Elétricas pedem apoio do governo contra impactos do coronavírus no setor
Distribuidoras de energia do Brasil têm pedido ao governo um pacote de apoio devido aos efeitos do coronavírus sobre o setor que poderia envolver empréstimos emergenciais, inclusive do BNDES, além do uso de recursos do Tesouro e de fundos setoriais, sugeriram presidentes de elétricas nesta sexta-feira, durante debate promovido pela corretora XP Investimentos.
O pleito das empresas vem em meio à forte redução da demanda por eletricidade após medidas de isolamento adotadas para combater o vírus e devido à perspectiva de aumento significativo na inadimplência.
O presidente da consultoria PSR, Luiz Barroso, estimou que uma perda de receita de 20% para as distribuidoras com o menor consumo e a inadimplência poderia representar um “rombo” de 15 bilhões de reais para as empresas do segmento.
O presidente da Copel, Daniel Slaviero, afirmou que as empresas ainda estão fazendo contas, mas avaliam que poderiam precisar de 15 bilhões a 17 bilhões de reais para atravessar as turbulências causadas pela pandemia no mercado.
No momento, as conversas das elétricas com o governo passam pela possível viabilização de empréstimos às distribuidoras, em operação que pode envolver o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), disse o presidente da Cemig (CMIG3), Reynaldo Passanezi, acrescentando que a medida poderia ser a solução para parte dos problemas de caixa do setor.
Mas executivos de elétricas apontaram que outras fontes de recursos também poderiam compor o pacote de apoio.
O presidente da Energisa (ENGI11), Ricardo Botelho, defendeu que “em situações como a presente o Estado deve agir” e pediu que o governo avalie também o uso de recursos do Tesouro para garantir a sustentabilidade das elétricas.
Ele estimou ainda que entre 2,5 bilhões e 3 bilhões de reais que estão em fundos setoriais da indústria de energia voltados a diversas finalidades poderiam ajudar a bancar as medidas necessárias.
Por enquanto, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) flexibilizou por 90 dias algumas obrigações das distribuidoras, como as relacionadas à leitura presencial do consumo e ao funcionamento de agências de atendimento ao público.
A agência, por outro lado, determinou que as concessionárias não poderão cortar o fornecimento durante esse período para clientes residenciais e empresas de ramos considerados serviços essenciais.
O movimento do regulador gerou nas distribuidoras preocupações com um possível aumento da inadimplência e de ligações ilegais de energia, os famosos “gatos”, conhecidos no setor como perdas não-técnicas.
“Você tem naturalmente aumento de perdas (decorrente da atual situação). E agora que você flexibilizou o corte, as pessoas se acomodam e começam a não pagar suas contas. E na hora em que se acumulam as contas, o poder de pagamento das pessoas é limitado”, disse o presidente da Equatorial Energia (EQTL3), Augusto Miranda.
Retomada gradual
Alguns dos executivos das elétricas ainda defenderam, durante o debate promovido pela XP, que a retomada do consumo de eletricidade após o fim das quarentenas, ainda em vigor por todo o país, deve ser gradual, e não um movimento explosivo, de demanda reprimida.
O presidente da Energisa lembrou que essa recuperação lenta foi observada no passado, como quando o Brasil passou por um racionamento de energia em 2001.
“Ainda não se sabe como será a curva de retomada da demanda, mas não deve ser uma recuperação em ‘V’, não deve ser um ‘V’ muito acentuado”, disse Botelho.
“No último racionamento o mercado ficou 10 anos (para retomar o nível de consumo visto antes). Esse ‘V’ não volta logo, ele demora”, concordou Miranda, da Equatorial.
[A carga de energia do sistema elétrico do Brasil tem caído fortemente desde as quarentenas, com o aumento no consumo residencial devido à adoção de trabalho remoto por muitas empresas não compensando o fechamento de comércios e redução de ritmo da indústria.
Desde o início das medidas de isolamento, a demanda tem caído até quase 20% na comparação com o período antes do agravamento da epidemia de coronavírus no país, o que tem levado o consumo de energia a registrar durante a semana níveis geralmente visto antes aos sábados e domingos.
Dividendos
As preocupações com os impactos do coronavírus sobre o setor de energia e a economia em geral têm feito as elétricas adotarem medidas para preservar caixa, como a revisão de pagamentos de dividendos e investimentos.
Na Energisa, há uma discussão em andamento sobre mudanças na política de dividendos a partir de agora, segundo Botelho.
A Equatorial também tem discutido com seu conselho a política de dividendos e suas projeções de investimento (Capex) e gastos operacionais (Opex), disse Miranda.
A presidente da Light, Ana Marta Horta Veloso, disse que a companhia propôs aos acionistas “que os dividendos fiquem retidos em uma conta especial, dadas as incertezas da pandemia”. A proposta será deliberada em assembleia.
A Copel foi “absolutamente conservadora” ao definir dividendos, apesar de uma expectativa anterior de aumentar a distribuição de recursos aos acionistas, disse Slaviero.
A Neoenergia (NEOE3), por outro lado, não tem planos de alterar sua política de dividendos por ora porque já previa uma distribuição “bastante conservadora” e ainda está com geração de caixa sólida, disse o CEO do grupo, Mario Ruiz-Tagle.
A elétrica EDP Brasil, do grupo português EDP, anunciou na semana passada uma redução dos dividendos referentes a 2019 e dos investimentos previstos para 2020.