Opinião

Felipe Miranda: Deixa que eu estico o fio, você afina a ponta

31 out 2018, 11:19 - atualizado em 31 out 2018, 11:19

Por Felipe Miranda, estrategista-chefe da Empiricus Research

Paulo Guedes desautorizou Onyx a falar de economia.

Onyx desautorizou Guedes a falar de política.

Começou o governo Bolsonaro, e assim somos apresentados à divisão do trabalho e ao processo de especialização do conhecimento, tal como formalizado originalmente em “A Riqueza das Nações”.

No icônico exemplo da fábrica de alfinetes de Adam Smith, um homem pega o fio, outro estica, um terceiro corta, o quarto afina a ponta, o quinto lixa a base e o sexto prega a cabeça do alfinete.

Tudo em paralelo, de forma que o primeiro homem não precisa esperar o último para iniciar um novo ciclo.

Em perfeita sincronia, que algoritmo maravilhoso!

Juntos, esses seis homens conseguem produzir 28 mil alfinetes por dia.

Isoladamente, processando todas as etapas por conta própria, cada homem produziria no máximo uns dois mil alfinetes por dia, perfazendo o total de 12 mil.

Logo, a divisão do trabalho permite à humanidade – ou, ao menos, às fábricas de alfinetes – um ganho de produtividade da ordem de (28/12 – 1) = +133,33 por cento.

Será que esse é o upside de Ibovespa que devemos esperar do rali Bolsonaro?

Quantas fábricas de alfinete encontram-se instaladas em Brasília?

Não sei quão detalhistas estão os exercícios de valuation nas planilhas do sell side, mas acho difícil que sejam mais técnicos do que esse dos alfinetes.

A aritmética de Smith, em todos os aspectos, prova-se mais robusta do que a aritmética de Damodaran.

Se contra números não há argumentos, por que então toda essa polêmica em torno de Guedes versus Onyx, Onyx versus Guedes?

A resposta aparece em outro livro de Smith, muito menos conhecido, mas tão ou mais importante: “A Teoria dos Sentimentos Morais”.

Algo diferente acontece quando o indivíduo que estica o fio começa a palpitar sobre o trabalho do indivíduo que afina a ponta (aos politicamente corretos, não é verdade que fazemos apologia às drogas no Day One).

Quando estabelecido o contrato social de divisão do trabalho, os advogados (por motivos óbvios) esqueceram de anexar a divisão da retórica do trabalho.

Isso posto, nada impede que um sujeito fale sobre o trabalho do outro, ainda que ele faça apenas a sua própria tarefa especializada.

Onyx vai falar um monte de merda sobre coisas que não entende.

Idem para Paulo Guedes (pessoas formadas em Chicago também falam merda).

A verdade é que todos falamos, e isso é diferente do que fazemos.

Graças a deus (meu deus está acima e abaixo de todos), fazemos merda em uma proporção menor do que falamos. Isso é o que vem salvando a humanidade até aqui.

O mercado leu “A Riqueza das Nações”, mas não leu “A Teoria dos Sentimentos Morais”. Logo, não consegue distinguir a arte de fazer da arte de falar.

Enquanto Bolsonaro não toma posse, o governo é pura retórica, mas faz preço quase como se fosse ação.

Eu estaria preocupado se Bolsonaro desautorizasse Guedes a fazer de economia.

De resto, que todos falem merda, escutem merda e vendam-se os jornais.

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