Política

Em visita a Brasília, Lula amplia conversas, avança em base de Bolsonaro e mira 2022

07 maio 2021, 13:25 - atualizado em 07 maio 2021, 13:27
Lula
Derrotar Bolsonaro não é um projeto da esquerda, é um projeto civilizatório (Imagem: REUTERS/Amanda Perobelli)

Nos quatro dias em que passou em Brasília nesta semana –sua primeira viagem depois ter suas condenações derrubadas pelo Supremo Tribunal Federal— o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva mostrou que está de volta às articulações políticas para organizar uma frente contra Jair Bolsonaro em 2022, começando pela base eleitoral do presidente: o Rio de Janeiro.

Passaram pelo hotel onde o ex-presidente montou sua base, na capital federal, políticos de diversas matizes.

Desde o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ), possível candidato da frente anti-Bolsonaro ao governo do Rio, ao deputado federal Rodrigo Maia, do Rio de Janeiro, ainda no DEM e um ativo opositor aos governos petistas.

Fontes ouvidas pela Reuters contaram que vacinas, um auxílio emergencial de 600 reais e a frente ampla foram os principais assuntos tratados por Lula nas várias conversas em Brasília.

Apesar das discussões sobre conjuntura nacional e eleições presidenciais de 2022 estarem na mesa, Lula não tem pressa.

Está começando por tentar acertar palanques regionais que podem servir de base para a eleição nacional.

O laboratório de acordos começa com o Rio de Janeiro. Lula já conseguiu atrair para a conversa não apenas Freixo, que, por enquanto, é o principal nome para a candidatura a governador, mas o deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ) e até Maia.

O ex-presidente da Câmara está de saída do DEM e deve acertar sua entrada no PSD, de Gilberto Kassab, junto com o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, assim que abrir a janela partidária.

Nesta sexta-feira, segundo Maia, os dois irão se reunir para acertar essa mudança.

A saída de Maia do DEM, tradicional opositor do PT, abre caminho para o deputado apoiar a frente que está sendo articulada.

De acordo com uma das fontes ouvidas pela Reuters, Maia aceitou participar, em uma conversa com o ex-presidente na quarta-feira que durou mais de duas horas.

“Se falou muito da situação política no Estado. A ideia central, que Maia concorda, é que uma frente no Rio, berço do bolsonarismo, pode ser o gérmen de uma frente nacional”, contou uma das fontes.

Freixo, primeiro a conversar com Lula nessa passagem do ex-presidente por Brasília, confirmou que o Rio de Janeiro está no centro das conversas.

“O Rio de Janeiro está entregue na mão do crime. Isso é uma ameaça à democracia. Independentemente do que vai acontecer em 2022, meu desejo é que a gente possa fazer uma frente ampla para derrotar Bolsonaro no Rio de Janeiro e no Brasil”, disse Freixo. “Derrotar Bolsonaro não é um projeto da esquerda, é um projeto civilizatório. Tem que ser responsabilidade de todo campo democrático.”

Se no Rio uma frente parece palpável, Lula ainda tem dificuldades de concretizar o mesmo em São Paulo, mas visualiza um grupo que possa derrotar Bolsonaro –que tem falado em lançar o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, para governador– e o atual governador, João Doria (PSDB), ou um candidato apoiado por ele.

A ideia do ex-presidente é lançar Fernando Haddad à frente dessa aliança –o ex-prefeito de São Paulo, de acordo com interlocutores, é simpático à ideia, desde que seja de fato uma frente forte.

A ideia, no entanto, ainda esbarra em projetos pessoais, como a vontade de o ex-governador Marcio França (PSB) de ser candidato, o sucesso de Guilherme Boulos (PSOL), que chegou ao segundo turno na última eleição para prefeito na capital paulista, e o fato de o PSDB comandar o Estado há mais de 25 anos.

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PRESIDENTE

Com quem conversa, Lula não se apresenta como candidato natural à Presidência. No entanto, pesquisas que o colocam como único nome vencendo Bolsonaro reforçam a ideia no PT e entre aliados de que sua candidatura é inevitável.

Presidente do PT, a deputada Gleisi Hoffmann (PR) disse que o partido ainda não discute a situação nacional.

“O PT ainda não definiu sua estratégia político-eleitoral e o próprio presidente não definiu se vai ser candidato. Não é o momento de se discutir candidaturas agora”, disse Gleisi.

Com alguns interlocutores, Lula admite sim sua candidatura, mesmo deixando claro que, se for necessário e viável, pode abrir mão –desde que aparece outro nome capaz de derrotar Bolsonaro.

Aos poucos, o ex-presidente volta a se apresentar como o político capaz de atrair nomes de diferentes partidos no seu entorno.

Gilberto Kassab foi um dos nomes do centro que passou pelo hotel de Lula, em uma conversa de mais de uma hora.

Seu partido em tese estaria em uma base informal do governo Bolsonaro, e tem um de seus membros –o ministro das Comunicações, Fábio Faria— como um dos mais ardorosos defensores do presidente.

Ainda assim, Kassab tem se afastado do governo, alegando a independência do PSD, e chegou a prever que Bolsonaro pode ficar fora do segundo turno das eleições de 2022.

Lula conversou ainda com senadores como Otto Alencar (PSD-BA), Kátia Abreu (PP-TO), Fabiano Contarato (Rede-ES), Weverton Rocha (PDT-MA).

No MDB, que hoje também tenta se manter independente do governo, Lula visitou Jader Barbalho (MDB-PA) e o ex-presidente José Sarney e recebeu o ex-senador Eunício Oliveira.

A ideia inicial era encontrar também Renan Calheiros (MDB-AL), mas com o senador relatando a CPI da Covid, a avaliação era que esse não era o melhor momento.

O PT já detectou, de acordo com uma das fontes ouvidas pela Reuters, uma divisão entre Norte e Sul do país nos partidos de centro.

Enquanto muitos líderes do Nordeste e parte do Norte se inclinam para Lula –que é muito forte na região–, no Sul e Centro-Oeste nomes dos mesmos partidos ainda seguem fiéis a Bolsonaro.

Uma divisão que reflete os níveis de aprovação do presidente que, mesmo em queda, ainda são maiores no Sul.

De acordo com uma das fontes ouvidas pela Reuters, muito próxima ao presidente, Lula está aberto a conversar com líderes do centrão que não foram ativos defensores do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff em 2016. Renan e Jader estão entre eles.

Lula foi aconselhado, também, a procurar o presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI).

Mas, hoje um dos principais aliados de Bolsonaro, líder da tropa de choque governista na CPI da Covid e bastante ativo no impeachment de Dilma, Ciro foi inscrito no caderno de rancores do ex-presidente.

Perguntado se Lula recusaria apoio do PP então, uma fonte respondeu: “Apoio não se nega. Desde que não se precise dar nada em troca.”