Agronegócio

Entre os constrangimentos temidos por Bolsonaro sobre a reunião, China pode passar a conta

23 maio 2020, 12:10 - atualizado em 23 maio 2020, 15:24
Paulo Guedes
O ministro Paulo Guedes pode ter exacerbado as relações conflituosas com a China (Imagem: REUTERS/Adriano Machado)

Se o presidente Jair Bolsonaro não pensou na China ao se posicionar contra a divulgação do vídeo da reunião ministerial por achar que geraria “constrangimento”, deverá começar a pensar, segundo fontes do agronegócio ouvidas por Money Times.

O ministro Paulo Guedes, dono dos sarcasmos endereçados ao país – (a China é) “aquele cara que você sabe que você tem que aguentar” -, pode ter acrescentado mais munição para Pequim apresentar a conta quando o mundo voltar ao normal e, principalmente, se o acordo comercial tecido com os Estados Unidos estiver efetivado.

Das quatro pessoas ouvidas, dois são empresários e dois são líderes de classe, todos com peso no agronegócio. Um goza de bom trânsito em gabinetes do governo, como na Agricultura (Mapa), e outro esteve, inclusive, na comitiva da ministra Tereza Cristina em seu giro pela Ásia, em 2019. Aceitaram opinar sob off, diante do delicado quadro político, e temerosos também por retaliações.

“A reunião mostrou um presidente raivoso, disposto a tudo, então o momento é para tomar todo cuidado”, disse um presidente de entidade, cujo setor (também pediu para não ser mencionado) aguarda a canetada presidencial sobre ajuda pleiteada contra a crise.

Dos trechos da fala do ministro da Economia, o mais sensível, na opinião de todos, é quando ele praticamente imputa culpa à China pelo novo coronavírus, fazendo coro aos Estados Unidos, e, no Brasil, ao que já disse o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o ministro da Educação Abraham Weintraub.

Em alto e bom som, Guedes defendeu que a China banque um novo Plano Marshall para o mundo em recessão. Todos entenderam, obviamente, que a responsabilização atribuída aos chineses (criação em laboratório e negligência em contê-lo) os torna obrigados a irrigar a reconstrução global.

Os brios chineses estão à flor da pele com esse tema e já foi alvo de respostas da embaixada em Brasília. Outras declarações ditas na reunião sobre a dependência chinesa do agronegócio brasileiro – “aquilo é comida nossa” e “eles precisam comer” -, causam embaraço, mas não entram na conta agora.

China Carnes
Se a China conseguir diminuir a participação brasileira no seu mercado, o que só pode ser via os Estados Unidos, talvez o ministro Paulo Guedes tenha que rever suas contas (Imagem: REUTERS/Fang Nanlin)

Para uma das fontes ouvidas, o pragmatismo chinês impede uma retaliação contundente em curto prazo. De fato, a China precisa da soja e carnes brasileiras, enquanto as rusgas com os Estados Unidos atrapalham a entrada plena do acordo comercial. “Mas o equilíbrio é frágil, não interessa a nenhuma das duas potências perpetuarem as disputas (inclusive as geopolíticas) e deverá haver alguma convergência mais dia menos dia”, acrescenta.

Esse é o risco.

A Austrália já está sentindo o peso da mão de Pequim que cortou importações de carne do país também pelas críticas do governo alinhadas da Donald Trump. Mas a ilha da Oceania não tem o peso do Brasil, lembra outro interlocutor.

Se a China conseguir diminuir a participação brasileira no seu mercado, o que só pode ser via os Estados Unidos, talvez o ministro Paulo Guedes tenha que rever suas contas se os chineses se lembrarem – e não gostarem – do que ele disse: “pra cada dólar que o Brasil exporta pros Estados Unidos, exporta três para a China”.

Money Times, inclusive, já abordou diretamente esta preocupação em outras edições, como em 22 de abril, justamente no dia em que se desenrolou a reunião ministerial que o ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro, arrola como prova da tentativa de interferência do presidente na Polícia Federal.

Com todos os constrangimentos que se tornaram públicos nesta sexta.

Compartilhar

TwitterWhatsAppLinkedinFacebookTelegram
Giro da Semana

Receba as principais notícias e recomendações de investimento diretamente no seu e-mail. Tudo 100% gratuito. Inscreva-se no botão abaixo:

*Ao clicar no botão você autoriza o Money Times a utilizar os dados fornecidos para encaminhar conteúdos informativos e publicitários.

Usamos cookies para guardar estatísticas de visitas, personalizar anúncios e melhorar sua experiência de navegação. Ao continuar, você concorda com nossas políticas de cookies.

Fechar