Do microcosmo familiar ao mercado de trabalho: desafios e dinâmicas do poder
Uma vez, quando reclamei sobre a bagunça em casa, um rabino me disse: “o que você queria? É uma casa com crianças, não um museu.” Verdade, ainda mais vinda de alguém que tem muitos filhos.
Ainda assim, de tempos em tempos, tenho meus ataques de ansiedade em relação à bagunça de casa, expulso mesmo todo mundo, coloco minha música e aciono o turbo clean tabajara. Em outras tantas, é um trabalho em família, ainda que sob protesto das crianças.
Mas, depois do último chilique, fiquei pensando e tentando entender de onde vinha esse meu desconforto extremo. Por que meu marido não sofre como eu? Será apenas uma questão de personalidade ou sensibilidade?
A pista veio de um dado histórico: durante pouco mais de 10 anos morei sozinha. Entre outras coisas, isso significa que eu tinha total controle sobre a minha bagunça – o que bagunçar, como bagunçar, quando bagunçar –, assim como o seu oposto: quando e como arrumar. Poder de decisão e controle sobre o ambiente ao meu redor, o meu microcosmo.
Perder ou compartilhar poder (quase sempre) é fonte de desconforto… seja lá em qual dimensão da vida for.
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No mundo corporativo, as dinâmicas de poder se manifestam de diversas formas e há uma vasta bibliografia sobre o tema. Como socióloga bairrista que sou, tenho a tendência a evocar os clássicos da área para me ajudar a (re)pensar sobre os desafios cotidianos, por mais banais que possam parecer.
No caso dessa reflexão sobre a bagunça em casa, foi Michel Foucault e sua microfísica do poder que me estenderam a mão: o poder está distribuído nas pequenas interações do cotidiano, nas sutilizas das relações interpessoais.
Além disso, ele também se manifesta fisicamente, na forma como o ambiente ao nosso redor está organizado e como este influencia nosso comportamento.
O desconforto em compartilhar ou perder poder é uma experiência comum em vários contextos do mundo do trabalho, mas ele aparece com maior força em determinados contextos, tais como:
- Transição de Carreira: em muitos casos, recomeçar uma jornada profissional significa perder status e influência acumulados ao longo de muitos anos, o que pode gerar um sentimento de vulnerabilidade. Reconquistar esse “capital social” é um grande desafio.
- Fusões e Aquisições: quando empresas se fundem ou são adquiridas, os líderes das organizações envolvidas frequentemente enfrentam a necessidade de compartilhar poder com novos parceiros ou até mesmo de perder posições de comando. Essa redistribuição de poder pode gerar insegurança, resistência e, em alguns casos, conflitos que afetam o desempenho da organização.
Em suma, seja no lar ou no mundo corporativo, o poder é algo que, quando perdido ou compartilhado, pode gerar desconforto. Estar atento às dinâmicas das relações interpessoais e trazer à consciência as raízes de gatilhos emocionais (próprios e alheios) são passos fundamentais para lidarmos melhor com experiências desse tipo.