Dólar a R$ 6 é reação exagerada, diz diretor de Tesouraria do Travelex Bank
Depois de atingir o maior cotação desde a criação do real, o dólar à vista (USDBRL) segue em forte alta e rompeu o nível de R$ 6 pela primeira vez na história nesta quinta-feira (28).
Por volta de 13h (horáiro de Brasília), a divisa norte-americana bateu R$ 6,0038 (+1,54%) no mercado à vista — no maior nível intradia. O recorde anterior foi registrado em 14 de maio de 2020, no auge da pandemia, quando o dólar atingiu R$ 5,9718.
A disparada da moeda em relação ao real reflete a tensão dos agentes financeiros sobre o anúncio do pacote fiscal com a isenção do Imposto de Renda (IR) para salários de até R$ 5 mil.
Ontem (27), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, confirmou o corte de e R$ 71,9 bilhões nos próximos dois anos, sendo R$ 30,6 bilhões em 2025 e R$ 41,3 bilhões em 2026. O impacto estimado até 2030 é de R$ 327 bilhões.
Também incluiu a isenção do IR, uma das promessas da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais.
Segundo o chefe da pasta econômica, o impacto da medida será “neutralizado” por um aumento na taxação de salários acima de R$ 50 mil — o que tem sido considerado “insuficiente” pelo mercado.
Isso porque a isenção do IR, estimada em R$ 50 bilhões anuais, supera os cortes de gastos previstos, gerando dúvidas sobre o real compromisso do governo com o equilíbrio orçamentário.
Exagero?
Na avaliação do diretor de Tesouraria do Travelex Bank, Marcos Weigt, a disparada do dólar é uma reação exagerada do mercado.
“O mercado não gostou [do pacote fiscal]. Os juros prefixados estão subindo, o dólar está disparando e a bolsa está caindo, mas não achei o pacote ruim como estão precificando hoje”, disse Weigt em entrevista ao Money Times.
“O movimento é exagerado e deve permanecer nos próximos dias, mas não vai se sustentar no longo prazo.”
Para ele, a decisão de aumentar a taxação de salários dos super-ricos “pega” a tributação de dividendos — um dos motivos para a tensão dos investidores hoje. Segundo ele, a medida deveria ter sido acompanhada por uma redução no IR das empresas.
E, apesar da forte valorização do dólar, o Banco Central não deve intervir no câmbio, na avaliação de Weigt, da Travelex.
“O BC tem afirmado que só deve intervir quando o mercado estiver em disfuncionalidade, o que não é o que está acontecendo neste momento”, afirma.
“O mercado tem que se ajustar por si só. Se tiver intervenção [no câmbio] e o mercado continuar achando que [o pacote fiscal] é ruim e continuar comprando [dólar], o Banco Central vai começar a vender e pode segurar o dólar por uma semana ou em 15 dias, mas o risco vai para outros ativos e depois o dólar volta a subir. Então, isso seria queimar a reserva cambial sem necessidade”, diz.
- Mercado reage a pacote de gastos e isenção de até R$ 5 mil no IR: Entenda todas as medidas anunciadas pelo governo e como isso mexe com seu bolso
Curva de juros precifica alta da Selic maior em dezembro
Os juros futuros (DIs) também ampliaram o ritmo de alta nesta quinta-feira (27), em continuidade ao movimento iniciado na véspera antes do anúncio do pacote fiscal.
Todos os vencimentos avançam mais de 30 pontos-base em relação ao ajuste anterior e os vértices mais longos já precificam uma Selic acima de 14%.
Por volta de 12h30, as taxas de Depósitos Interfinanceiros (DIs) para julho de 2026 subia a 14,02% na máxima intradia, ante 13,71% no ajuste anterior. O DI para janeiro de 2027 avançava a 14,01%, de 13,66% no ajuste na véspera.
Nesse cenário, Weigt, da Travelex, vê uma alta de 75 pontos-base na taxa básica de juros na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que acontece me dezembro. “As expectativas de inflação ainda estão desancoradas”, diz o head de Tesouraria, combinado com a recente pressão sobre o câmbio.
Com isso, a Selic, que está em 11,25% ao ano, teve terminar 2024 a 12% a.a.
Principais pontos do pacote fiscal
As medidas anunciadas, segundo a equipe econômica, tem como objetivo reforçar a nova regra fiscal ao alinhar o crescimento de despesas com os limites do arcabouço fiscal.
Confira os principais pontos do pacote fiscal:
Salário mínimo
Para o salário mínimo, a proposta é de que passe a ter ganho real, mas condicionado ao espaço do arcabouço entre 0,6% e 2,5%.
“Nossa proposta garante que o aumento real do salário-mínimo seja sustentável dentro do orçamento da União”, diz o governo.
- Regra atual: Crescimento pela inflação do ano passado + crescimento real igual ao PIB de dois anos anteriores;
- Regra proposta: Mantém regra de crescimento real pelo PIB, mas a variação real estará nos limites do arcabouço fiscal.
Abono salarial
A proposta para o abono salarial é de uma transição gradual de dois salários para 1,5 salário.
- Regra atual: trabalhador que recebe até dois salários-mínimos;
- Regra proposta: Fixar a renda para acessar o benefício em R$ 2.640,00 e corrigido pelo INPC até chegar a 1,5 salário mínimo.
Benefício de Prestação Continuada (BPC)
Para o Benefício de Prestação Continuada (BPC), o governo aperfeiçoou os mecanismos de controle. As medidas são:
- Focalizar em pessoas incapacitada para a vida independente e para o trabalho;
- Vedação de dedução de renda não prevista em lei
- Passam a contar para acesso: renda de cônjuge e companheiro não coabitante e renda de irmãos, filhos e enteados (não apenas solteiros) coabitantes;
- Atualização obrigatória para cadastros desatualizados há mais de 24 meses e para benefícios concedidos administrativamente sem Código Internacional de Doenças (CID);
- Biometria será obrigatória para novos benefícios e atualizações cadastrais;
- Em uma mesma família, a renda de um benefício volta a contar para acesso a outro benefício.
Veja a lista completa: As medidas propostas no pacote de corte de gastos de R$ 71,9 bilhões
*Com Giovana Leal