Opinião

Entenda como tomamos nossas decisões: Sistema 1 e Sistema 2

19 abr 2020, 12:18 - atualizado em 17 abr 2020, 15:24
dúvida futuro porta incerteza
Existe uma série de atalhos mentais que tomamos para minimizar esforços, o que pode não ser racional (do ponto de vista econômico) (Imagem: Pixabay/qimono)

Você já parou para pensar em como a nossa cabeça funciona na hora de tomar uma decisão? Existe uma série de atalhos mentais que tomamos para minimizar esforços, o que pode não ser racional (do ponto de vista econômico). No texto de hoje, vamos falar Ciências Comportamentais. E, de que forma o nosso processo cognitivo pode ser afetado por fatores externos.

Responda a seguinte pergunta:

Um taco de beisebol e uma bola juntos custam R$1,10
O taco custa 1 real a mais do que a bola
Quanto custa a bola?

Se você utilizou a intuição para responder o problema, é bem provável que tenha chegado ao resultado de 10 centavos. Essa é a solução que o nosso sistema automático conclui de forma rápida. Porém, se analisar com um pouco mais de atenção a pergunta, verá que a solução correta da questão é 5 centavos.

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Sistema 1 X Sistema 2

Daniel Kahneman em seu livro “Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar” propõe dois modelos diferentes de pensamento. Assim, demostra como nós tomamos nossas decisões. O sistema 1 que é automático, rápido e inconsciente e o sistema 2 que é lento, deliberativo e lógico.

No sistema 1 o conhecimento é armazenado na memória e o utilizamos para atividades comuns do nosso dia a dia. Como fazer contas simples, por exemplo, ou dirigir por um caminho da nossa rotina.

São ações que não requerem muito esforço mental e algumas vezes podem até ser involuntárias.

Em segundo lugar, existe o sistema 2 que requer mais cuidado e atenção. Na mesma linha, resolver uma equação matemática  ou preencher uma ficha é uma atividade cerebral mais complexa. Como resultado, você precisa estar bastante concentrado e atento para examinar com cuidado a situação e as alternativas disponíveis.

Exemplificando

Voltando ao problema inicial, o que pode ter levado você a concluir que o preço da bola era 10 centavos foi justamente o uso do sistema 1 em um problema no qual era necessário um pouco mais de raciocínio lógico, ou seja, era necessário a utilização do sistema 2 nessa questão.

Caso ainda não tenha ficado claro para você, vamos fazer um conta bem rápida para ajudá-lo a entender melhor: chamamos o taco de t e a bola de b. Assim, segundo as informações do problema temos que t+b = 1,10, como o taco custa 1 real a mais que a bola, logo t = b+1.

Substituindo na equação, temos que b+1+b=1,10. Arrumando as variáveis, logo, chegamos a conclusão que b=0,05 e t=1,05.

Em suma, a divisão do trabalho entre esses dois sistemas otimiza o nosso desempenho pois minimiza esforços, só que conflitos podem ser criados quando um toma o papel no outro. Em outras palavras, quando utilizamos o sistema 1 para solucionarmos problemas que requerem mais atenção. Tal conflito pode recair em erros intuitivos do nosso julgamento.

Ancoragem

Agora imagine que você vá até uma loja de eletrônicos, pois precisa comprar uma televisão para assistir aos jogos da Copa do Mundo. Se você for como eu, não entende absolutamente nada sobre esse tipo de produto: qual seu custo de produção, a tecnologia envolvida, quanto tempo levou para ser feito o aparelho, quantos profissionais estavam envolvidos em toda cadeia de produção… São diversas as informações que nem de longe eu consigo fazer uma estimativa sobre esses valores.

Porém, logo na entrada da loja você encontra um modelo de uma boa marca de tv e a imagem parece ser de bastante qualidade também. Esse modelo de televisão custa R$2.500, logo o vendedor se aproxima de você e diz que hoje por conta de uma ação que a loja está fazendo pela Copa do Mundo, o aparelho está custando R$2.000, um incrível desconto de R$500.

Parece um bom negócio, não é mesmo? Mas será que R$2.000 para uma televisão é um preço justo?

O fato é que eu e talvez você também, nunca vamos saber ao certo sobre isso, nós não possuímos conhecimento específico suficiente para avaliar esse tipo de situação. O que temos de referência, nesse exemplo, é o primeiro preço, o valor de R$2.500 e é exatamente essa informação que irá influenciar na nossa decisão de acreditar que pagar R$2.000 por uma televisão é um bom negócio.

O Efeito Ancoragem é um viés cognitivo que descreve a tendência humana de confiar logo na primeira informação recebida (que será a âncora) na tomada de decisões para fazer julgamentos posteriores (Imagem: Freepik/rawpixel.com)

Como nosso cérebro atua na ancoragem?

Nessa situação fica bem claro identificar como o nosso sistema 1 busca respostas que custam menos energia, como nós não temos como aferir quanto deve de fato custar uma televisão e provavelmente estamos muito pouco interessados em utilizar nosso sistema 2 para descobrir maiores detalhes sobre o assunto, criamos uma resposta automática para o problema, nós ancoramos o nosso referencial no primeiro valor.

O Efeito Ancoragem é um viés cognitivo que descreve a tendência humana de confiar logo na primeira informação recebida (que será a âncora) na tomada de decisões para fazer julgamentos posteriores.

Uma vez que uma âncora for estabelecida outras ponderações serão feitas através de ajustes da distância a esse referencial. Por exemplo, se eu perguntar a você se o número de habitantes da Finlândia é maior ou menor do que 50 milhões, o que você responderia?

E na sua opinião, sem consultar nenhuma fonte de pesquisa, quantas pessoas você acredita que vivem na Finlândia? Provavelmente a sua resposta seria algo em torno do valor de 50 milhões. Acontece que a Finlândia possui somente cerca de 5 milhões de habitantes, um número bem abaixo da âncora que criei.

Efeito Priming

O sistema 1 também está relacionado com a ideia de Efeito Priming. Assistir um vídeo motivacional, por exemplo, pode nos despertar uma série de comportamentos positivos. A ideia aqui é avaliar como a exposição de um indivíduo a um estímulo pode afetar, inconsequentemente, o seu julgamento.

A gente muitas vezes pode não se dar conta desse efeito, mas somos terrivelmente impactados por tudo que está ao nosso redor. Muitas empresas se utilizam dessa linguagem para impactar os seus negócios, seja através de comerciais que estimulam os consumidores a adquirirem certos produtos ou criando um ambiente de vendas estratégico. É comum no mercado financeiro também encontrarmos o uso desse tipo de ferramenta.

Muitas companhias podem criar uma ideia positiva de seus negócios através de marketing, o que de forma alguma é errado, mas isso pode fazer com que o investidor creia que as ações daquela empresa também estão em uma boa situação e logo optar por comprá-las sem ao menos avaliar o cenário real. Geralmente empresas que estão muito na mídia, são bastante procuradas por investidores iniciantes, mas não necessariamente são as escolhas mais adequadas para aquelas pessoas.