Felipe Miranda: 4h20
Por Felipe Miranda. CIO da Empiricus Research
Meus amigos da Vila Madalena contaram que o horário das 16h20 seria socialmente aceito para se fumar maconha. Eu, que gosto da Vila Madalena só para jantar no Chef Vivi ao som da bela playlist oitentista do maître Fernando, e desgosto ainda mais de maconha (nada contra também, fique claro), fui conferir na internet.
Se o Google estiver certo, a lenda teria começado com um grupo de estudantes californianos que curtiam interromper as aulas para dar um “pega” no baseado quando o relógio marcava esse horário. Rolava encontro formal e tudo.
O dia 20 de abril até virou uma espécie de feriado da contracultura, batizado de Pot Day. E como a contracultura costuma ser na verdade um ótimo motivo para desenvolver-se um mercado consumidor altamente capitalista, aquilo, claro, evoluiu para um negócio.
A data costuma ser usada em caráter político e também empreendedor, ancorando vários eventos corporativos e manifestações em prol da descriminalização da erva para fins medicinais e terapêuticos. Nos EUA, por exemplo, como o uso médico e terapêutico já é permitido em boa parte dos Estados, os esforços têm se concentrado em favor da federalização da questão. Aqui, as coisas, como de costume, são um pouco mais lentas e demoram um pouco mais. De todo modo, o caminho parece também inexorável.
Não à toa, as venda totais nos EUA no mercado de cannabis saíram de US$ 2,7 bilhões em 2014 para US$ 10,82 bilhões em 2018. E encontram-se estimativas de que o mercado norte-americano atual seja de US$ 16,9 bilhões, enquanto o mercado global poderia ter um potencial de US$ 300 bilhões. Temos um interesse particular nesse mercado, pelo bom uso medicinal e terapêutico que possa vir a ter, salvando algumas famílias de situações e doenças delicadas, ou ao menos aliviando a dor de alguns; e, em termos financeiros, pelo caráter potencialmente exponencial que as ações do setor possam vir a ter.
Além de indicarmos algumas ações do setor na nossa série MoneyRider, ajudamos a viabilizar uma forma fácil de acesso ao segmento por meio de nossa parceria com a Vitreo. A gestora já havia lançado o primeiro fundo brasileiro de cannabis, voltado a investidores qualificados. Como, no entanto, muitos investidores estavam fora dessa qualificação e demonstraram interesse em também ter uma pequena exposição ao setor, a Vitreo criou um novo fundo, sem essa restrição, democratizando a alternativa para todos os investidores de varejo, em linha com a nossa missão e o nosso propósito aqui.
A partir de hoje, ele está disponível para aplicação de todos aqueles que se interessam pelo setor e gostariam de ter uma pequena exposição a retornos potencialmente assimétricos e convexos. Investidores de varejo aplicando seu dinheiro de forma tão eficiente e sofisticada quanto os profissionais do mais alto nível: essa é a nossa razão de existir. Acreditamos nisso e perseguiremos essa vocação obstinadamente, pelas próximas dez décadas.
Sincronicidades jungianas…
Ontem, o dólar encerrou, pela primeira vez na história, acima dos R$ 4,20. O novo recorde alimenta perguntas sobre a trajetória futura do câmbio e sobre seus eventuais desdobramentos sobre a inflação, com chances de respingar sobre as decisões do Copom e a taxa Selic. Atingida essa mitológica marca, faríamos uma parada técnica para um relaxamento? Ou continuaremos subindo para patamares capazes de dilatar ainda mais nossas pupilas, preocupados com o enfraquecimento de nossa moeda?
Começo com a ressalva. O câmbio é o cemitério das reputações. A variável criada pelos economistas para fazer os meteorologistas passarem menos vergonha em suas previsões e encontrarem rivais à altura de seus erros. Só há dois tipos de comentaristas sobre o futuro do dólar: aqueles que não sabem, e aqueles que não sabem que não sabem. Felizmente, pertencemos ao primeiro grupo.
Dito isso, algumas considerações. A primeira delas é que, em termos de fundamentos econômicos estritos, para aqueles que acreditam em modelagem, a taxa de câmbio de equilíbrio estaria hoje em torno de R$ 3,95. Alguma coisa por aí. Ou seja, o dólar parece caro aos níveis atuais.
Vamos shorteá-lo, portanto?
Definitivamente, não é o caso. Retorno à essência da nossa filosofia: X não é F(X). Podemos ter muita dificuldade em entender a realidade (X) e antever o futuro do dólar, mas podemos, mais facilmente, compreender como o dólar afeta nosso portfólio. Construo a argumentação por aí.
O primeiro ponto é que o dólar tende a ficar forte no mundo. Por uma razão objetiva: ela pode ser vista tanto como uma “moeda de crescimento” quanto como uma “moeda de diferencial de juros”, frente aos demais países desenvolvidos. Os EUA ainda crescem mais rapidamente do que a Europa e o Japão e pagam mais juros em seus títulos. Isso é um fator natural em prol da atração de fluxo de recursos. Economia forte tem moeda forte.
Aqui dentro, ainda que os fundamentos do mercado de bens sobretudo possam indicar fortalecimento do câmbio e possamos contemplar uma melhora no fluxo financeiro com IPOs, privatizações, concessões, etc., o diferencial de juros contra o resto do mundo caiu muito e deixamos de ser uma moeda destino do carry trade. As empresas passaram a se financiar em reais e, inclusive, estão recomprando sua dívida em dólar, sendo Petrobras o exemplo mais emblemático (e fazedor de preço).
Cumpre também dizer que, num cenário de desaceleração global, tal como se apresenta agora, dificilmente há espaço para uma apreciação vigorosa das commodities. Sendo, de forma certa ou errada (não importa), as moedas emergentes tradicionalmente associadas aos preços das matérias-primas, encontraríamos obstáculo adicional para uma recomposição de preço do real.
Sei que podemos passar a ser vistos como uma moeda de crescimento a partir de 2020. Também entendo que todo o processo de privatização, concessão, IPOs, follow-ons, melhora do fluxo de capital para Bolsa e outras coisas parecidas podem levar a uma apreciação para o real. Vejo, ainda, o equilíbrio de longo prazo mais perto de R$ 4,00 do que de R$ 4,40, de tal modo que a assimetria do dólar não estaria tão convidativa.
Ao final, não sei qual das forças vai prevalecer. Sendo bem sincero, ninguém sabe. Só os charlatões, claro. Meu ponto apenas é que, entre três mercados, a saber: Bolsa, juro longo e dólar, esse último é aquele em que tenho menor convicção. Ou seja, os dois primeiros parecem apostas mais certeiras, enquanto o dólar desponta como uma opção interessante de hedge barato às pesadas posições em ativos de risco brasileiro. Por isso, seguimos comprados na moeda norte-americana em nossas carteiras, ainda que em proporções um pouco menores agora. A R$ 4,20, é hora de fazer uma pausa.