Estabilidade e carreiras de Estado são tema de 25 emendas à reforma administrativa
A estabilidade de servidores públicos e a definição de carreiras típicas de Estado são o tema de 25 das 62 emendas apresentadas na Comissão Especial da Reforma Administrativa (PEC 32/20).
Os deputados também se preocupam com a jornada e remuneração de servidores (assunto tratado em 9 emendas), férias e licenças (8 emendas), aposentadoria e previdência (8), concurso ou seleção (8), vínculo de experiência (7), cargos comissionados ou de liderança e assessoramento (7).
Ainda há emendas sobre avaliação de desempenho, desligamento ou perda de cargo, cooperação com empresas privadas e acúmulo de cargos, entre outros temas.
Várias das emendas tratam de carreiras específicas, incluindo professores (8 emendas), profissionais de Segurança (8), da Justiça (5), da Saúde (4) e militares (4).
Atualmente, os servidores que passaram em concurso público ganham estabilidade depois de três anos de exercício do cargo.
Depois disso, eles só perdem a vaga se houver uma sentença judicial transitada em julgado, um processo administrativo ou pelo procedimento de avaliação periódica de desempenho.
No entanto, a proposta do Executivo limita a estabilidade apenas a carreiras típicas de Estado, que seriam definidas depois por lei complementar.
Impessoal
O relator da proposta de reforma administrativa, deputado Arthur Oliveira Maia (DEM-BA), avisou que a lei sobre estabilidade e demissão de servidores será impessoal.
“Não será dado a nenhum chefe de plantão o direito de demitir por seu gosto, por sua vontade exclusiva. Tem que ter a avaliação do usuário do serviço público, o que é fácil por meio da internet e da tecnologia”, propôs.
O relator lembrou que o Estado investe recursos para contratar um servidor por meio de concurso e deve recuperá-lo caso o desempenho não seja satisfatório.
“A avaliação deve ser muito mais no sentido de premiar o funcionário que tenha um bom desempenho do que punir o mau desempenho”, analisa.
Arthur Oliveira Maia ainda apontou para a necessidade de aprimorar os conceitos e critérios de avaliação dos funcionários públicos.
“Não é razoável que a gente veja índices de analfabetismo funcional nas escolas brasileiras. Mas quando você fala em avaliar o professor, parece que você está jogando pedra na cruz”, afirmou.
Preocupação
O deputado Rogério Correia (PT-MG) disse estar preocupado com a concepção do relator sobre o que seriam as carreiras de Estado. “Carreira exclusiva não tem nada a ver com estabilidade. Para o relator, professores e agentes de saúde não precisam de estabilidade. Isso me assusta.
Trocar um professor não vai resolver o problema”, criticou. “Assim, 80% dos servidores não vão ter estabilidade. Desmanchar a estabilidade terminaria com o serviço público, com a substituição pela iniciativa privada e precarização do trabalho.”
Rogério Correia ainda nota que, mesmo para as carreiras típicas de Estado, a demissão não será mais por decisão judicial transitada em julgado, mas por ordem judicial colegiada.
“Acaba com a presunção de inocência do servidor público”, lamentou. Ele ainda observa que, segundo o texto da PEC, a avaliação de desempenho poderia ser feita “na forma da lei”, e não por lei complementar.
“O governo poderia baixar uma medida provisória de demissão em massa, para fazer as contratações temporárias ou convênios com a iniciativa privada”, teme.
O deputado Tiago Mitraud (Novo-MG) nota que, desde o envio da PEC, a estabilidade tem sido o ponto mais discutido e polêmico. “Não podemos tratar a estabilidade como a bala de prata que vai resolver todos os problemas do serviço público no Brasil, mas cabe a nós aprimorar este instrumento” ponderou.
Tiago Mitraud considera que as previsões atuais para perda de cargo são insuficientes, especialmente porque a avaliação de desempenho não foi regulamentada.
Segundo ele, também seria necessário criar regras para extinguir cargos e carreiras que não são mais necessários porque se tornaram obsoletos.
“Temos de dar a capacidade de o Estado se reorganizar. Estabilidade não é um privilégio, mas um instrumento necessário para preservação do interesse público.
Infelizmente, o cargo público é almejado não pelo interesse público, mas porque a estabilidade dá a tranquilidade para não apresentar resultados.”
Pressões políticas
O deputado Luis Miranda (DEM-DF) defendeu a estabilidade como meio de proteger os servidores de pressões políticas. Ele afirmou que seu irmão, o servidor concursado do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, foi atacado e ameaçado por apresentar denúncias de irregularidade na compra da vacina indiana Covaxin. “Se não fosse a estabilidade, certamente teria sido demitido”, argumentou.
Luis Miranda ainda defendeu que os cargos de chefia fossem limitados a funcionários de carreira. “Quem tem poder, manda, desmanda, humilha e coloca em xeque a vida da pessoa e de seus familiares e filhos. Que servidor público, sabendo que poderia perder o emprego, vai cumprir com suas obrigações?”, questionou.
Argumentos
Além da proteção contra perseguições políticas, entre os principais argumentos a favor da estabilidade estão a continuidade para implementar políticas públicas, a atração de profissionais qualificados, a manutenção da memória da organização e a igualdade no tratamento entre servidores.
Já os críticos dizem que a estabilidade leva à perda de motivação dos servidores, impunidade para servidor com baixo desempenho, aumenta o poder burocrático, leva a tratamento desigual com trabalhadores do setor privado e aumenta o gasto público com a folha de pagamento.
Os custos com o funcionalismo estão entre os principais argumentos do governo contra a estabilidade. O secretário de Gestão e Desempenho de Pessoal do Ministério da Economia, Leonardo José Mattos Sultani, afirmou que apesar de 12,5% dos trabalhadores atuarem no setor público, esses servidores gastam 13,4% do PIB. “A estabilidade se equipara a um contrato vitalício”, comparou.
Quase 87% dos servidores são estáveis e a administração pública federal já dispõe de mais inativos do que ativos em seus quadros (52,9% são inativos). O secretário informou que o Brasil gasta R$ 8,2 bilhões por ano com 69 mil servidores ativos em cargos extintos.
Sultani lembrou que o Congresso deverá regulamentar as hipóteses de perda do cargo em lei complementar. “Impossível o desligamento do servidor por motivação político partidária. A lei vai eliminar as possibilidades de perseguição pessoal, pressões corporativas ou político partidárias”, disse.