Falta de chips leva montadoras a repensar pedidos ‘just-in-time’
Um século depois que as montadoras mostraram ao mundo o valor das linhas de montagem, a escassez de semicondutores dá à indústria uma lição sobre o que é necessário para fabricar um carro.
Durante a maior parte de sua história, o setor confiou em uma abordagem distinta para comprar autopeças, adquirindo componentes de fornecedores no momento em que eram necessários. O sistema é conhecido como fabricação “just-in-time” e é projetado para agilizar a produção e eliminar os custos de manter os depósitos cheios com peças esperando para serem usadas.
Mas as deficiências desse sistema ficaram evidentes este ano, quando montadoras não tinham os chips necessários para incorporar funções avançadas em seus veículos e foram para o fim da fila dos clientes de fabricantes de semicondutores por causa do sistema just-in-time.
Essa escassez ameaça reduzir as vendas do setor em US$ 110 bilhões e também leva montadoras a reformular como obtêm os componentes eletrônicos que se tornaram essenciais para o design contemporâneo dos automóveis.
“Os clientes precisam mudar”, disse Hassane El-Khoury, diretor-presidente da ON Semiconductor, que recebe mais de um terço de sua receita do mercado automotivo. “Essa mentalidade just-in-time não funciona.”
Fabricantes de semicondutores estão exigindo pedidos garantidos de longo prazo, em vez da flexibilidade de curto prazo à qual montadoras estão acostumadas.
A assertividade dos fabricantes de chips, mesmo sob pressão de políticos, destaca o reequilíbrio de poder, que migra das empresas cujos logotipos estão nos carros para aquelas que fornecem a tecnologia avançada no comando.
Como esses componentes têm maior peso em tudo, desde entretenimento para o carro até funções de direção autônoma, fabricantes de chips dizem que estão dispostas a investir na expansão da produção para evitar uma repetição da escassez que levou à paralisação de fábricas e licenças de trabalhadores – caso as montadoras façam pedidos que não possam ser cancelados e se comprometam com contratos de longo prazo.
“Por que eu investiria um único dólar se meu cliente pode cancelar em 30 dias e levo dois anos para construir capacidade?”, disse El-Khoury, da ON Semiconductor.
Há sinais de que as montadoras estão ouvindo. Na semana passada, o CEO da Ford, Jim Farley, indicou disposição de reverter décadas de terceirização de peças.
“Com a mudança da indústria, temos que fornecer internamente agora, assim como fornecemos os trens de força nos anos 20 e 30”, disse Farley, que fechou metade das fábricas e cujos revendedores ficaram com pátios vazios por causa da falta de chips.