Empiricus Research

Felipe Miranda: A verdade é filha do tempo

26 mar 2019, 10:32 - atualizado em 26 mar 2019, 10:32

Talvez eu viva no mundo das esperanças ingênuas, onde antes da formação das opiniões viria um conhecimento mais aprofundado sobre o respectivo assunto. Tomado pela bênção dos ignorantes, lancei o mantra “conheça primeiro; critique depois”. Ainda que esteja errado, nele prefiro viver. O espírito ninguém vai conseguir quebrar. Bem-aventurados aqueles que ainda não perderam a capacidade de se indignar.

Tenha o MELHOR E MAIS EXPERIENTE TRADER DO BRASIL como o SEU ASSESSOR [CLIQUE AQUI]

Antes de partir para o tema do dia propriamente dito, convido-o a assistir à entrevista que dei ontem para a Luciana Seabra no Seu Dinheiro — sempre uma honra e um prazer poder falar com ela. Diante do voraz escrutínio despejado sobre minha vida nos últimos 15 dias (cara, na boa, não é tão interessante assim, posso lhe assegurar), deixei tudo esclarecido lá. Transparência radical, nas palavras do Ray Dalio. Nas palavras da Lu, passamos pelos temas mais espinhosos: Bettina, CVM, regulação, modelo americano de publicações, quais ações comprar agora.

Entrevista com Apex Capital: fundamentalista, verdadeira e transparente

Agora podemos começar, apelando a João Ubaldo Ribeiro:

“Não existe essa coisa de entrelinhas. Pelo menos nos livros honestos, como este, não há nada nas entrelinhas. Tudo deve ser procurado e será devidamente encontrado nas linhas, aqui não são oferecidas entrelinhas, à merda o entrelinhador, pode largar este livro e ir gastar seu tempo ruminando o bolo alimentar de sempre. Melhor do que ler textos diretos querendo ser esperto e vendo nele coisas indiretas.”

Já usei o trecho em ocasião anterior, quando da época do Fim do Brasil. Dado o paralelismo das coisas, ele volta agora.

Se você for andar por aí antes de uma decisão de investimentos, recomendo procurar nas entrelinhas. Nos grandes bancos, o lobo aparece em pele de cordeiro, com fala mansa, moderada e comedida.

O discurso macio serve para vender aos clientes, sempre muito bem tratados, investimentos normalmente bons para o próprio banco, claro. Todos têm bocas a alimentar e boletos a pagar. E atuarão em benefício deles mesmos. Então, se o investidor ler apenas as linhas, ou só ouvir as vozes suaves do agradável gerente, acabará em produtos caros e ruins.

Não é uma hipótese ou uma ideia. Mas um fato objetivo. Veja quanto dinheiro está parado na poupança, em fundos de Previdência que cobram 4% ao ano, em PICs, títulos de capitalização, CDBs ruins e por aí vai. Por isso, é preciso ler as linhas, as entrelinhas e todas as camadas e mensagens escondidas possíveis emitidas pelos bancos.

Aqui não. O leitor pode só ficar com as linhas mesmo. Até porque não há entrelinhas — com exceção, confesso, de uma ou outra mensagem subliminar enviada no meio, sempre de cunho pessoal, tipo piada interna.

Eu tenho uma única pele: emito opinião sobre investimento sem conflito de interesses, com a ajuda de uma brilhante equipe de 32 especialistas, muito bem formados, na prática e na teoria, e muito bem remunerados. Para fazer isso em escala, com qualidade e poder pagar essa brilhante equipe, utilizo um marketing barulhento. Foi a forma que encontramos para quebrar a inércia da poupança, provocar real mudança de comportamento e levar à pessoa física, nos mais variados lugares do Brasil (por meio de nossa abordagem digital e disruptiva), ideias tão boas ou melhores do que aquelas restritas aos profissionais. De novo: sem escala, seria impossível oferecer material de qualidade para os assinantes (desculpe, mas não existe boa equipe de pesquisa em finanças com meia dúzia de pessoas). É isso que eu faço. Essa é a minha pele.

Aproveito para lançar hoje publicamente a ideia do grande Tito Gusmão, da Warren, do Selo Sem Conflito, já noticiada pela Exame. O objetivo é reunir todos aqueles realmente interessados em oferecer ao investidor alternativas de investimento sem os conflitos de interesses da indústria financeira tradicional. Quem ganha? O próprio investidor, hoje tão assediado por discursos bonitos capazes de esconder produtos caros e ruins.

O Warren, assim como a Empiricus, é um representante desse movimento. E aqui agradeço formalmente ao grande Tito por ser precursor desse movimento. Não o conheço pessoalmente ainda, mas tenho as melhores referências possíveis a seu respeito. Estou ansioso para encontrá-lo.

Pi e Vitreo, outras empresas à frente de iniciativas na mesma direção, ficam já convidadas para também ingressar no movimento. Se você também se empenha em obedecer a somente uma única agenda, ou seja, aquela do investidor, sem receber taxas ou rebates sub-reptícios por trás, fica aqui o convite para juntar-se a nós. Mande um e-mail para felipe.miranda@empiricus.com.br, com o título “SELO SEM CONFLITO” e a gente tenta reunir todos aqueles que têm por objetivo a transparência no trato com o investidor. Felipe Bottino, CEO da Pi, tem excelente artigo publicado hoje no Valor Econômico sobre os problemas inerentes aos conflitos de interesse e as altas taxas, por vezes não percebidas pela falta de transparência, cobradas do varejo.

Talvez você tenha estranhado a presença de uma corretora, principalmente uma ligada a um banco, na relação de empresas capazes de oferecer uma relação não conflitada com seu cliente. Não há problema algum. Não se trata de razão social aqui, mas da estrutura de incentivos. Antes das leviandades, já esclareço: não, eu não me vendi ao Santander.

É necessário entender a natureza do que gera o conflito. Toda vez que o vendedor estiver, simultaneamente, ocupando também uma posição de aconselhamento, tácito ou formal, ele estará em uma situação de conflito.

O gerente do banco ou o agente autônomo da corretora recebe remunerações diferentes a partir da venda deste ou daquele produto financeiro. Portanto, ele estará incentivado a estimular, ainda que de forma velada, a compra dos produtos que geram maiores taxas para ele mesmo (gerente ou agente autônomo). Pessoas obedecem a incentivos. E é essa a essência do problema. Fique claro: não é um problema das pessoas, mas das instituições que montaram essa estrutura de incentivos.

Há uns meses, Steven Spielberg criticou a indicação ao Oscar de filmes produzidos pela Netflix. Ontem, ele estava lá anunciando a parceria com o serviço de streaming da Apple. Exponha o sujeito ao conflito, qualquer sujeito, e ele uma hora vai cair, alerta Dan Ariely. Mesmo os gênios humanos são… humanos.

O investidor acaba comprando um produto que, muitas vezes, é bom mesmo para o próprio banco ou corretora, pagando altas taxas e rebates. Não para ele mesmo. Portanto, todas as situações em que o aconselhamento e o direcionamento do investidor estiver efetivamente (e aqui é importante a natureza prática da coisa, não a formalidade) apartado da atividade de venda e distribuição são candidatas a receber o selo. Podem ser empresas publicadoras, casas de análise independente, gestoras, corretoras, até mesmo banco — basta que cumpram a essência, não os rótulos. A rosa teria o mesmo cheiro se tivesse outro nome.

Vivo minha própria essência. Qual é a ideia que posso oferecer hoje?

Há duas coisas mais sistêmicas na minha cabeça agora. A primeira ligada a um aumento de volatilidade do Ibovespa a partir de qualquer ruído de cunho macro, seja ele de natureza doméstica (em especial em torno da Previdência), ou internacional (agora, mais ligado ao temor com a Previdência).

Identifico ao menos uma razão para isso. E acho importante marcar o ponto para que o investidor tome essa maior medida de dispersão como uma dinâmica natural e frequente. Não se assuste com sua recorrência.

Entendo que ao menos parte dessa dinâmica esteja associada ao volume de recursos geridos agora por fundos multimercados brasileiros e sua experiência recente.

Ao longo dos anos de 2017 e 2018, esse pessoal captou quantidades industriais de dinheiro — e não me venham com papo de que a culpa é das plataformas de varejo, porque grandes alocadores institucionais alimentaram largamente o fenômeno. O narcisismo das pequenas diferenças. O que teve de gestor de fortuna estimulando a aventura empreendedora no exterior de gestor de multimercado foi uma grandeza. E também teve asset cumprindo papel importante no processo, ao pagar rebate gordo e estimular uma captação além de suas próprias capacidades.

Qual é o resultado prático disso? Primeiramente, muito gestor se viu obrigado a manejar um volume de recursos grande demais. Uma coisa é montar posição em cima de 1 bilhão de reais, outra é gerir 30 bilhões. Diante desse caminhão de dinheiro, o cara foi lá pra fora, aplicar nos mercados internacionais. Só que a vantagem competitiva no exterior é muito baixa. É uma crítica aos gestores? Claro que não. Essa turma é absolutamente genial. Mas o jogo é outro e altamente competitivo. “Tough ain’t enough”, diria Clint Eastwood para sua Menina de Ouro (hmmm, me parece apropriado para o momento; sigo…). Da mesma forma, o Ray Dalio é gênio, o Bill Gross, o Druckenmiller e por aí vai.

Como desdobramento prático, muita gente — e muita gente boa, competente demais — bateu de cara no muro. E agora vive uma espécie de “back to basics”, de ter de voltar às origens e focar mais no mercado local. Então, agora temos um caminhão de dinheiro potencial para entrar (e sair) nos ativos domésticos. Qualquer movimentação na margem dos fundos multimercados gera grandes variações de preços.

Como agora estamos naquele modo festa junina em torno do tema Previdência (olha a chuva, olha a cobra…), num vaivém danado, esses caras vão calibrando suas posições na margem a cada notícia, catapultando as variações diárias para além do razoável. E aqui preciso dizer: fundo multimercado costuma ser bem “mão fraca” em Bolsa; essa turma é espetacular para negociar câmbio e juro, mas pouca gente tem surfado bem os ciclos de ações e feito adequadamente o “stock picking”.

O outro ponto aqui das minhas ideias fixas diárias, e isso é uma espécie de confissão sobre meu caráter obsessivo sobre algumas coisas, se refere à pergunta que tenho recebido bastante: “O que falta para voltarmos a caminhar na direção do seu batizado bull market estrutural?”.

Pensei muito sobre isso. Qual o elemento material capaz de nos devolver à rota?

Encontrei um: o tempo.

É ele quem vai nos trazer a reforma da Previdência e pavimentar a via para o endereçamento de nossa crise fiscal. Isso abre o caminho para o Copom cortar a taxa Selic (há indicações nesse sentido na ata de hoje) e para a posterior retomada mais efetiva da atividade e dos lucros das empresas.

É também ele que vai mostrar ao gringo, assustado com as matérias assustadoras do influente Glenn Greenwald, que pode vir ao Brasil, que isso aqui não vai se transformar numa ditadura de direita, nem na Venezuela. A percepção neste caso importa mais do que a competência — por morar no Rio e ser percebido como hábil, Greenwald acaba sensibilizando parte relevante da opinião pública norte-americana sobre o Brasil. Surpreendentemente, essa influência conseguiu chegar até mesmo à Fox News, por mais contraintuitivo que isso possa parecer.

Aos poucos, a luz vai chegando e esclarecendo as coisas. O sol é o melhor detergente. Com o passar do tempo, sempre rei, percebemos que toda vez em que parecer que o Brasil vai cair no buraco, ele não cai, porque ele é maior do que o próprio buraco. Na semana passada, a Previdência estava arruinada. Com o medo de explodir o país, hoje as notícias todas apontam para o arrefecimento das tensões: “Governo abranda tom e Maia já acerta com Paulo Guedes”; “Clima no STF é favorável à reforma”; “PG vai à CCJ falar da reforma da Previdência”; “Sérgio Moro diz que atrito com Câmara foi superado”. Vai ter volatilidade e vai passar.

O gringo vai vir não somente pela Previdência (embora também por ela), mas porque o tempo vai mostrar que ele não precisa ter medo. Quando ele vier, será de uma vez, de maneira nada linear e gradual, como sempre é. Como diz Gilberto Gil em Tempo Rei: “Tudo agora mesmo pode estar por um segundo”. A verdade é filha do tempo. E só ela mesmo sabe o tempo em que vai se revelar. O melhor é estar posicionado.