Money Times Entrevista

Entrevista: “Estrangeiro volta, se mercado viver um novo estresse”, diz estrategista da Franklin Templeton

15 abr 2021, 17:13 - atualizado em 15 abr 2021, 21:05
Renato Pascon, estrategista de multimercados e renda fixada Franklin Templeton no Brasil
Aos negócios: “investidores estrangeiros são pragmáticos”, afirma Pascon (Imagem: Divulgação/ Franklin Templeton)

Nos últimos meses, a revoada de investidores estrangeiros é sentida por toda parte – desde a pressão do câmbio até os resultados anêmicos dos IPOs de empresas brasileiras. O movimento não tem nada de ideológico ou político – são apenas negócios.

“Os estrangeiros saíram do Brasil por questões muito pragmáticas”, afirma Renato Pascon, estrategista-chefe de renda fixa e multimercados da operação local da Franklin Templeton, uma das maiores gestoras do mundo, com patrimônio de US$ 1,5 trilhão.

“Historicamente, a diferença entre as taxas de juros daqui e do exterior era muito alta. Então, o BC baixou os juros para 2%, e os estrangeiros concluíram que não valia a pena investir aqui por uma diferença de dois pontos”, explica.

Mas é este mesmo pragmatismo que pode trazê-los de volta, segundo Pascon. Tudo é uma questão preço. Caso o mercado brasileiro enfrente um novo estresse e o valor dos ativos caia, os investidores internacionais enxergarão uma janela de entrada no país.

Mas o gestor adverte que isso só ocorrerá, se os estrangeiros tiverem certeza de que o Brasil está agindo, concretamente, para conter a dívida pública, reduzir o déficit fiscal e sinalizar com algum superávit no futuro. “Vejo uma tolerância ao risco muito grande nesse momento em todo o mundo, mas os investidores podem perder a paciência com o Brasil”, alerta Pascon.

Por aqui, a Franklin Templeton gere um patrimônio de R$ 8 bilhões, quando se consideram apenas os escritórios de São Paulo e Rio de Janeiro. A cifra sobe para quase R$ 50 bilhões, quando são contados os ativos sob gestão da Western Asset, que passou para o controle da gestora, quando a controladora da asset, a Legg Mason, foi comprada em fevereiro do ano passado.

Veja os principais trechos da entrevista de Pascon ao Money Times.

Money Times – Como o Brasil é visto pelos investidores estrangeiros atualmente?
Renato Pascon – O investidor internacional é muito pragmático. Se os preços dos ativos brasileiros estiverem muito estressados, ele vai analisar se vale a pena. Vai conversar com gestores locais para entender se esse estresse é causado por um problema pontual ou maior.

A princípio, não vejo uma saída definitiva dos investidores estrangeiros. Se o mercado se estressar novamente, vejo o estrangeiro potencialmente entrando no Brasil. É claro que, para isso, os investidores precisam ver sinais concretos de que a situação vai melhorar.

MT – E o cenário está melhor?
Pascon – Vemos o cenário atual com bastante cautela, devido ao problema fiscal. Eu costumo dizer que tudo o que o Brasil economizaria nos próximos dez anos, com a reforma da Previdência, foi gasto em apenas um ano – 2020. O fato é que a dívida pública saiu de 60% do PIB para cerca de 90%.

O mercado ficou à espera de medidas para resolver o problema, que passassem pela contenção de gastos e pela busca de um déficit fiscal crível, que apontasse para um superávit no futuro. Mas não é o que se vê. Há gestores que afirmam que podemos chegar a um ponto em que elevar os juros fará a dívida explodir e nos tornaremos insolventes. Não acho que chegaremos a tanto, mas é um aviso importante do mercado.

MT –De um lado, há o crescimento da dívida pública. De outro, a pressão para gastos com assistência social devido à pandemia. O mercado ainda acredita numa solução?
Pascon – O que o mercado espera é ver a luz no fim do túnel, e não estamos vendo. Não vemos uma discussão sobre as saídas para a crise fiscal que passem pelos três pontos que todos conhecem: reforma administrativa, redução do déficit fiscal e privatizações. O que precisamos, agora, é de notícias críveis, concretas, e não apenas discursos e intenções. O mercado está cético.

MT –Há, também, muita preocupação sobre o impacto do aumento dos juros, pelo Banco Central, no tamanho da dívida. Mas, se o BC não fizer isso para conter a inflação, perderá credibilidade. Quanto isso preocupa os investidores?
Pascon – Acho que precisa acontecer algo positivo e bem rápido. O atual nível da dívida não está insustentável, mas corre o risco de ficar. É verdade que o BC não tem mandato para cuidar da dívida pública, mas ela é um elemento considerado em suas decisões. Obviamente, quando a dívida cresce, aumenta o prêmio de risco exigido pelo mercado, e o BC precisa elevar os juros em resposta.

Isso pode acarretar duas coisas. A primeira é uma piora ainda maior da precificação dos ativos brasileiros. A outra, que já vem acontecendo, é o mercado aceitar que o nível de endividamento será maior. Isso é um fenômeno global. Todos os países estão mais endividados, por causa da pandemia.

É claro que os investidores olham países como EUA e Japão de modo diferente de como olham o Brasil. Até agora, houve uma certa tolerância com o Brasil, mas ela pode acabar.

Plugada no mundo: Franklin Templeton gerencia US$ 1,5 trilhão (Imagem: Divulgação/ Franklin Templeton)

MT – O novo ciclo de alta da Selic, ao pesar sobre a dívida pública, pode espantar ainda mais os estrangeiros do Brasil?
Pascon – Vejo uma tolerância a risco muito grande dos estrangeiros nesse momento. Aliás, eles saíram do Brasil por questões muito pragmáticas. Historicamente, a diferença entre as taxas de juros daqui e do exterior era muito alta.

Então, o BC baixou a Selic para 2%, e os estrangeiros concluíram que não valia a pena investir aqui por uma diferença de dois pontos. O real se valoriza e se desvaloriza também por motivos práticos, por causa dessa diferença entre os juros daqui e de lá.

MT – Um eventual ciclo de alta dos juros nos EUA fará os estrangeiros perderem o interesse pelo Brasil?
Pascon – Vejo uma chance baixa de o Fed elevar os juros no curto prazo. Ele tem feito comunicados enfáticos, dizendo que está disposto a tolerar uma inflação alta e pontual em troca de crescimento econômico. Pode ser que surpreenda o mercado e eleve os juros em breve, mas eu vou dar o benefício da dúvida ao Fed. Agora, é claro que, se eles subirem os juros e a gente não, nossa situação piora.

MT – O que o investidor pessoa física, aqui no Brasil, deve fazer neste momento?
Pascon – Sobretudo, é hora de ser cauteloso. Em momentos de baixa visibilidade, é preciso manter o nível de risco baixo. Não quer dizer para deixar tudo na poupança, mas, para quem tem um perfil mais agressivo, talvez seja sensato reduzir a exposição ao risco em relação ao que está acostumado.

Falando de ativos específicos, gosto muito das NTN-Bs de curto prazo. E recomendo com muita ênfase as que vencem em 2023 e 2024, porque é onde me parece que estão os principais exageros da curva. A curva está precificando juros de 10% e acho que não vai acontecer isso. E há a vantagem de, por serem uma NTN-B, também protegem da inflação.

Em relação a moedas, só vejo uma desvalorização mais forte do real, se houver uma piora expressiva do cenário. Eu não ficaria comprado em dólar no nível atual. Por outro lado, para ficar vendido em dólar agora, é preciso ter muita coragem.