Opinião

Felipe Miranda: E agora, o que fazer?

10 set 2018, 11:16 - atualizado em 10 set 2018, 11:16

Por Felipe Miranda, estrategista-chefe da Empiricus Research

“Está tudo bem, estou apenas sangrando.” Poderia ser Jair Bolsonaro, mas é só Bob Dylan. Ou talvez não.

Registre mais este cisne negro nas atas; bota na conta do papa, sei lá.

O Brasil é o país onde eventos raros acontecem toda semana. “É fácil de ver sem olhar muito longe que quase nada é realmente sagrado”, apelando a Dylan novamente. Aquilo que supostamente está escrito na pedra como um mandamento desmancha-se no ar, de súbito, como num passe de mágica, atropelado por um evento imprevisível de alto impacto, considerado raro. Então, todos vamos rever nossas contas e certezas. Será que ainda temos certeza de algo?

Atrás do universo de aparências, das diferenças todas, só a esperança é preservada — amamos o Brasil pelo que ele poderia ter sido, se a maré das circunstâncias não o tivesse banhado nas águas do equívoco, pelas suas ilusões perdidas e pelos seus sonhos inúteis.

Só assim, de cabeça, focando apenas no universo da política sem pensar muito (Tico e Teco ainda dormem neste horário), me ocorrem quatro eventos considerados raros de consequências ferozes: o vazamento do áudio Dilma/Bessias/Lula, a queda do avião de Eduardo Campos, o “Joesleygate” e, agora, o atentado a Jair Bolsonaro.

Agora, claro, todos vão revisitar suas aplicações de recursos financeiros, justificando eventuais prejuízos com a máxima de que: “ah, isso não dava para prever. Trata-se de um evento totalmente fora do esperado. Não errei minha tese, é que ela não podia contemplar o imprevisível”.

Se o seu modelo não contempla a realidade, a culpa não é da realidade. Sempre vai ser assim. E, antes de tecer comentários particulares sobre o acontecimento — sim, farei isso também —, gostaria de usar o exemplo para propor uma mudança de paradigma geral.

Nenhuma estratégia de investimento deve ser concebida de modo a adivinhar eventos à frente, nem a antecipar eventos raros. Mas ela deve, sim, admitir a possibilidade de que eventos raros — sejam eles quais forem — possam acontecer no meio do caminho. Eu não sei se vai chover, mas carrego um guarda-chuva. “Estava sol de manhã, não dava pra saber que viria uma tempestade.” Você não pega o guarda-chuva porque sabia da pluviosidade iminente; você pega por precaução, por saber que algo inesperado pode acontecer.

Essa poderia ser a lição extraída do acontecimento na sexta-feira. Use o fato como ferramenta para lembrar-lhe que a caminhada será sempre permeada por surpresas — a esta altura em 2014, Marina Silva era cotada para ganhar no primeiro turno.

Veja: não estou falando da probabilidade de ocorrência de eventos raros até as eleições agora, depois do atentado contra o candidato do PSL. Eu insisti nisso reiteradas vezes, na semana passada mesmo, oferecendo uma série de estratégias para ganhar com a volatilidade de maneira não-direcional (ou seja, sem precisar apostar numa direção ou num vencedor a priori).

Feitas as considerações de cunho mais geral, posso agora falar da coisa em si.

A violência contra Jair Bolsonaro, em um aspecto, adiciona ainda mais incerteza ao processo eleitoral. Ao mesmo tempo, revela insights valiosos sobre o comportamento dos mercados daqui pra frente.

Antes de apontá-los, vale o esclarecimento de cunho pessoal: farei comentários focando estritamente as possibilidades de investimento para as pessoas físicas, decorrentes do novo cenário eleitoral. Isso transmite a falsa impressão de que não me solidarizo com a saúde do candidato do PSL. Peço desculpas por transmitir essa sensação equivocada. Com efeito, não é o caso. Fica o registro do desejo verdadeiro de pronta recuperação — Jair Bolsonaro nos atendeu duas vezes de forma muito cordial e, mesmo se assim não fosse, a solidariedade com o ser humano seria a mesma. Tenho um dever de ofício e, neste momento, ele me obriga a conectar três coisas: cenário eleitoral, investimentos e o seu bolso. Com o perdão da redundância etimológica, a vocação me chama.

Talvez a informação mais valiosa — insisto, em termos financeiros — seja a revelação do que o mercado realmente pensa a respeito de Jair Bolsonaro. Por conta de seu histórico de votações e a declarações no passado muito alinhadas ao nacional-desenvolvimentismo (aliás, bem parecido com a essência da nova matriz econômica do governo Dilma), havia certo ceticismo de como o mercado reagiria a uma eventual eleição do capitão reformado. Agora, não há mais dúvida. Se vai ser bom ou não para o País, não sei. Mas parece indubitável que a eleição de Bolsonaro traria alta destacada para os ativos brasileiros, ao menos num primeiro momento. Ótima notícia.

O segundo ponto importante se refere ao provável enfraquecimento da esquerda, com apontamentos em torno do radicalismo de algumas de suas áreas. Boa parte dos ataques eleitorais deve se voltar justamente contra elas, expondo as mazelas do discurso “nós contra eles”. Talvez aqui emerja espaço para algum candidato de centro ganhar espaço e reduza as probabilidades de crescimento de Fernando Haddad. Pode inclusive haver uma maior transferência dos votos anteriormente em Lula justamente para Bolsonaro, como a figura da vítima, conectada aos anseios da população mais pobre, menos educada e ávida por um pai protetor. Aqui não é um voto ideológico, mas quase psicanalítico. Em sendo o caso, diminui o risco de um cenário de cauda muito ruim, mais à esquerda, coincidentemente no espectro político e também numa distribuição de probabilidades. Também outra ótima notícia.

Somando as duas, temos um aumento das chances da concretização da tese do bull market estrutural, que encontraria apenas uma pausa para respirar agora, para voltar a se revigorar com as eleições. Um dos pilares da argumentação é justamente a migração do pêndulo em direção às políticas liberais e às reformas fiscais, cuja concretização em sua plenitude passaria pela eleição de um candidato mais à direita. No final do dia, a agenda se impõe.

Isso não significa, claro, que o atentado também não traga uma porção de dúvidas novas. Entre elas, destacaria:

• O evento será capaz de reduzir a rejeição a Jair Bolsonaro? Nas pesquisas de intenção de votos, ele perdia para todos os concorrentes em simulações para o segundo turno. Se acabar indo com um candidato de esquerda para a segunda etapa das eleições, como fica?

• Qual será o posicionamento de Geraldo Alckmin, que vinha atacando ferozmente o candidato do PSL? A estratégia começava a fazer os primeiros efeitos, aumentando a rejeição a Bolsonaro. Poderia, por aí, começar a subir e ir para o segundo turno, quando seria um candidato muito competitivo. Agora, talvez, tenha de mudar a estratégia, batendo mais na esquerda. Se será efetivo ou não, não sabemos, pois estamos em mares nunca dantes navegados. Ao mesmo tempo, se conseguir, podemos ter o segundo turno dos sonhos para os mercados, com Alckmin e Bolsonaro na disputa.

• Existe algum risco de que Lula desista da candidatura própria do PT e una a esquerda declarando apoio a Ciro, como forma de enfrentar o novo quadro eleitoral? Se for o caso, coloca a esquerda mais forte do que nunca na disputa e catapulta Ciro para o segundo turno. No entanto, como Lula nunca pensou na esquerda, mas, sim, apenas em si mesmo, parece improvável. Difícil esperar algo daí.

• Até quando dura a comoção? Precisamos ter cuidado para não extrapolar nas conjecturas a partir das pesquisas de hoje e de amanhã. Os efeitos emocionais ligados ao acontecimento em Juiz de Fora estão mais pronunciados agora e, ao menos em parte, podem esvair-se com o passar dos dias — em especial se Bolsonaro se mantiver provocativo, fazendo gestos como se carregasse uma arma em plena cama do hospital; pode sair da condição de vítima rapidamente e perder o empuxo eleitoral derivado da facada. Se exagerar, pode até voltar contra si, dando vazão a um clamor popular por união do país e abrandamento do radicalismo.

Tudo isso considerado, a matriz de retornos potenciais associada às eleições indica melhora do panorama para ativos de risco. Diante do caráter extraordinário do momento, eu e Luciana Seabra preparamos algo totalmente inédito aqui na Empiricus para  fazê-lo atravessar de farda preta essa guerra das eleições. Tudo para que você saia mais rico do outro lado.

“Se os meus sonhos pudessem ser vistos, eles provavelmente colocariam minha cabeça numa guilhotina. Mas tudo bem, mãe, é a vida e a vida apenas”, resumiria mais uma vez Bob Dylan.

E como ele mesmo diz: “Quem não está ocupado nascendo, está ocupado morrendo”. O tempo está passando. E, então, o que você vai fazer hoje?

O tempo está passando. E, então, o que você vai fazer hoje?

Antes de partir para os comentários mais cotidianos sobre a abertura dos mercados na semana, gostaria de convidar aquela turminha mais Nutella do mercado financeiro, autobatizada “value investor”, que está comemorando a queda das ações da Tesla porque Elon Musk foi pego fumando um baseado, para uma autorreflexão. Todos eles, príncipes na vida.

Enquanto você zomba com escárnio dos altos múltiplos da Tesla, Musk está tentando salvar a humanidade, oferecendo a todos nós uma alternativa de colonização de Marte para o caso de dar alguma zebra (algum evento raro qualquer) com a Terra.

E você, caríssimo, o que já fez pelo mundo?

Acho engraçadas as fofocas nos grupos de WhatsApp. Mas que tal fazer alguma coisa, de fato, pelo mercado?

Em homenagem ao falecimento do poeta Mr. Catra (cada um tem o Bob Dylan que merece), encerro com um pouquinho de funk ostentação: “fala mal, mas paga pau”.

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