Ex-diretor critica velocidade da agenda de digitalização do BC e alerta para riscos
O economista Beny Parnes, sócio da SPX Capital e ex-diretor do Banco Central, fez duras críticas nesta quinta-feira à rapidez com que a autoridade monetária está conduzindo o lançamento da sua plataforma instantânea de pagamentos, o Pix, também expressando preocupações de segurança e ameaça à competição com o open banking.
Em live organizada pelo BTG Pactual (BPAC11) em parceria com a PUC-RJ, Beny avaliou que o Pix, que entrará em operação em novembro, é ideia muito boa, mas “extremamente frágil” do ponto de vista de segurança, com um cadastro muito simples para um país como o Brasil, onde não há segurança para portar um celular na rua.
“Eu não tenho Pix, eu não quero correr o risco de ser assaltado na rua e ter que digitar lá uma senha de celular e o limite de transação do Pix ser igual dos meus TEDs”, disse ele.
“Pix é interessante, mas eu acho que tem preocupações que têm que ser tomadas e eu acho que a velocidade não está permitindo isso. Acho que tem que ir com calma, mais calma. Não há essa necessidade de fazer as coisas tão rápido, ainda mais agora”, completou.
Beny ponderou que a pandemia de coronavírus fez o número de transações digitais explodir, com aumento também no número de fraudes, que poderiam crescer ainda mais com o acelerado processo de digitalização tocado pelo BC.
O pagamento instantâneo pelo Pix funcionará 24 horas por dia, todos os dias do ano, a um custo operacional significativamente mais baixo que o de modalidades já consolidadas no mercado, como transferências do tipo TED ou DOC e pagamentos por cartões de crédito e débito. Segundo o BC, o custo do Pix é de 1 centavo para 10 transações. A plataforma começará a funcionar em 16 de novembro.
As transações poderão ser feitas com a utilização de chaves, como o número de celular, CPF, CNPJ ou e-mail, sendo que o cadastramento dessas chaves começará em 5 de outubro.
Também participante da live, o diretor de Organização do Sistema Financeiro e Resolução do BC, João Manoel de Mello, defendeu que a governança envolvendo o Pix foi estabelecida por meio de fórum que opera há dois anos, com o BC escutando o mercado.
Mello afirmou que as necessidades de segurança foram analisadas e que o grupo de trabalho específico sobre o tema foi liderado pela Febraban, federação dos bancos no país.
O diretor disse ainda que a imposição regulatória é que a instituição financeira ou de pagamentos não poderá fixar um limite para o Pix abaixo do que é vigente para o cliente fazer uma TED. Mas o cliente poderá, por exemplo, pedir que o seu limite para o pagamento via Pix seja menor, de 100 reais por exemplo.
“É um atribuição do cliente”, afirmou Mello.
Open Banking
Beny também fez críticas ao open banking, sistema que dará aos clientes de instituições financeiras o poder sobre seus dados cadastrais e de transações, como meio de abrir o acesso a serviços mais baratos e melhores.
O modelo começará a funcionar no fim deste ano e integra a agenda institucional do BC para melhoria de competitividade no sistema financeiro, sendo que o presidente do BC, Roberto Campos Neto, já afirmou que o sistema abarcará no Brasil todos os produtos financeiros, incluindo seguros e investimentos.
“Eu não vou ceder (dados)”, disse o ex-diretor do BC, justificando que o limite do cartão de crédito é um dado que circulará no âmbito do compartilhamento e que poderá sofrer mau uso.
Beny afirmou que há série de questões “mal resolvidas” associadas a essa abertura de dados, citando a lei de responsabilidade social e a lei de sigilo bancário.
“Essa lei de compartilhamento de informações é boa, mas tem que ser muito bem pensada, e eu acho que está fácil demais. E daqui a pouco vai começar a ter fraude, o Brasil é um paraíso de fraudes”, opinou.
Ele também avaliou que o grande embate do futuro em relação à competição no sistema financeiro se dará entre as gigantes de tecnologia, mais conhecidas como big techs, e os bancos.
Para Beny, essas empresas terão uma “vantagem incrível”, já que, ainda que pela lei elas também serão obrigadas a ceder informações dos clientes caso eles deem o aval para tanto, a tendência é que isso não ocorra.
“O banco abre a informação dele. Mas, em compensação, ele também tem o direito de pedir a informação do Facebook, da Amazon e tal. É obvio que o cliente não vai dar a outra. Mas essa aqui (do banco) ele vai dar”, disse.
Ele pontuou que, no afã de incentivar o competição, um oligopólio pode acabar sendo criado do outro lado, com as big techs, a partir da instauração de uma assimetria de informações muito grande.
“Você pode criar um Big Brother mesmo”, afirmou ele. “As big techs, que são as plataformas, vão oferecer os produtos das fintechs embaixo e a soma das fintechs embaixo é que vai agregar os grandes riscos. Essa é a minha visão desse problema.”
Mello, por sua vez, justificou que a decisão cautelar tomada pelo Banco Central em relação à entrada do Whatsapp em pagamentos no país, que acabou barrada, contemplou justamente preocupações sobre a atuação de big techs na área e os desafios regulatórios que são impostos com isso.
“Lógica foi essa, não é impedir ninguém, não é proteger ninguém, proteger PIX, não é proteger banco grande, muito pelo contrário”, disse o diretor do BC.
Ele defendeu que qualquer entrada competitiva é bem-vinda, mas que o regulador tem que garantir justamente essa condição com alguma similitude regulatória.
“Quando você fala em proteger a competição, talvez não seja a competição mês que vem, no ano que vem, mas é a competição que é nosso mandato, no longo prazo. A gente precisa pensar no que vai acontecer em cinco, dez anos, acho até que vai ser mais rapidamente”, afirmou.
Em meio ao debate sobre os riscos ao sistema financeiro com o advento de novas tecnologias e aceleração do processo de digitalização, Mello pontuou ainda que o risco cibernético é o que lhe “tira o sono”, frisando que essa é sim uma preocupação do BC e que segue no radar da autoridade monetária.