Eletrobras (ELET6) entrega “balanço de transição”; ação não está precificada como deveria, dizem analistas
Especialistas do mercado não gostaram de alguns pontos nos resultados da Eletrobras (ELET3;ELET6). O que mais pesou nos números divulgados pela companhia, apesar do crescimento nas receitas, foram as provisões.
O lucro líquido do quarto trimestre de 2021 da estatal caiu mais de 50% em relação a igual período de 2020, para R$ 610 milhões.
O resultado foi negativamente impactado por provisões operacionais, com destaque à PCLD (provisão para créditos de liquidação duvidosa) de R$ 1 bilhão referente a risco de créditos a receber, pela holding e pela Eletronorte, contra a distribuidora Amazonas Energia, provisão relativa à passivo a descoberto da SPE (sociedade de propósito específico) Santo Antônio Energia de R$ 706 milhões (em adição à perda de R$ 697 milhões em participações societárias para a mesma SPE).
Por outro lado, a receita operacional líquida do quarto trimestre aumentou 27%, para R$ 11,5 bilhões. Tanto o segmento de geração quanto de transmissão apresentaram crescimento de receita.
Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, classifica os resultados como um “balanço de transição”. As receitas superaram as estimativas, mas as despesas vieram maiores do que o previsto, refletindo o aumento do custo de energia comprada para revenda e o provisionamento do período.
Outro ponto que Arbetman destaca são as iniciativas frustradas em capex (investimentos), tanto em geração quanto em transmissão.
“Para frente, com a capitalização possivelmente dando certo, essa frustração diminuiria bastante. Teria tanto Itaipu quanto Angra fora, uma empresa separada. Haveria menor dificuldade de efetivar o capex”, afirma.
De acordo com Leonardo Piovesan, analista fundamentalista da Quantzed, avaliar os resultados como bons ou ruins depende da linha que se leva em consideração.
Piovesan diz que, embora o resultado recorrente tenha vindo bom, o não recorrente veio “bem negativo”, com as provisões marcando “mais um trimestre pesado”.
O que o desempenho das ações conta sobre a privatização?
Em fevereiro, o O Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou a primeira etapa da privatização da Eletrobras, que ocorrerá dentro do modelo de capitalização – ou seja, via oferta de ações.
Mesmo com o ministro Vital do Rêgo reconhecendo que o valor de venda da estatal está subestimado (para o magistrado, a empresa deveria ser privatizada por R$ 130 bilhões, quase o dobro do valor do patrimônio avaliado pelo governo, de R$ 67 bilhões), a aprovação foi realizada sob a modelagem apresentada pela União.
Em assembleia geral extraordinária, a maioria dos acionistas aprovou os termos para o processo de desestatização da companhia, entre eles a emissão das novas ações e a reestruturação societária da empresa. Os acionistas também deram sinal verde para o conselho de administração definir o cronograma, a estrutura e os demais termos e condições da oferta.
Agora, a pauta volta ao plenário do tribunal de contas para deliberação. O governo trabalha com a oferta de ações acontecendo em maio.
Contrariando as perspectivas quanto a uma melhora no ânimo dos investidores em relação ao processo de privatização, as ações da Eletrobras não estão reagindo muito.
Segundo Piovesan, a cotação atual do papel da estatal mostra que o mercado foi precificando cada vez mais uma descrença com a privatização, e não o contrário.
“É embutida uma probabilidade baixa de privatização no preço que está hoje”, diz.
De acordo com o analista, a descrença dos investidores se deve à lentidão no andamento do processo, visto que o governo trabalhava inicialmente com a privatização acontecendo em 2021.
Piovesan não descarta a possibilidade de mais atrasos, considerando os empecilhos para chegar à aprovação final da proposta.
“A gente pode ver que o TCU não está jogando a favor do andamento do processo. E é ele que está com o poder para privatizar ou não”, destaca o especialista. “Eu vejo que, realmente, o tempo ficou muito apertado para ter uma aprovação dessa privatização ainda neste ano”.
O analista da Ativa acredita que existe um potencial muito grande ainda não precificado nas ações. Embora reconheça que existem riscos e alta volatilidade no curto prazo, Arbetman vê o momento atual como uma oportunidade.
“Vejo uma balança de risco e retorno que pode ser favorável ao acionista da companhia, tanto que, por ora, mantenho minha recomendação de compra ao papel”, afirma. “O preço de tela dialoga muito mais com a binaridade do processo [de privatização] do que com os ganhos fundamentais advindos dele”.
Segundo Arbetman, a companhia é negociada com 15% de desconto em relação ao EV/Ebitda (valor da empresa sobre Ebitda) dos últimos três anos.
“Isso mostra o peso que essa binaridade tem sobre os papéis hoje. É fundamentalmente um papel que dialoga muito mais com as dúvidas com o avanço do processo de capitalização do que com as benesses que podem ser advindas dele”, completa o analista.
O Goldman Sachs, em relatório divulgado nesta segunda-feira (21), reforçou sua recomendação de compra para as ações da Eletrobras, com preço-alvo de R$ 48 (ELET3) e R$ 53 (ELET6). Na opinião do banco, a potencial capitalização deve continuar movimentando os papéis daqui para frente.
Hora de acordar o “gigante”
A precificação dos papéis mostram que a Eletrobras não vem sendo tratada da forma como deveria, avalia Arbetman.
“A gente está falando de um player que, por si só, é vanguardista, agente transformador, e que não vem sendo tratado dessa forma ao longo dos últimos anos”, afirma.
De acordo com o analista da Ativa, tem havido um subaproveitamento das operações. Para frente, com o avanço da capitalização, o especialista espera enxergar uma assertividade maior no capex para pavimentar uma avenida de crescimento sustentável, que gere valor para a companhia.
Ele lembra que a Eletrobras tem participado de leilões de transmissão para tentar crescer, mas não ganha nenhum certame há mais ou menos uma década.
“Isso mostra como o gigante está adormecido”, diz o analista.
Com a privatização, Arbetman enxerga a Eletrobras virando o jogo e se tornando protagonista em leilões, tanto em transmissão quanto em geração.