El Niño, commodities e custos: Desafios e oportunidades para o agronegócio em 2024
Na primeira coluna do ano de 2024 é quase obrigatório trazermos um olhar para o ano que começa. Como será o ano para o agro brasileiro? E o olhar sobre a sustentabilidade no agronegócio em 2024?
São perguntas que nos assaltam a mente, principalmente no contexto atual, nos âmbitos paroquiais e internacionais. Achamos bem interessante fazer esse exercício até mesmo para contextualizarmos a nossa pauta quinzenal sobre agronegócio e sustentabilidade para o nosso leitor dentro de uma visão mais estruturada e estratégica para o ano.
A Matriz SWOT (FOFA em português) é uma ferramenta de análise estratégica muito aplicada na administração de negócios e empresas.
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Essa matriz permite identificar pontos fortes e fracos do negócio e tratá-los sob a perspectiva das oportunidades e desafios (ou ameaças) para o sucesso de determinado negócio, empreita ou produto e pode ser representada conforme abaixo:
Assim, se analisarmos a conjuntura atual – e potenciais desdobramentos dessa conjuntura no decorrer do ano de 2024 – podemos tentar aplicar a ferramenta para o contexto macro e micro do setor, traçando juntos uma espécie de planejamento estratégico para o agronegócio brasileiro em 2024.
A força do agronegócio brasileiro como ponto de partida
A análise em perspectiva das forças representativas e consolidadas do agronegócio brasileiro não podem deixar de compor a premissa básica para esse raciocínio.
Dentre as forças do “S” da matriz SWOT que envolvem o agro brasileiro estão números cada vez mais expressivos de produção, aumentos vertiginosos e consistentes de produtividade, aplicação cada vez mais amplificada de novas técnicas de cultivo, além de um empreendedorismo “profundo” e arraigado do homem do campo.
Mão-de-obra cada vez mais especializada e capacitada para a gestão no campo, tecnologia de ponta dentro e fora da porteira, além dos recursos financeiros disponibilizados no atual Plano Safra para o financiamento público e privado do agronegócio brasileiro.
Compõe ainda esse quadro políticas públicas há muito estabelecidas, através de marcos regulatórios consolidados e testados, além de novos arcabouços e institutos jurídicos que conferem segurança jurídica e sustentabilidade às operações comerciais, de financiamento e aos investimentos no campo e na cadeia ampla do agronegócio.
Além de tudo isso, temos consumidores ávidos no mundo inteiro por produtos agropecuários de qualidade, produzidos de forma sustentável e a reduzida capacidade de oferta destes mesmos produtos pelos nossos concorrentes mais diretos por estes mercados internacionais.
Riscos e desafios para o agronegócio em 2024
Entretanto, existem riscos e desafios a serem superados nesse ano, tanto para quem produz, quanto para que financia, compra e investe no setor.
O “W” da matriz SWOT indica entre tais desafio:
- Baixa nos preços de muitos dos produtos agropecuários, tanto no mercado interno quanto no mercado internacional – principalmente se comparados com os preços dos últimos anos –;
- Os problemas climáticos que se avolumaram do segundo semestre de 2023 com o fator “El Niño” e suas consequências nos regimes de chuvas para o plantio etc.;
- O custo dos financiamentos – com taxas de juros ainda bastante “salgadas” -, dos insumos e até o aumento de preço das terras disponíveis nos últimos anos;
- Aumento do risco de crédito e comercial nas operações por conta do somatório dos fatores anteriores e (v) exacerbação dos antagonismos internacionais.
Claro que ainda existem outros riscos e desafios a serem lembrados, tais como a necessidade de maior disponibilidade e abrangência de seguro rural, falta de infraestrutura de escoamento e armazenagem da produção agropecuária, falta de sucessão nos negócios no campo, dentre outros, mas estes são desafios muito mais estruturais do que conjunturais e já estão compondo há muito o “W” da matriz.
Os desafios a serem geridos e superados
Se aplicarmos aos desafios o termo “ameaças” conforme indicado no “T” da matriz, para 2024 temos, em nossa visão, como principais pontos: (i) a pouca capacidade que ultimamente o país vem demonstrando em termos de articulação de interesses perante organismos e fóruns internacionais; e (ii) a potencial judicialização das repactuações de vencimentos, taxas e garantias das operações comerciais e financeiras na cadeia do agro, decorrentes da conjuntura atual de preços reduzidos, potencial quebra de safras e custos altos de produção.
No primeiro aspecto podemos dizer que com o abandono “lento e gradual” da tradicional neutralidade que sempre caracterizou a política externa brasileira, temos enfrentado mais percalços para participação nas cadeias globais e nas discussões em torno do arrefecimento das barreiras não-tarifárias, do que angariado êxitos no alinhamento com políticas internacionais que muitas das vezes não atendem aos melhores interesses nacionais.
Já em relação à segunda “ameaça”, podemos dizer que um “teste de estresse” das novas estruturas jurídicas de financiamento privado no agronegócio e das recentes alterações na legislação dos títulos e da recuperação judicial no agro, pode representar, no final das contas, um dissabor para novos investidores e redundar em maior escassez de crédito fundamental para a recuperação de preços e margens dos produtores nos curto e médio prazos.
Oportunidades não faltam em 2024
Por outro lado, no “O” de oportunidades da matriz ainda podemos ter um olhar interessante para esse ano de 2024. A redução de preços e o aumento dos custos de produção reduz a margem do produtor no campo, mas tende a aumentar a margem e o poder de barganha da agroindústria para 2024.
Os ganhos de escala tendem a ser necessários, favorecendo as operações de aquisições, fusões e associações no campo. O cooperativismo deve ser revitalizado como ferramenta de aumento de poder de barganha e ganho de escala para os produtores rurais, assim como a redução de preços de terras por conta dos desafios conjunturais enfrentados podem gerar novas oportunidades de consolidação para agentes mais capitalizados
Já a segurança jurídica com a utilização de instrumentos já consolidados no agronegócio para repactuação das dívidas e vencimentos, com a menor burocracia que envolve as emissões de títulos e o registro dessas operações desde a Lei do Agro de 2.020, podem representar importante ferramenta para aliviar o “estresse teste” da judicialização que alguns insistem em tentar “vender” e reproduzir no mercado de tempos em tempos.
Na seara da sustentabilidade no campo, a escalabilidade das técnicas já consolidadas de manejo e sistemas de plantio sustentáveis, sistemas de ILPF e do financiamento mais barato a projetos com essas características, podem gerar um aumento da oferta de novas áreas de produção com recuperação de pastagens e entrega de produtos agroambientais que ajudaram no balanço de receitas marginais dos produtores no campo e nas emissões de títulos verdes.
Além disso, a potencial regulação dos mercados de créditos de carbono no Brasil, já em fase final de aprovação pelo Congresso Nacional – reforçada pela importância do agro sustentável conforme reconhecido pelos participantes da última COP 28 e Dubai – poderá se converter em uma fonte importante de novos recursos, além de “dissuasão” ou “arrefecimento” de barreiras não-tarifárias aos nossos produtos no mercado internacional.
Conclusão
Feito o SWOT do agronegócio brasileiro para 2.024 – sem considerar, claro, as especificidades de cada cultura, cada negócio, cada produto – podemos afirmar que, como sempre para conversão das “ameaças” em “oportunidades” a chave é a gestão no campo e nos negócios da cadeia ampla do agro.
Governos, empreendedores, agentes financiadores, mercado, investidores e a sociedade como um todo devem entender o contexto vivido e atuar da melhor forma possível para buscar o melhor resultado. Aliás, esse é e sempre foi o principal desafio de se produzir no Brasil, vencido desde sempre, desde os idos da conquista do cerrado, pelo empreendedorismo do produtor rural e sua capacidade de assumir riscos e produzir cada vez mais e melhor no campo.