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Eduardo Belotti: A lição oculta sobre investimentos que eu aprendi num self-service

22 jan 2021, 13:24 - atualizado em 22 jan 2021, 14:47
Restaurante Comida Self-Service
A importância de se proteger e diversificar. Até em self-services (Imagem: Unsplash/@yeeu)

O pessoal que me conhece sabe que eu adoro conversar e contar histórias.

Essa semana eu estava contando uma que aconteceu comigo no meus tempos de estagiário que me deu um grande insight para a vida e para os investimentos. E falaram “isso dá texto ein?”. Por isso, cá estou.

O pessoal me sacaneia porque eu fico fazendo paralelos da vida real com o mercado financeiro, mas esse em específico me fez refletir por bastante tempo.

A importância de se proteger e diversificar. Até em self-services.

Eu começava o estágio às 12h na Glória, no Rio de Janeiro. Minha aula acabava às 11 na PUC-Rio. Com isso, precisava fazer um certo malabarismo para conseguir almoçar e cumprir o horário.

Eu chegava no restaurante self-service ao lado do prédio do estágio umas 11:50 e tinha 10 minutos para entrar, comer, pagar, sair e subir o prédio ao lado. Uma tarefa não tão simples, mas eu até conseguia porque tenho o péssimo hábito de comer muito rápido.

Num dia qualquer, entrei nesse restaurante self-service e vi um bife acebolado que estava com uma aparência tentadora. Como você sabe, eu não tinha muito tempo para ficar decidindo. Vi, gostei, logo coloquei no prato e fui adiante o mais rápido possível. Peguei também um macarrão e o prato estava feito.

Bife acebolado com macarrão.

Sentei e comecei a comer. No momento que eu cortei o bife eu achei a consistência um pouco curiosa. Mas de novo, não tinha tempo para pensar muito. Enrolei o macarrão no garfo, espetei o pedaço de bife e botei na boca.

Ali deu para perceber que algo estava errado. O gosto era muito diferente do que eu imaginava. Estava MUITO ruim.

Cortei outro pedaço e entendi o que estava acontecendo: aquele bife acebolado era de fígado.

E eu ODEIO fígado.

Não tinha tempo (nem dinheiro) para pegar outro prato. Então comi só o macarrão e fui para o trabalho.

Naquela época eu estava começando a estudar sobre investimentos e tive um grande insight.

“Tá Edu, mas o que isso tem a ver com investimentos?!”

Eu corri um risco desnecessário. O bife poderia estar bom, mas se estivesse ruim (o que estava, pelo fato de eu não gostar de fígado), isso iria estragar a minha refeição.

Se existisse alguma forma de correr esse risco mas sem estragar tudo caso desse errado, faria sentido fazer isso.

E foi aí que eu descobri que, em restaurantes self-service, o peito de frango grelhado funciona como a renda fixa de uma carteira de investimentos.

Ele pode não ser a proteína (ou mistura, como os paulistas gostam de chamar) mais gostosa da mesa de se servir, mas mesmo você não conhecendo o local, você pode inferir que o gosto vai estar minimamente aceitável. É bem difícil inventar muita moda e deixar um frango intragável.

A partir daquele dia, toda vez que vou num self-service eu pego pelo menos 1 pedaço de frango. Isso não significa que eu acredite que ele vá ser mais gostoso do que as outras opções como peixe empanado, carne assada, carne de porco, etc.

Só significa que aquele é o meu porto seguro. É o meu Hedge. Se tudo der errado com as outras escolhas, eu sei que o frango vai estar ali para me salvar.

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A importância da renda fixa

Em tempos de Selic em mínima histórica, não é incomum ver pessoas começando a investir e já colocando tudo em renda variável. Esse movimento tem lógica. Para que investir num ativo que vai render tão pouco?

Se você investe R$ 5.000 num Tesouro Selic a 2% ao ano, você faz R$ 100 brutos em um ano.

Talvez seja mais fácil encontrar R$ 100 perdidos na calçada ao longo de um ano do que guardar R$ 5.000 e receber essa quantia no final do ano (na verdade ainda tem impostos, mas deu para entender).

Dito isto, é fácil de entender porque tem tanta gente adentrando o mundo de investimentos e partindo direto para a renda variável.

Eu já tenho uma visão um pouco diferente.

Eu vejo a renda variável como aquele bife acebolado. Tem grandes potenciais de retorno, mas também pode trazer resultados desagradáveis.

Não me entenda mal. Isso não é uma crítica à renda variável. Eu invisto grande parte do meu dinheiro em renda variável. Assim como continuo ousando em self-services pegando comidas que tem o potencial de estarem deliciosas, mas com o risco de eu odiar também.

A diferença é que hoje eu sempre pego pelo menos um peito de frango. Ali eu sei que mesmo que todo o resto que eu pegar estiver ruim, eu não vou sair com fome.

Obviamente toda vez que eu pego o meu peito de frango eu falo para quem está almoçando comigo: “essa é a minha renda fixa do almoço” e depois conto essa história toda. Repetitivo? Talvez. Mas é que eu adoro esse insight que eu tive.

Os benefícios ocultos

Mesmo dizendo isso tudo, ainda dá um certo receio de investir em renda fixa com Selic na mínima histórica e renda variável fogueteando. No bull market é muito fácil virar as costas para ativos que rendem menos.

Só que como o nome diz, a renda variável varia. O Bull market sempre termina num Bear market. As subidas não são eternas.

E quando a maré vira, começam a surgir oportunidades incríveis de comprar ativos de altíssima qualidade a preço de banana.

Quem acompanha os investimentos com ferramentas como o Real Valor, consegue ver isso nitidamente.

Sabe quem tem dinheiro disponível para comprar esses ativos?

Quem tem dinheiro em ativos de baixa volatilidade e alta liquidez. Pode ser tesouro selic, CDB de liquidez diária ou mesmo em caixa.

Não despreze esses investimentos por que eles rendem muito menos. Eles têm papel importantíssimo.

E não despreze o peito de frango em self-service. Ele pode salvar o seu almoço.