Entrevista: “Montadoras ainda são ponto de interrogação”, afirma diretor financeiro da Movida
O primeiro trimestre de 2021 mostrou aquilo que muitos analistas afirmavam: as empresas de aluguéis de carros deixaram a pandemia para trás e agora se preparam para consolidar o seu crescimento.
Entre elas, a Movida (MOVI3), terceira maior do setor, se destaca. A companhia viu o seu lucro líquido saltar 98,7%, para R$ 109,5 milhões, ante mesmo período do ano passado. Além disso, terminou o período com uma boa posição de caixa de R$ 3 bilhões.
“Existem inúmeros fatores que mostram que a empresa está absolutamente pronta para retomada de um crescimento mais forte quando nós saímos dessa nova onda de pandemia”, afirma o diretor financeiro e de relações com investidores da Movida, Edmar Lopes, em conversa com o Money Times.
Apesar disso, a Covid prejudicou o outro lado do balcão, ou seja, as montadoras: falta de chips e de suprimentos deram um “nó” na cadeia produtiva de veículos no mundo inteiro. Também houve a paralisação da produção devido à alta de casos aqui no Brasil. Isso fez com que o setor diminuísse o ritmo de produção e a entrega de novos veículos.
“Eu digo que é um ponto de interrogação a questão das montadoras, que estão sofrendo bastante na sua cadeia de suprimentos e da necessidade delas fecharem durante a quarentena”, argumenta.
A menor entrega de carros, somado à questões de sazonalidades, fizeram com que as receitas de seminovos despencassem 51% por conta da redução de 62% no número de carros vendidos, para 5,3 mil, mas parcialmente compensado pelo aumento de 29% no preço médio dos veículos.
Mesmo assim, ele lembra que a empresa cumpriu com o projetado, acionando 13 mil carros novos em sua frota.
“Tínhamos uma expectativa já calibrada para um risco. Para o segundo trimestre, a nossa expectativa é receber mais carros. Quantos? Não sei, vai depender dos próximos meses”, observa.
Ações baratas?
Apesar do salto no lucro visto nos últimos meses, as ações da Movida acumulam tombo de cerca de 13% em 2021. Mas isso não foi suficiente para diminuir o otimismo dos analistas.
Segundo cálculos do BTG Pactual, a companhia está com desconto de 40% considerando o múltiplo de preço sobre o lucro (P/L) de suas rivais Unidas (LCAM3) e Localiza (RENT3).
“Conforme comprovado pela recuperação mais rápida do que o esperado, sua história de crescimento de longo prazo está bastante intacta, combinando expansão da frota e melhor execução para fechar o gap em relação a seus principais pares”, pontua a corretora.
Já a Ágora vê potencial de alta de 73%, com preço-alvo em R$ 30.
De acordo com Edmar, a queda tem muito mais haver com questões macroeconômicas, como a curva de juros futuro, que está em alta.
“Para o nosso negócio, é importante a curva de juros, porque nós somos um setor intensivo em capital. Além disso, há a incerteza do Brasil e a própria incerteza de fornecimento de carros. Se eu recebo menos carros, também cresço menos. Não é nada fora da curva que nesse momento tenha alguma cautela em relação a nossa expansão”, explica.
Concorrência boa
De olho no crescimento do mercado de aluguel de carros, as montadoras também se interessam em ter locadoras para chamar de suas. No começo do ano, a Renault anunciou o Renault On Demand, o plano de assinatura de veículos da fabricante francesa. Outras marcas como Toyota, Volkswagen e Fiat também já embarcaram na onda.
Edmar vê o movimento com ceticismo. Para ele, o mercado exige escala e portfólio variado, algo que as montadoras podem ter dificuldades em oferecer.
“Tem dois anos que a Toyota anunciou que entraria nesse negócio de aluguel de carro e não virou nada grande. Porque precisa tomar conta do cliente, ter capilaridade e um portfólio. Eu acho difícil as montadoras colocarem muito dinheiro nesse negócio”, fala.
Mesmo assim, o executivo analisa com bons olhos a movimentação.
“Temos uma visão positiva em relação à concorrência, obriga todo mundo a ser mais eficiente. O conjunto delas pode ser relevante, mas o mercado é muito grande. Tem oportunidade para todo mundo. (O movimento) chama atenção do produto e mostra a competição”, aponta.
Sobre a fusão das concorrentes Unidas e Localiza, que criará uma gigante com 70% do mercado, Edmar se limitou a dizer que a empresa mudou de ideia em relação ao negócio. Em março, a companhia pediu ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) que reprove a fusão.
Futuro do carro
O segmento de aluguel de automóveis veio para ficar? Na opinião dele, a pandemia fortaleceu o carro, mais seguro ao vírus em relação a outros meios de transportes, como ônibus e aviões.
“Eu digo que o carro saiu da pandemia mais forte do que entrou. Todas essas novas demandas assistimos consistentemente há 9 meses, 6 meses”, afirma, citando o aluguel por assinatura, que se consolidou nos últimos anos com os novos hábitos do consumidor.
Para o pós-pandemia, a empresa espera que outras demandas voltem a crescer.
“Tem o passageiro do aeroporto, que era 25% da nossa demanda e que praticamente desapareceu. Eu tenho uma porção de demandas que simplesmente deixaram de existir e isso vai voltar”, completa.