Estado deve fornecer medicamento à base de canabidiol a paciente de SP
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que cabe ao Estado fornecer medicamentos que, mesmo sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), tenham sua importação autorizada pela instituição.
A determinação da Corte vale desde que comprovada a incapacidade econômica do paciente, a imprescindibilidade do tratamento e a impossibilidade de ele ser substituído por outro previsto pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Canabidiol
O entendimento foi firmado no julgamento do (RE) 1165959, com repercussão geral, na sessão virtual encerrada em 18/6.
O processo, de autoria do Estado de São Paulo, chegou ao Supremo após o Tribunal de Justiça estadual (TJ-SP) confirmar decisão de primeira instância e determinar o fornecimento de medicamento à base de canabidiol para um paciente menor de idade que sofre de encefalopatia crônica por citomegalovírus congênito e de epilepsia intratável, com quadro de crises graves e frequentes.
A decisão do TJ levou em consideração a hipossuficiência econômica do paciente e o fato de o medicamento, embora sem registro na Anvisa, ter autorização da autarquia para sua importação.
No caso, a Anvisa havia autorizado a importação do medicamento em caráter excepcional, para uso próprio de pessoa física, mediante prescrição de profissional legalmente habilitado.
Laudo médico juntado ao processo atesta, ainda, que o paciente já se submeteu a todos os medicamentos disponíveis no mercado nacional, sem conseguir controlar as crises epiléticas.
No STF, o Estado de São Paulo alegava que a falta de registro na Anvisa impediria a obrigatoriedade de fornecimento do produto.
O advogado do paciente, por sua vez, sustentou que o medicamento foi indicado por profissional de medicina como o único meio possível de tratamento e que, após o uso do canabidiol, ele passou de cerca de 80 convulsões diárias para quatro ou cinco.
Importação autorizada
O relator do processo, ministro Marco Aurélio, votou pelo desprovimento ao RE, por entender que é dever do Estado custear medicamento que, embora sem registro na Anvisa, tenha sua importação autorizada, individualmente.
No entanto, prevaleceu, no julgamento, o voto do ministro Alexandre de Moraes, que ampliou o rol de condições para o fornecimento.
De acordo com a tese aprovada pela maioria, caberá ao Estado fornecer o medicamento, em termos excepcionais, se, além da importação autorizada pela Anvisa, seja comprovada a incapacidade econômica do paciente, a imprescindibilidade clínica do tratamento e a impossibilidade de o tratamento ser substituído por outro similar constante das listas oficiais de dispensação de medicamentos e dos protocolos de intervenção terapêutica do SUS.
Votaram nesse sentido os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Luiz Fux e Roberto Barroso e as ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber.
O ministro Edson Fachin acompanhou integralmente o relator. Já o ministro Nunes Marques considerou que o caso tem peculiaridades que inviabilizam a fixação de postulado genérico e aberto.
Fins medicinais
Tanto o relator quanto o ministro Alexandre de Moraes frisaram que a importação do canabidiol é autorizada pela Anvisa e que a Resolução RDC 17/2015 fixa procedimento visando à autorização sanitária a empresas para fabricação e importação, além de requisitos ligados a comercialização, prescrição, dispensação, monitoramento e fiscalização com fins medicinais.
Portanto, o fato de o produto não constar das listas oficiais de dispensação e dos protocolos de intervenção terapêutica do SUS não impede que o poder público possa fornecê-los a quem não tem meios de financiar o tratamento da doença.
O ministro Alexandre de Moraes observou que, em julgamentos de outros recursos sobre matéria similar (Temas 500 e 6 da repercussão geral), o STF definiu as mesmas premissas para o fornecimento de fármaco não constante das listas do SUS, apesar das peculiaridades de cada caso.
Ele acrescentou, ainda, que a Constituição Federal (artigo 227) consagra a proteção à criança e ao adolescente como um dos valores fundamentais a ser concretizado com prioridade absoluta, cabendo ao Estado, à família e à sociedade assegurar-lhes, entre outros, o direito à saúde.
Tese
A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: “Cabe ao Estado fornecer, em termos excepcionais, medicamento que, embora não possua registro na Anvisa, tem a sua importação autorizada pela agência de vigilância sanitária, desde que comprovada a incapacidade econômica do paciente, a imprescindibilidade clínica do tratamento, e a impossibilidade de substituição por outro similar constante das listas oficiais de dispensação de medicamentos e os protocolos de intervenção terapêutica do SUS.”