Política

Eleições dos comandos da Câmara e do Senado dão indicações do clima do Congresso com o governo

01 fev 2023, 11:45 - atualizado em 01 fev 2023, 11:45
Congresso
Aliados de Pacheco estimam que ele consiga entre 50 e 55 votos para se reeleger, uma boa margem acima dos 41 necessários (Imagem: Reuters/Adriano Machado)

As votações para as presidências da Câmara e do Senado nesta quarta-feira darão amostras iniciais de como o Legislativo deve se portar em votações importantes para o novo governo, e, se entre deputados o caminho parece livre para uma reeleição de Arthur Lira (PP-AL), o mesmo não se repete no Senado, onde o favorito Rodrigo Pacheco (PSD-MG) pode ter uma disputa mais apertada com Rogério Marinho (PL-RN), aliado de Jair Bolsonaro.

Ainda que não alcance os votos que diz ter o suficiente para ao menos empatar com Pacheco o grupo de Marinho promete fazer barulho no Senado.

O risco real de efetivamente atrapalhar ou mesmo impedir a aprovação de medidas prioritárias do governo, no entanto, só poderá ser aferido na votação para a presidência da Casa.

Aliados de Pacheco estimam que ele consiga entre 50 e 55 votos para se reeleger, uma boa margem acima dos 41 necessários.

Três fontes do Congresso descartam a possibilidade de uma vitória do grupo oposicionista. Articuladores de Marinho, no entanto, apostam em placar apertado, e com vitória para o ex-ministro de Bolsonaro.

“É preciso observar primeiro o seguinte: qual que vai ser o placar de votação”, disse o vice-presidente da Arko Advice Cristiano Noronha. “É óbvio que essa votação do Marinho vai ser importante para ver é qual é a força que o Bolsonaro enfim tem no Senado.”

A Arko projeta que Pacheco tenha entre 45 e 48 votos, enquanto Marinho deve angariar de 25 a 32 senadores.

Mais do que uma disputa por números, a eleição da presidência do Senado tem evidenciado um embate discursivo em que ambos os lados se acusam de estarem blefando.

A votação servirá de termômetro, mas pode não revelar um retrato fiel da correlação de forças no Senado.

Esse é o caso da primeira medida provisória editada por Luiz Inácio Lula da Silva no dia em que tomou posse: a MP do Bolsa Família (Imagem: REUTERS/Ueslei Marcelino)

Uma das fontes da Casa, cujo posicionamento não está claro em relação à disputa da Mesa, avalia que pode haver entre os eleitores de Marinho parlamentares que não necessariamente votariam contra matérias prioritárias do governo, caso da reforma tributária.

Essa fonte levanta a possibilidade de, em um jogo de barganha, que senadores estejam sinalizando “traições” e declarando tendência de voto em Marinho para obter mais vantagens desde espaços na estrutura da Casa até cargos de segundo e terceiros escalões no Executivo em uma negociação pelo apoio a Pacheco.

Pode ocorrer ainda, segundo Nogueira, que votos em Marinho ocorram na intenção de “passar algum recado”, seja por questões internas relacionadas à gestão anterior, seja por mal-estar diante das movimentações de Davi Alcolumbre (União-AP), principal articulador da candidatura à reeleição de Pacheco.

Alcolumbre tenta permanecer na presidência da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), e, segundo críticas de colegas, não estaria abrindo espaço para a participação de parlamentares fora de seu grupo político.

Isso não significa uma oposição automática ao governo Lula.

“Não vejo número para oposição cega ao governo. A tendência continua de votações favoráveis a projetos do governo que sejam relevantes”, disse à Reuters o senador Alessandro Vieira (PSDB-SE).

O parlamentar já declarou seu voto em Rogério Marinho por considerar negativa a continuidade da dupla “Alcolumbre-Pacheco”. O senador reconhece a tentativa de se transformar a disputa em uma espécie de terceiro turno entre Lula e Bolsonaro ou a uma batalha relacionada ao autoritarismo e ao golpismo.

“Não é nada disso. É uma decisão com relação aos rumos da própria Casa, como vai ser administrada, como serão tocadas as pautas”, explica o senador.

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Reforço

Algumas medidas importantes para o governo já aguardam votação no Congresso. Esse é o caso da primeira medida provisória editada por Luiz Inácio Lula da Silva no dia em que tomou posse: a MP do Bolsa Família, que garantiu o pagamento do benefício no valor de 600 reais.

Há ainda a MP que devolve o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) ao Ministério da Fazenda, e a MP que reduz a incidência de PIS-Cofins sobre combustíveis, além do conjunto de medidas anunciadas pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para reduzir o déficit fiscal.

Por isso mesmo, o governo adotará estratégia já utilizada por outras gestões e liberará seus ministros eleitos para o Parlamento para que deem uma forcinha ao candidato favorito do Planalto. Ao menos cinco ministros irão engrossar as fileiras governistas no Senado, enquanto seis deles devem assumir seus postos na Câmara para as votações desta quarta.

Soma-se à articulação, a entrada em campo até mesmo de integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF). Alguns ministros da corte têm ligado para senadores em defesa de Pacheco, informou uma fonte do Judiciário com conhecimento das tratativas.

Soma-se à articulação, a entrada em campo até mesmo de integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF) (Imagem: Edilson Rodrigues/Agência Senado)

Pacheco segue como favorito no Senado, com o apoio de seis partidos, que, somados, têm 42 senadores. Mas nem todos devem votar no favorito do governo. Marinho conquistou o apoio declarado de mais duas legendas além do PL, que somam 23 senadores. Ambos os lados apostam em traições de parte a parte, já que o voto é secreto.

De qualquer forma, avalia a fonte do Congresso sem posição declarada, Pacheco já comanda a Casa e a tendência é se manter no posto.

Seja quem for o vencedor, o governo poderá ter dificuldades em algumas votações e precisará de muita negociação se resolver aprovar alguma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), para garantir a maioria de três quintos necessária nesses casos.

Faixa Livre

No caso da Câmara, o caminho parece desimpedido e há quem aposte em um placar de aproximadamente 400 votos para Lira –a Arko projeta que a reeleição conte com o apoio de uma faixa de 307 a 340 deputados.

O presidente da Câmara deve sair dessa eleição mais forte e com capital político reforçado, mas sua eleição não pode ser creditada exclusivamente a ele, avaliam especialistas, ainda que tenha conseguido reunir em torno de si desde os bolsonaristas raiz até os petistas de carteirinha.

Há de se lembrar, por exemplo, que o PT rapidamente declarou apoio à sua candidatura, no ano passado, quando ainda era negociada a PEC que abriu o espaço fiscal necessário ao pagamento do Bolsa Família no valor de 600 reais.

“Acho que é um jogo aí de ‘ganha-ganha'”, avaliou Nogueira, da Arko. “O PT não tem candidato … vai poder comandar a comissão mais importante da Casa e não cria de início nenhum tipo de atrito com a Câmara.”

O analista político e CEO da Dharma Political Risk, Creomar de Souza, lembra que confirmada sua vitória, Lira assume a presidência da Câmara em um cenário diferente do visto em seu mandato anterior, tendo, inclusive, um outro chefe do Executivo.

“Lira conseguiu guiar a Câmara e os interesses dos deputados de forma muito eficaz em um momento bastante incerto (pandemia, Bolsonaro e eleições). Um prognóstico de vitória folgada é, em determinado sentido, fruto da capacidade de articulação dele e da leitura dos seus pares de que não há alternativa melhor para lidar com uma conjuntura em que do outro lado da praça dos três poderes há um articulador político muito mais eficaz que o antigo ocupante do Planalto”, avaliou.