Colunistas

Felipe Miranda: Alguns dilemas – onde investir para nossos filhos?

07 dez 2020, 13:11 - atualizado em 07 dez 2020, 13:11
“Não há realização maior do que mudar efetivamente o comportamento de um núcleo familiar e ver que a Empiricus encontra sua vocação”, diz o colunista

Pausa na programação normal. A parte inicial deste Day One é escrita pela investidora Julia Kato. Ela tem mais a dizer do que eu: 

“Me chamo Julia, tenho 10 anos, moro no bairro Morada da Praia, na cidade de Bertioga, SP. Meus pais abriram uma conta no banco Next Joy para eu ganhar dinheiro, e como no bairro onde eu moro não tem banco próximo, toda segunda, quarta e sexta-feira eu vou em um correspondente bancário que fica no bairro e deposito 20 reais, e eu ganho esses 20 reais quando eu ajudo nas tarefas domésticas. O meu pai acompanha os conteúdos da Empiricus e da Vitreo, e no começo do ano ele abriu uma conta para mim na Vitreo. A ideia é juntar o acumulado do mês e colocar na Carteira Universa. E além da Carteira Universa, meu pai abriu pra mim uma previdência SuperPrevidência2 e pro meu irmãozinho de 4 anos uma Prev Arrojado.”

Em tempos insuportáveis, antes que surjam as acusações de falsidade no depoimento, breve esclarecimento para a patrulha: ele está publicado no meu Instagram para a devida verificação. A própria Julia o tornou público.

Achei bastante emocionante a história da Julia e da sua família. Nada pra mim é mais importante do que a família. No meu caso, ela se estende aos amigos mais próximos e à Empiricus. Certo ou errado, me desculpe por isso, nunca consegui separar muito bem essa história de vida pessoal e profissional. Eu gostaria mesmo de parabenizar a Julia e seus pais. E, mais do que isso, agradecê-los também.

Não há realização maior do que mudar efetivamente o comportamento de um núcleo familiar e ver que a Empiricus encontra sua vocação. No caso, de levar a pessoas comuns alternativas de investimento anteriormente disponíveis apenas para os profissionais ou para as famílias de grandes fortunas.

A Julia investe na mesma previdência que meus filhos, Maria e João Pedro. Fiquei pensando que os pais que nos acompanham talvez pensem na melhor forma de investir para os filhos e, por isso, resolvi escrever este texto.

Sabe, eu tenho uma grande dúvida: o quanto devemos deixar para os nossos filhos? Qual é a linha a ser percorrida entre facilitar demais, criando herdeiros despreparados para a vida (há algo pior do que isso?) e enrijecer além das necessidades, fomentando neuroses e angústias? 

Lembro da defesa de Winnicott por uma “good enough mother” — uma mãe suficientemente boa; não uma mãe boa demais, edípica e que acaba engolindo o filho. A função do pai, segundo Lacan, é a de colocar um objeto na enorme boca do jacaré, antes que ela devore o filho. Freud já era mais diretão: educar, analisar (no sentido psicanalítico) e governar, três coisas impossíveis; você sabe que vai fazer errado.

A paternidade é uma questão muito séria para mim. Incumbem você de cuidar e educar uma pessoa que você ama de maneira alucinada, mas esquecem de entregar o manual de instruções. Um jogo cujas regras não estão estabelecidas em pedra. Você é jogador, juiz e comentarista ao mesmo tempo. Ah, eu não posso com este mundo. 

Como não acho que haja “um único caminho certo”, não pretendo com as palavras de hoje servir de exemplo, tampouco me coloco na posição de dar conselhos. Resolvi apenas dividir onde está o dinheiro dos meus filhos, sem que isso soe “defecação de sapiência”. É apenas o meu jeito, baseado nos meus estudos de duas décadas de alocação de recursos e obsessão (é uma doença, confesso) pelo mercado financeiro, que talvez possa ser útil para você também. Nada mais honesto ou transparente: apresentar aos seus filhos o que eu estou fazendo para os meus. Não encontro outros meios de estarmos mais alinhados. Se você pensar em outro, por favor me diga, porque não há aqui algo mais caro do que meu desejo de alinhamento com o seu patrimônio.

Taleb costuma dizer: não me fale o que fazer com meu portfólio; me diga o que você está fazendo com o seu. Tomei a liberdade de estender o raciocínio para a prole. Dizer o que estou fazendo para o portfólio dos meus filhos.

Antes, eu gostaria de dizer que fiquei muito feliz em ver que o irmãozinho de 4 anos da Julia investe na Previdência Arrojada da Vitreo. Aqui, você percebe o entendimento das famílias sobre o conceito: se você tem mais tempo pela frente, pode investir em carteiras mais arriscadas, em troca de mais retorno potencial.

Muitas vezes, os bastidores acabam não chegando até as pessoas. Eu tenho um orgulho pessoal muito grande dessa Previdência Arrojada. Devo muito ao Jojo por ela também. 

Como os três leitores sabem, eu sou um “equity guy”, um sujeito nascido e criado no ambiente das ações. Sempre quis ter a possibilidade de levar aos assinantes da Empiricus uma previdência mais concentrada em ações. Basicamente, um bom plano de previdência feito de ações não existia para o varejo. 

Um pequeno desabafo: não é fácil estar na posição de CIO e de coordenar uma equipe de 40 analistas. Com a transparência de sempre, confesso que briguei bastante por essa previdência arrojada, que era uma demanda de parte significativa dos nossos assinantes. Eu gostaria muito de atendê-los. Era, como disse, um desejo meu também. O Jojo, da Vitreo, também gostaria de levar isso aos investidores. Mas encontrei enorme resistência da equipe à época, que se recusava a fazer, sob o argumento de que o investidor não seria capaz de compreender a volatilidade da Bolsa e sacaria no meio do caminho, arcando com o peso da tributação muito elevada pelos saques antecipados. 

Eu nunca concordei com isso. Sempre acreditei na capacidade de o investidor decidir por si mesmo e ser responsável pelos seus atos. Trato os assinantes da Empiricus como adultos.

Como sou idiota… Tentando equilibrar os argumentos, numa atitude desesperada, me rebaixei ao ridículo e cheguei a propor o seguinte: “Você diz que não gosta desse tipo de previdência, mas monta uma focada em ações do jeito que você quiser; fala que, embora você não goste disso, que não recomende, que acha que o investidor vai sacar no meio do caminho, que considera a pior coisa do mundo, da via Láctea e do Universo; caso o investidor queira montar uma carteira de previdência focada em ações, essa aqui, que você desenhou, é a melhor. Pode ser?”. 

“Sempre acreditei na capacidade de o investidor decidir por si mesmo e ser responsável pelos seus atos”, afirma Felipe Miranda (Imagem: Freepik)

Parecia óbvia a resposta para mim. “Eu não gosto da classe, mas, dentre todas, essa aqui que eu montei é a melhor, embora eu não recomende; é apenas e tão somente para quem quiser uma previdência focada em ações.” Isso rola, né?

Bom, nem sempre a racionalidade prevalece. “Não faço.”

Como respeitar a opinião individual (mesmo errada) de um de seus analistas e, ao mesmo tempo, fazê-los pertencer ao guarda-chuva institucional da Empiricus? Outro dos nossos dilemas aqui: o quanto deve um CIO impor suas convicções (afinal, ele, como líder da equipe, é o responsável último pelas decisões da área) e o quanto deve deixar prevalecer as posições individuais? Qual o limite entre a liberdade individual e a obediência institucional? E como essa linha se desloca quando o analista comete erros técnicos triviais?

Sou brasileiro e não desisto nunca. Depois de muita luta, conseguimos colocar de pé a Previdência Arrojada, com os melhores fundos de ações do ramo no Brasil. É lindo ver o irmãozinho da Julia lá, um sonho antigo meu.

Outra grande batalha — por mais incrível que pareça para quem conhece alocação patrimonial — foi a de incluir juro real de longo prazo nas sugestões de Previdência. Eu sempre gostei. Exemplo maior disso é que eu mesmo mantenho na física uma posição relevante de B50 no meu portfólio. Meus filhos, Maria e João Pedro, também carregam esses títulos em suas carteiras. O Jojo, da Vitreo, segue pelo mesmo caminho. E, felizmente, o Bruno Mérola, com anos de experiência na área como CFA, também trouxe essa expertise quando chegou, vindo da alocação de patrimônio para famílias ultrarricas no Itaú

Na verdade, não é exclusividade nossa. É algo bem básico. A B50 (ou Tesouro IPCA+ 2050) é uma posição estrutural importante na maior parte dos portfólios das famílias, pois preserva valor de compra no tempo e oferece um juro real (acima da inflação) bastante atrativo. No exterior, David Swensen, uma das maiores referências em alocação de longo prazo no mundo, é grande defensor dos TIPS (títulos atrelados à inflação), assim como Ray Dalio.

Essa é, portanto, a sugestão que eu gostaria de dar à Julia e ao irmãozinho dela. Além da SuperPrevidência2 e do Carteira Universa Prev, acho que vale a pena vocês comprarem um pouco de NTN-B 2050. Desse jeito, a previdência de vocês vai ficar igualzinha à minha e à dos meus filhos. A gente fica perfeitamente alinhado, como deve ser. Não é discurso bonito. É a vida como ela é, na prática, daqueles que fazem. Vale para a Julia e para o irmão dela; para a Maria e para o João. 

“Mundo mundo vasto mundo. Se eu me chamasse Raimundo, seria uma rima, não seria uma solução. Mundo mundo vasto mundo, mais vasto é meu coração.” Não tenho a solução para todos os problemas do mundo. Mas talvez a previdência dos seus filhos possa ser facilmente equacionada.

Compartilhar

TwitterWhatsAppLinkedinFacebookTelegram
Giro da Semana

Receba as principais notícias e recomendações de investimento diretamente no seu e-mail. Tudo 100% gratuito. Inscreva-se no botão abaixo:

*Ao clicar no botão você autoriza o Money Times a utilizar os dados fornecidos para encaminhar conteúdos informativos e publicitários.

Usamos cookies para guardar estatísticas de visitas, personalizar anúncios e melhorar sua experiência de navegação. Ao continuar, você concorda com nossas políticas de cookies.

Fechar