias individuais, respeitando vieses e perfis pessoais, horizonte de investimento, tolerância a risco, tipos de passivo, etc.

Para os devidos fins, portanto, vamos desconsiderar a primeira gaveta. Não me parece razoável supor que a Maria venha a incorrer, por si, em uma despesa emergencial que exija recorrer à liquidez imediata — isso, claro, caso venha a ocorrer (bate na madeira), estará a cargo do papai.

Já a segunda caixa ganha importância, pois o maior horizonte temporal otimiza a materialização dos benefícios tributários desse tipo de investimento. Ademais, como o foco aqui é o longo prazo, quando, ao menos em tese, os adequados ativos de risco oferecem (ou tendem a oferecer) os melhores retornos, podemos pesar um pouco mais a mão numa previdência mais arrojada. Pragmaticamente, mais focada em ações.

“Seria uma ingenuidade supor que todas as boas alternativas de investimento estão circunscritas ao Brasil”, afirmou o CIO da Empiricus (Imagem: REUTERS/Paulo Whitaker)

O terceiro segmento serve para investidores de qualquer idade. No curto ou no longo prazo, para novos ou idosos, para terráqueos ou extraterrestres, seria uma ingenuidade supor que todas as boas alternativas de investimento estão circunscritas ao Brasil.

Se reconhecemos as virtudes da diversificação (e aqui nós a valorizamos como a maior das virtudes nos investimentos), precisamos obviamente estender o conceito para diversificação geográfica e de moedas. Cumpre dizer ainda que há várias restrições para investimentos no exterior por meio de fundos de previdência, de tal sorte que, por melhor que seja, a caixa anterior é incapaz de desempenhar o papel dessa terceira.

Por fim, podemos — e, na minha opinião, devemos — ter carteiras “ortodoxas” para nossos filhos. Usei a palavra ortodoxa entre aspas porque não acho que ela descreva com precisão minha intenção aqui. Infelizmente, porém, não encontrei outra melhor.

No contexto, quis me referir a portfólios para nossos filhos que consideraríamos adequados também para nós mesmos. Cotas do Verde, por exemplo (se o fundo estivesse aberto), valeriam para o João Pedro, para a Maria, para mim, para a Gabi, para a minha mãe e para o meu avô. Com ou sem benefícios tributários, certos ativos ou certas carteiras são recomendadas a qualquer um. Mais uma vez, preciso lembrar das restrições a determinadas posições para fundos de previdência, de modo que também essa caixa não pode ser substituída por um bom plano de previdência — até hoje, não consegui entender, por exemplo, a restrição da Susep para investimentos em ouro.

O executivo trouxe portfólios para os filhos que “consideraríamos adequados também para nós mesmos”

Explicações dadas, o que vamos comprar para Maria?

1. Um bocado de NTN-B 2050. Podem dizer o que quiserem sobre “a morte da renda fixa”, “os benefícios da renda variável a longo prazo” (que, infelizmente, aliás, até hoje não se confirmaram no Brasil, para o desgosto de um Equity Guy como eu), “os excessos do juro longo em 2019”, nada tira minha visão de que a preservação do poder de compra no longo prazo, acrescido de um juro real perto de 4% ao ano, continua um deleite. Componha isso por 30 anos e cheque os resultados.

2. Uma boa previdência arrojada. No caso, o FoF Prev Arrojado da Vitreo Gestão, que persegue uma carteira mais agressiva de fundos de previdência indicada pela equipe de pesquisa da Empiricus. Na composição acima, estamos na segunda caixa. E note que a opção pela previdência arrojada decorre da ligação com o ciclo de vida. Quanto maior o prazo, maior pode ser a exposição a risco (tudo ao menos em tese, claro). Eu mesmo tenho o FoF SuperPrevidência, que é menos arriscado do que o anterior (a calvície denuncia o menor horizonte temporal).

3. Uma carteira de investimentos no exterior, a partir das sugestões de nossa série MoneyRider, tocada brilhantemente pelo João Piccioni e pelo Enzo Pacheco. Como eu e meus familiares diretos temos restrições de compliance para comprar ativos diretamente, posso (e vou) dar à Maria acesso indireto a esse portfólio no exterior por meio do fundo Money Rider Hedge Fund da Vitreo, que persegue as ideias sugeridas na série homônima.

4. Já na gaveta focada em crescimento patrimonial em ativos locais fora da previdência, quero que ela tenha as mesmas coisas que eu tenho para mim mesmo — não faria nenhum sentido ser diferente. O objetivo é montar os portfólios da Carteira Empiricus (nossa seleção do que comprar em cada um dos mercados) e da seleção batizada Oportunidades de Uma Vida, que reúne minhas ações favoritas, aquelas que considero “must have”, ou seja, que o investidor precisa ter.

Pelas mesmas restrições mencionadas acima, farei isso por meio dos fundos Vitreo Carteira Universa e Vitreo Oportunidades de Uma Vida, cujos regulamentos preveem perseguir os respectivos portfólios sugeridos pela Empiricus. Aqui também vale pesar um pouco mais a mão, no caso dela, nas ações, diante de seu maior horizonte temporal. Isso confere uma diferença em relação ao meu próprio patrimônio pessoal, mais concentrado no Vitreo Carteira Universa, de que sou o maior cotista individual.

5. E como o portfólio dos meus filhos carrega o DNA e o viés pessoal do pai, vamos comprar uns quinhões de dólar também, porque não quero perrengue extremo para a vida deles, em nenhum momento, em nenhuma circunstância. Aqui é importante a palavra “extremo”.

Pretender livrá-los de qualquer adversidade significaria impor-lhes justamente a maior das fragilidades, como a mãe edípica que protege excessivamente sua prole, tornando-a despreparada para encarar qualquer cenário negativo, ou mesmo como o mito de Adão e Eva no Paraíso, que tentaram viver num ambiente puro, estéril e livre da maldade, até serem visitados pela serpente, representante da perda da pureza e do ganho da consciência sobre as próprias limitações e finitude.

A tentativa de blindar contra todos os percalços acaba se tornando o maior deles. “What you fear the most could meet you halfway”, como alerta Eddie Vedder. Faço os votos de uma “good enough mother”, que é muito melhor do que uma mãe aparentemente perfeita e totalmente entregue, como propõe Winnicott. Voltando ao ponto central, dólar é dólar. Serve de diversificação, proteção e preservação do poder de compra no tempo.

6. Para terminar — e eu falo sério —, ações da Disney. Pode parecer anedótico (de fato, talvez seja), mas acabo de voltar de lá e posso afirmar: é um espetáculo. Ah, sim, empresarial também. Que os sonhos dela se tornem realidade.