Mercados

Emergentes podem estar a caminho de nova fase de crise fiscal

04 ago 2020, 14:33 - atualizado em 04 ago 2020, 14:33
Morgan Stanley
Em um momento, “os mercados vão virar e, então, olhar para a relação dívida/PIB e dizer: ‘o que vocês vão fazer sobre isso?”, disse Eric Baurmeister, responsável por dívida de mercados emergentes do Morgan Stanley (Imagem: REUTERS/Mike Blake)

O estímulo monetário e fiscal que salvou os preços de ativos de mercados emergentes neste ano pode ter alinhado muitos países para uma nova fase da crise de Covid-19: uma desordem fiscal da qual não há saída fácil.

Bancos centrais cortaram juros e governos aumentaram gastos em meio à explosão de casos de coronavírus e paralisações que reduziram investimentos e a demanda de consumidores.

Embora as medidas tenham recuperado o apetite por risco, os pacotes podem ter deixado autoridades monetárias e governos encurralados.

Em um momento, “os mercados vão virar e, então, olhar para a relação dívida/PIB e dizer: ‘o que vocês vão fazer sobre isso?”, disse Eric Baurmeister, responsável por dívida de mercados emergentes do Morgan Stanley Investment Management, em Nova York. “’Agora, que passamos pelo pior, como vão pagar isso de volta?’”

Com pouco espaço para mais estímulo monetário, países em desenvolvimento podem enfrentar o dilema de precisar gastar mais para retomar o crescimento, mas com falta de recursos para fazer isso sem aprofundar ainda mais a dívida.

Talvez as taxas de juros até precisem subir para defender as moedas nacionais em meio à queda da confiança, minando a atividade econômica e reduzindo os preços dos ativos. Ao mesmo tempo, os crescentes problemas econômicos poderiam provocar tensões políticas.

A dívida global subiu para US$ 258 trilhões no primeiro trimestre, ou um recorde de 331% do PIB global, segundo o Instituto de Finanças Internacionais.

Em mercados emergentes, os índices de dívida aumentaram para o recorde de 230% do PIB. Cerca de US$ 3,7 trilhões em dívidas de mercados emergentes vencem até o fim de 2020, e dívidas em moeda estrangeira representam quase 17% do total, disseram economistas do IFI, Emre Tiftik e Khadija Mahmood em relatório.

O Brasil registrou o pior déficit primário em junho e o endividamento deverá atingir 98% do PIB até o fim do ano, segundo o Ministério da Economia, em relação a 76% no ano passado. O governo da Colômbia prevê que a dívida do país aumentará para 65%-66% do PIB em relação a 50% no mesmo período.

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“Cenário da Turquia”

Os programas de gastos temporários dos governos podem se tornar permanentes, e as autoridades de política monetária se apoiariam em uma política monetária frouxa para financiar déficits fiscais, de acordo com David Hauner, estrategista do Bank of America, em Londres.

Um “cenário da Turquia”, no qual a política monetária frouxa impulsiona tanto o crescimento quanto a inflação, pesando sobre a moeda, pode se tornar um risco maior em outros países emergentes, especialmente se suas reservas diminuírem e os níveis de dívida aumentarem, disse Hauner.

“Os problemas fiscais variados são anteriores à Covid, e o mundo pós-Covid provavelmente será desafiador no lado fiscal com demandas políticas por mais proteção social e gastos com saúde”, escreveu em relatório.

No entanto, cortar gastos ou aumentar impostos corporativos traz seus próprios riscos. Tais medidas pesariam sobre o crescimento, disse Pedro Martins Junior, estrategista-chefe de renda variável para a América Latina do JPMorgan Chase. Embora isso possa não se concretizar até 2021, pode afetar os lucros corporativos, escreveu.