Empiricus Research

Felipe Miranda: Guia prático para O Novo Fim do Brasil

07 jan 2019, 10:33 - atualizado em 07 jan 2019, 10:33

Por Felipe Miranda, CEO da Empiricus Research

“If we do what they want us to do,
none of us will be alive later
to tell them that they were wrong.”

Robert F. Kennedy, Thirteen Days: A Memoir of the Cuban Missile Crisis

Dizem que o tempo da política é diferente do cronológico. Alguns dias podem durar semanas. Semanas podem durar meses. E meses podem representar anos.

Na desconexão entre cronologia objetiva e passagem metafórica do tempo, hoje é um dos três dias capazes de marcar o início de 2019. Os mais disciplinados começam rigorosamente no 1º de janeiro. Outros aproveitam a semana inicial morna para aquecerem-se no sol, voltando à rotina justamente hoje. E tem a turma mais barra-pesada, que só vai começar mesmo depois do Carnaval – normalmente, essa galerinha “supertrabalhadora” já emenda o restinho de ano e vai até o réveillon enganando; fingem que trabalham enquanto o chefe finge que paga.

Da minha parte, o 2019 começou já no Natal do ano passado e talvez por isso eu pense hoje naqueles “13 dias que abalaram o mundo”, bem retratados no filme homônimo, quando estivemos à beira de uma guerra nuclear de escala global por conta da crise dos mísseis – na prática, quanto tempo valeu aquilo? Se Kennedy fosse em frente com as sugestões de seus assessores e colocasse uma ofensiva prática sobre os soviéticos há 56 anos, estaríamos aqui hoje?

Não precisamos ir muito longe. Quanto tempo durou a primeira semana do governo Jair Bolsonaro? Depois do discurso muito contundente de Paulo Guedes em prol do liberalismo e, papo reto aqui, em prol de tudo que o país precisa, fomos confrontados com um bate-cabeça danado entre ministros e do próprio presidente. Para ficar nos casos mais gritantes, Onyx Lorenzoni veio dizer que o presidente se enganou sobre o aumento do IOF, e Jair Bolsonaro foi ao SBT defender uma reforma previdenciária mais branda.

Com tanta bobagem sendo dita por aí, talvez seja o caso de recuperar as brilhantes palavras de Norberto Bobbio, quando as promessas de campanha enfrentam o primeiro encontro com a realidade: “(…) das promessas não cumpridas, algumas não podiam ser objetivamente cumpridas e eram desde o início ilusões; outras eram, mais que promessas, esperanças mal respondidas; e outras, por fim, acabaram por se chocar com obstáculos imprevistos. Todas são situações a partir das quais não se pode falar precisamente de degeneração da democracia, mas sim de adaptação natural dos princípios abstratos à realidade ou de inevitável contaminação da teoria quando forçada a submeter-se às exigências da prática”.

A realidade morde. Dúvidas das mais variadas naturezas surgem sobre a capacidade de levar em frente um projeto liberal em meio a uma retórica ainda de palanque. Paulo Guedes teria mesmo esse poder todo? Ele teria mesmo pedido a cabeça de Onyx Lorenzoni? O quanto o presidente estaria engajado nas reformas fiscais?

De maneira mais pragmática, a tese do bull market estrutural estaria ameaçada por vozes dissonantes entre os vários representantes do governo? Ou até mesmo pela mesma voz do governo, que diz isso de manhã e aquilo à noite?

Dou de ombros para entrevistas em emissoras de TV aberta. Também desprezo supostas brigas narradas por testemunhas de reuniões secretas (sempre em off, claro – P.S.: a Bloomberg, que faz o estado da arte em jornalismo econômico, tem uma regra perfeita: comentários negativos não podem ser feitos sob anonimato).

Money talks, bullshit walks. Palavras não pagam dívidas, não fazem reformas da Previdência nem evidenciam convicções se não forem acompanhadas de verdadeira exposição. Importam as ações, não os dizeres. Se você se diz cristão, por exemplo, e não age conforme aquilo, você simplesmente não é cristão. O que define as pessoas (ou os governos) são o que elas fazem – e, ao menos por enquanto, não há qualquer sinalização material de que o governo tenha desistido da pauta liberal.

Lembro, por exemplo, que o primeiro mandato do ex-presidente Lula transcorreu com uma concreta gestão de política macroeconômica (e poderia também dizer microeconômica, com uma agenda muito interessante imposta sobretudo pelo então secretário Marcos Lisboa) totalmente ortodoxa, mesmo sob intenso “fogo amigo” do diretório do PT.

Os fundamentos do bull market estrutural não se assentam sobre discursos, mas, sim, sobre condições materiais, que são as que verdadeiramente importam, notadamente: i) posicionamento para uma recuperação cíclica da atividade que permitirá, por bastante tempo, crescer sem inflação por conta da elevada ociosidade da economia; ii) aumento significativo dos lucros corporativos a partir de muita alavancagem operacional; iii) avanço das reformas fiscais por mera imposição das forças contingenciais e algébricas (acabou o dinheiro pra emendinha parlamentar, amigo); iv) valuation convidativo em mercados emergentes e no Brasil em particular; e v) um contexto internacional um pouco mais difícil, mas ainda não impeditivo para a valorização do preço dos ativos em horizontes de tempo mais dilatados.

Na minha visão, muito mais relevante do que a audiência do Silvio Santos, 140 caracteres postados no Twitter ou fotos de chinelo nas redes sociais foi a sinalização dada pela economia norte-americana na última sexta-feira. Os EUA criaram quase o dobro do esperado de postos de trabalho no mês passado, espantando os temores mais pronunciados de uma recessão iminente.

Essa era a principal preocupação há pelo menos dois meses, desassossego que criou um bear market (queda de 20 por cento desde o último pico) em Wall Street. Se esse risco se arrefece, podemos voltar a investir em mercados emergentes, principalmente agora que o Fed (o banco central dos EUA) se mostra um pouco mais sensível aos comportamentos dos mercados financeiros, conforme sinalizou Jerome Powell em evento no fim da semana passada.

Mais interessante é que o Brasil vem aparecendo sistematicamente como um dos mercados emergentes favoritos para 2019. Ou seja, quando o fluxo começa a sair dos desenvolvidos para a periferia, o impacto pode ser brutal. A porta aqui é pequena e, na hora da entrada do capital estrangeiro, os efeitos podem ser muito mais substanciais do que nossas cabecinhas lineares gostariam de supor.

Fica reiterada, portanto, a visão de que, apesar de discursos ainda populistas aqui e ali e de algum bate-cabeça, estamos abandonando um Brasil estatizante, voluntarista, intervencionista, sem respeito ao dinheiro público e sem foco na eficiência do Estado. Morre um Brasil alimentado por 40 décadas pela noção de que o dinheiro da Viúva não tinha dono.

Se o seu 2019 começa hoje, ofereço um guia com cinco coisas práticas para você carregar pelos próximos meses e também anos, porque um novo país também tem sua própria cronologia para nascer e se desenvolver:

1. Compre uma posição bastante importante em ações. Faça isso com humildade. Você não precisa pegar a maior alta do ano. Lembre-se: a maior parte dos profissionais e das pessoas dedicadas somente a isso não vai pegar a maior alta do ano. Não há super-heróis. BOVA11 e SMAL11 já podem fazer muito por você.

2. Alongue suas posições em renda fixa. Vão tentar empurrar para você algum título de crédito ou algum fundo qualquer no segmento. Quase ninguém gosta de LTN 2029 ou NTN-B 2055 no Brasil. Ainda bem, porque sobra pra gente mais barato. São as minhas favoritas agora. O prêmio está justamente na ponta longona.

3. Separe um ou dois por cento do seu portfólio para comprar pó – aqui entendido devidamente, calma; depois da polêmica do ano passado, não falo mais do assunto. Só curiosidade: os “liberais” do mercado financeiro brasileiro leram a opinião de Milton Friedman sobre a liberalização das drogas? Bom, deixa pra lá. Deixo claro: sou completamente abstêmio, careta e esportista. Num grande bull market, os ativos que mais sobem são justamente aqueles de maior risco. O equity de empresas ruins está muito amassado. Não me surpreenderia, por exemplo, se o pessoal voltasse a falar de ação de incorporadora daqui a seis meses. Pense em George Soros, que, ao identificar um ciclo de alta de um setor, compra a melhor e a pior ação daquele nicho.

4. Reconheça o quão nebuloso está o cenário internacional. Por mais que eu esteja otimista (e estou!), sinto frio na barriga a cada indicador da economia global. Monte uma posição em ouro como forma de se proteger para um eventual grande reset da economia mundial depois de anos e anos de injeção de doses cavalares de liquidez, agora retiradas homeopaticamente.

5. Contrate um bom plano de Previdência. Se a turma da Singularity University estiver certa, nós não vamos morrer mais. Interromperemos a degeneração celular ali pelo ano de 2045 e alcançaremos a imortalidade. No longo prazo, todos estaremos vivos. Touché: Keynes estava errado! É o triunfo derradeiro dos neoclássicos (ou monetaristas, use a taxonomia que quiser), de alinhamento mais liberal e menos intervencionista, sobre os desenvolvimentistas. O melhor investimento disponível para Previdência está na Vitreo Gestão.