Economistas veem alta mais acelerada dos juros com BC enquadrado por arcabouço fiscal pior
Os departamentos econômicos já começaram a considerar juros de dois dígitos no ano que vem, impelidos pela forte deterioração nos preços de mercado e na percepção de risco que fez derivativos embutir Selic de mais de 11% no ano que vem e aperto monetário de até 150 pontos-base na próxima semana.
O banco norte-americano JPMorgan puxou a fila, elevando a 125 pontos-base sua projeção de aumento da taxa Selic pelo Banco Central em cada uma das próximas duas reuniões do Copom, vendo o BC forçado a acelerar a velocidade de restrição monetária devido à deterioração do balanço de riscos para a inflação.
“O risco de piora nas perspectivas fiscais até o término do ano e o ambiente global mais desafiador ainda exigem cautela, e não descartamos um movimento ainda mais agressivo pelo Banco Central, seja antecipando o movimento com um aumento de 150 pontos-base na próxima semana ou prolongando ainda mais o ciclo em direção a uma taxa terminal mais alta no próximo ano”, disseram Cassiana Fernandez (economista-chefe do banco no Brasil) e Vinicius Moreira (economista) em relatório.
Na curva de DI, os contratos já embutem acréscimo 150 pontos-base, 50 pontos-base acima do cenário a que o mercado vinha se apegando muito pelas afirmações do Bacen de que não via necessidade de aperto do passo.
Mas já na terça-feira, também dia de forte pressão nos mercados locais, o diretor de Política Econômica do Banco Central, Fabio Kanczuk, reconheceu que uma política monetária mais apertada seria necessária caso o problema fiscal no Brasil piorasse.
Desde então, os maiores temores do mercado ficaram mais perto da concretização. O governo anunciou um Auxílio Brasil de 400 reais parcialmente bancado com recursos fora do teto de gastos.
Na noite da véspera, o ministro da Economia, Paulo Guedes, pediu “licença” para o furo do teto, o que já ditou abertura fortemente negativa para os ativos financeiros nesta manhã.
E declarações do presidente Jair Bolsonaro na tarde desta quinta empurraram os preços para níveis ainda piores. O DI janeiro 2023 chegou a subir impressionantes 96,5 pontos-base, indo a quase 10,9% na máxima do dia.
Toda a curva de DI está bastante estressada, o que fica explícito pelas taxas a termo entre maio e junho de 2022, FRAs apontavam nesta tarde CDI médio no período de 11,6%, o que daria uma Selic média de 11,7%, ante o atual patamar de 6,25%.
“A gente agora está discutindo se vai ser 125 pontos-base ou 150 pontos-base”, disse Caio Megale, economista-chefe da XP, citando cálculos sobre o que o fiscal representa em termos de risco.
“Inequivocadamente o cenário muda”, disse. “A chance de Selic acima de 10% cresceu, a inflação (de 2022) não será mais de 3,9%, e o câmbio não será o de 5,10 reais”, afirmou, citando as atuações projeções da casa, que vê a taxa de juros terminal por ora em 9,25%.
O Santander Brasil avalia que, no mínimo, o Copom vai endurecer o tom do comunicado da decisão prevista para a semana que vem, mas que há chances de ritmo maior de alta do juro ainda neste ano.
“Ainda não temos sacramentado o que será feito do fiscal, qual será a decisão do governo. Então achamos que o BC pode preferir esperar antes de acelerar o passo de alta dos juros. Mas talvez o BC faça o reconhecimento no comunicado de que os fatores de risco pioraram da última reunião para cá”, disse Mauricio Oreng, economista do banco privado.
O Santander (SANB11) ainda estima juro de 9% ao término do ciclo de alta, com dois aumentos seguidos de 100 pontos-base e um último de 75 pontos-base.
“O que está cada vez mais claro é que o orçamento total da elevação da Selic provavelmente será bem maior. Existe uma chance grande de em nossa próxima revisão termos Selic de duplo dígito”, informou.
“Não dá nem mais para chamar esse juro acima de 10% de cenário alternativo. É o que está virando cenário-base mesmo. Talvez a aceleração (da alta de juros) pelo BC ocorra em dezembro”, finalizou.
O economista Mauricio Nakahodo, do grupo financeiro MUFG, ainda considera cedo para se falar em Selic de dois dígitos, mas admite que a taxa terminal deverá ficar bem acima dos 8,5% previstos pela casa atualmente.
“Entre 9% e 10% seria um cenário mais possível do que no mês passado”, afirmou. Com juro tão mais alto, o risco também é que o crescimento econômico em 2022 fique bem abaixo de 1%, que já seria aquém da taxa de 1,7% estimada atualmente pelo MUFG.
Nakahodo também avalia que “certamente” o Bacen será mais duro na comunicação da próxima quarta-feira, já que o risco fiscal adicional vai deteriorar o balanço de riscos para a inflação.