Disputa envolvendo Slim e gasodutos aumenta incerteza no México
A disputa de meses em torno de gasodutos que colocou o grupo do bilionário Carlos Slim e três outras empresas contra o presidente de esquerda aumentou a incerteza no ambiente de negócios no México.
A questão gira em torno de mudanças propostas para contratos já assinados envolvendo sete gasodutos praticamente concluídos, construídos para atender à disparada da demanda por gás no país. O governo do presidente Andrés Manuel López Obrador quer eliminar provisões que obrigam o setor público a pagar pelo gás mesmo quando não estiver fluindo e exige bilhões em reembolsos e indenizações. As companhias — o Grupo Carso, de Slim, a subsidiária mexicana da Sempra Energy, a canadense TC Energy Corp e a Fermaca Enterprises — querem manter os contratos intactos.
Embora López Obrador (conhecido como AMLO) tenha dito nesta semana que uma resolução está “próxima”, grupos empresariais temem que o conflito estabeleça um precedente para o governo revogar contratos que considera injustos. A disputa vem na esteira da suspensão de um projeto aeroportuário de US$ 13 bilhões no ano passado e ocorre em um momento em que México precisa de mais investimentos para modernizar sua infraestrutura antiquada.
“Isso definitivamente prejudicou a imagem do México perante investidores”, disse Alejandro Schtulmann, comandante da consultoria de risco político EMPRA, na capital do país. “Depois do cancelamento do aeroporto, muitos investidores ficaram com um gosto amargo na boca e este foi outro mau sinal para eles.”
O enfrentamento preocupa o empresariado local e até representantes da Câmara de Comércio dos EUA e da embaixada canadense. O alto escalão do banco central mexicano expressou preocupação. O projeto mais importante é o gasoduto Sur de Texas-Tuxpan, avaliado em US$ 2,5 bilhões, joint venture entre TC Energy e IEnova (subsidiária da Sempra), que não pôde começar a operar por causa da disputa. A obra foi concluída com atrasos em junho.
Os gasodutos são importantes para escoar o excesso de gás produzido nos EUA, enquanto o México precisa do combustível fóssil para gerar energia para residências e fábricas, uma vez que seus campos antigos não conseguem produzir o suficiente para atender à demanda. As importações dos EUA via gasodutos mais que quadruplicaram desde o final de 2013, passando de 140 milhões de metros cúbicos por dia, segundo dados compilados pela Bloomberg.
Contratos de fornecimento de gás no regime “take-or-pay” — em que a estatal de energia paga a conta se obtiver o combustível ou não — não são raros porque oferecem aos construtores dos gasodutos garantia de que seus investimentos serão recompensados. Devido a atrasos nas obras (dos quais as operadoras se eximem de responsabilidade), o México começou a pagar pelo produto mesmo sem o gás fluir.
O governo argumenta que as empresas não foram comedidas ao invocar a cláusula de força maior que cobre atrasos motivados por conflitos sociais, adiamento de licenças e liminares judiciais. Processos preliminares de arbitragem foram protocolados em Londres e Paris em julho.
O comandante da Fermaca, Fernando Calvillo, informou que as conversas estão em andamento, mas não quis entrar em detalhes. O governo e o Grupo Carso se recusaram a comentar. Representantes da TC Energy e da IEnova não retornaram solicitações de comentário da reportagem.
“Existe um contrato claro”, disse Slim durante um evento em julho. “O investimento obviamente é o que gera atividade econômica e empregos. O presidente está ciente de que o investimento público não será suficiente, por maior que seja, para atender às maiores necessidades de infraestrutura da nação.”