Setor Elétrico

Empréstimo de R$ 16 bilhões não cobre todo impacto da Covid em elétricas, diz associação

30 jun 2020, 20:33 - atualizado em 30 jun 2020, 20:33
Copel Setor Elétrico
Outros impactos esperados no médio prazo são o aumento das perdas com ligações irregulares, os chamados “gatos”, ou perdas não-técnicas, no jargão setorial (Imagem: Reuters/Kai Pfaffenbach)

Um empréstimo de 16 bilhões de reais arquitetado pelo governo para apoiar distribuidoras de energia devido aos impactos do coronavírus sobre o setor não é suficiente para compensar todas as perdas das empresas com a pandemia, defendeu nesta terça-feira o presidente de uma associação da indústria.

A operação para fornecer liquidez às elétricas, que foi chamada de Conta-Covid pelo governo e envolve um grupo de bancos liderado pelo BNDES, resolve problemas financeiros imediatos das concessionárias, mas a crise gerada pelo vírus afetará o setor por período maior, disse o chefe da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Marcos Madureira.

Segundo ele, o menor consumo causado pela pandemia, em meio a medidas de isolamento para conter o vírus e à esperada crise econômica subsequente, impactará negativamente a parte da receita do setor de distribuição que de fato fica com as concessionárias, a chamada “parcela B”.

“Isso faz com que tenha uma redução do Ebitda das empresas, porque elas vão ter um faturamento menor ao que era previsto para o mesmo serviço, os custos não são reduzidos”, afirmou Madureira à Reuters, em referência ao lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização.

Outros impactos esperados no médio prazo são o aumento das perdas com ligações irregulares, os chamados “gatos”, ou perdas não-técnicas, no jargão setorial, e uma inadimplência que não deve ser totalmente resolvida mesmo após a pandemia, disse ele.

“As perdas não-técnicas, mesmo que não subam de forma absoluta, elas sobem porque o cálculo é em função do percentual do mercado. E também tem a questão da inadimplência residual, que não vai voltar.”

Essas projeções levaram as distribuidoras a pedir à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) análise sobre o chamado equilíbrio econômico-financeiro de suas concessões, que pode dar a elas direito a aumento de tarifas se houver entendimento do regulador de que suas operações foram estruturalmente afetadas.

As elétricas pleitearam também autorização para registrar previamente em seus balanços ativos regulatórios que sinalizassem o direito futuro a esse reequilíbrio, mas a Aneel rejeitou a proposta após um aceno inicial favorável.

“Isso não foi atendido… já vamos encerrar o segundo trimestre sem ter uma solução para isso, então os balanços das empresas vão ser agravados por essa redução de Ebitda. Se não houver uma solução ágil, isso vai continuar ao decorrer do ano, e isso traz problemas para as empresas”, apontou Madureira.

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A agência abrirá uma consulta pública em 60 dias para discutir como medir impactos econômicos de médio prazo do vírus (Imagem: REUTERS/Paulo Whitaker)

Discussão complexa

Em reunião na semana passada, diretores da Aneel apontaram que permitir às distribuidoras o registro de ativos antes de uma avaliação detalhada sobre os impactos da pandemia poderia gerar incertezas indesejáveis, o que levou à rejeição do pedido.

Mas a agência abrirá uma consulta pública em 60 dias para discutir como medir impactos econômicos de médio prazo do vírus.

O sócio especialista em energia do Pinheiro Neto Advogados, José Roberto Oliva, disse que essa discussão pode em tese levar a uma revisão extraordinária de tarifas para compensar os impactos apurados sobre as distribuidoras..

“O que deveria entrar nesse pleito seriam impactos causados pela pandemia que não foram cobertos pelo financiamento (Conta-Covid). E o que a agência precisa avaliar é o nexo causal entre a pandemia e esses itens”, explicou.

Ele frisou, no entanto, que o direito ao equilíbrio econômico-financeiro já é garantido nos contratos de concessão.

Entre especialistas, porém, há dúvidas sobre se as distribuidoras conseguirão convencer a agência a aprovar aumentos adicionais após a Conta-Covid –a amortização do empréstimo para apoio às empresas já será repassada aos consumidores nas tarifas ao longo de cinco anos.

“O setor parece ter uma visão de que o equilíbrio econômico-financeiro é uma imunidade”, comentou a pesquisadora da Fundação Getulio Vargas Joisa Dutra, ex-diretora da Aneel.

“O setor elétrico não está mostrando que vai ter uma perda muito maior que a economia em geral, e a perda de receita que as empresas estão experimentando tem uma parte que será revertida.”

O consultor Edvaldo Santana, também ex-diretor da Aneel, disse que a agência precisará fazer cálculos detalhados, mas avaliou que o processo pode não resultar em aumento nas tarifas.

“Eu acho dificílimo. Não sei, tirando o que o consumidor já vai pagar pela Conta-Covid, o que poderia ser justificado como um desequilíbrio por causa da pandemia. Esse ponto específico é muito difícil de comprovar”, explicou.

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