Opinião

Felipe Miranda: Ainda não comprou dólar? Jura?

03 set 2018, 9:33 - atualizado em 03 set 2018, 9:33

Por Felipe Miranda, estrategista-chefe da Empiricus Research

Se ainda não, por favor, talvez seja a hora de repensar. Não me importa muito como: se você vai investir num bom fundo cambial (a Luciana conta aqui  o ideal), se vai mandar grana pra fora (tudo legalmente, ok?) ou se vai operar no mercado futuro. O fundamental é ter alguma exposição em moeda forte neste momento.

Desculpe se tenho soado repetitivo sobre isso — e admito que tenho. Mas eu realmente não gostaria que você passasse esta eleição e este momento de estresse sem ter alguma coisa ali em torno de 10 por cento de sua carteira em dólar.

É preciso ter hedge (proteção) contra a chance de um cenário de cauda bastante adverso. Sim, ele existe e pode machucá-lo para sempre, formando cicatrizes insuperáveis para o resto da vida.

Se insisto reiteradas vezes no assunto é por acreditar que algumas coisas só são absorvidas por osmose. Aprendi com o Fábio Kanczuk ainda na faculdade — aliás, acho que foi a única coisa que aprendi lá.

Somente a repetição de certos exercícios permite sua real incorporação. Algumas coisas não entram de primeira, pois ferem nossa intuição original e a própria programação do cérebro. Defeito de fabricação. Só depois, após muita ruminação, indo e voltando no mesmo tema, sem que nos demos conta, acontece a fagocitose. Vale para a Economia Matemática importada ipsis litteris da Universidade de Chicago (sim, ele copiava as anotações na lousa em inglês), vale para o viés local de nossos investimentos (o quanto resistimos a ativos estrangeiros por conta de desvios cognitivos).

À época do primeiro curso realmente formal de Economia, eu me dividia entre as integrais duplas e os goles de café amargo — ambos se misturavam, os últimos eram a forma de continuar acordado para enfrentar as primeiras.

Hoje, “dois problemas se misturam. A verdade do universo e a prestação que vai vencer”. Raulzito tinha razão. Acho que é bem por aí.

“Você fala sobre os investimentos? Ou você fala sobre o mundo?”, perguntaria o leitor mais pragmático.

Sem encontrar respostas enquanto os dois neurônios ainda dormem, à espera do despertador típico, da atrasada cafeína que hoje parece ter perdido seu trem (Dona Graça atrasou, para meu desespero), apelo a Clarice Lispector:

“Sou como você vê. Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania. Depende de quando e como você me vê passar.”

Posso, sim, dar-lhe uma indicação quente de investimento — naquilo que entendo por quente: uma aposta bastante assimétrica diante de um cenário incerto. Nada mais do que isso. Se você quer um tiro curto por exemplo, BRCR11 me parece prontinho para decolar. Daniel Malheiros pode lhe dar mais detalhes para extrair Renda Imobiliária.

Mas minha pretensão mesmo é outra — e aqui emprego “pretensão” no sentido de que, de fato, talvez seja uma posição pretensiosa. Quero passar-lhe uma visão de mundo. Uma sugestão de BRCR11 pode valer, sei lá, 15/20 por cento, mas uma mudança de paradigma sobre a forma de investir não tem preço. A primeira vale para já. A segunda vale para já e para sempre.

Tudo se resume a isto: transferir o foco das tentativas de adivinhar o que vai acontecer para o controle da matriz de payoffs (perfil de retornos potenciais em cada um dos cenários). Não precisamos ir muito longe: a esta altura, nas eleições passadas, Marina Silva estava platonicamente eleita, com chances de liquidar a fatura no primeiro turno.

Você jamais poderá controlar o mundo e moldá-lo às suas próprias convicções e expectativas. Em contrapartida, poderá ter as rédeas sobre sua carteira de investimentos. Vamos nos ater àquilo que podemos controlar.

Estão todos preocupados com o que vai acontecer. Debruçam-se sobre as pesquisas eleitorais, fazem seus trackings próprios gastando zibilhão por semana nisso (não só dinheiro, mas também tempo, que, ao menos pra mim, custa muito mais). Chega a ser ridículo. Por que as pessoas resistem tanto a simplesmente dizer: “eu não sei”. Porque, cara, nessa história só há uma verdade: ninguém sabe nada mesmo. É impossível antecipar o resultado da eleição. A coisa está totalmente aberta, podendo dar qualquer combinação de dois entre os cinco concorrentes materiais. Quem diz o contrário mente ou não se dá conta da própria arrogância, do autodesenvolvimento do poder de vidência. Nós simplesmente não sabemos. Ninguém sabe. E ponto final.

Minha preocupação recai sobre o que vai acontecer com seu portfólio, em termos agregados, a partir das eleições.

O que podemos fazer mesmo sem saber o resultado da eleição? Essa é a real pergunta de cunho prático.

Quando falo sobre comprar dólares, por exemplo, não é necessariamente porque projeto uma alta iminente e intensa da moeda norte-americana contra o real.

Aí está outra coisa que ninguém sabe. Faço porque há um risco de o dólar disparar e isso afetá-lo muito fortemente.

“Ah, mas e se o dólar cair?”

Não tem problema.

Peço licença aos leitores do estrangeiro, mas provavelmente você mora no Brasil e tem boa parte da sua grana alocada em ativos locais.

Ou seja, se o dólar cair, significa que superamos a crise dos emergentes e elegemos um candidato minimamente reformista (ou que a agenda se impôs a despeito do candidato, o que dá na mesma em termos pragmáticos). Então, ainda que você perca um pouco de dinheiro no dólar, vai ficar tudo bem. Sua posição em ativos locais vai subir muito, seu emprego e/ou sua empresa vão andar bem. Você não vai estar louco precisando de dinheiro.

Problema seria o contrário: tudo dar errado ao mesmo tempo e você precisar de liquidez numa hora em que não há de onde tirar, pois todas as posições estão num enorme prejuízo, a preços de banana (breve depoimento pessoal: foi exatamente o que aconteceu à família Miranda quando do estouro da Nasdaq e daqueles termos de PLIM4, as famosas Globo Cabo, ou Globo Nabo para os íntimos; posso lhe assegurar: não foi bacana).

Mas além de comprar dólares, cuja aparição aqui está mais frequente do que Zezé di Camargo nos reclames do Plim-Plim, há algum outro ativo que pode ser legal de comprar mesmo sem saber do resultado das eleições?

Penso em imóveis e ações de educacionais.

Imóveis pelo seguinte: se der um candidato legal, tudo no Brasil vai voar. Juro longo desaba, prêmio de risco também. Crédito volta, demanda também. Já se der ruim na eleição, dólar explode, inflação vai junto. Você fica com um ativo físico na mão, protegido da inflação, que pode salvar-lhe da hecatombe.

E as educacionais também podem obedecer a dois senhores distintos. No caso de um resultado positivo das eleições, ações vão subir no geral e elas carregam alguma veia de “beta play” (sobem junto com o mercado e com o PIB). Aliás, para um “Brasil bom”, os múltiplos de Kroton e Estácio parecem bem deprimidos (claro, o problema é a premissa). Já no caso de um nacional-desenvolvimentista ser eleito, pode vir muito populismo via Fies, o que também seria bom para essa turma.

Se me perguntassem o que a Empiricus sabe mais do que os outros, talvez eu respondesse: “A gente sabe que não sabe”.

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