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Dique construído pela Samarco para conter lama extrapola prazo

06 nov 2019, 11:39 - atualizado em 06 nov 2019, 11:39
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A mineradora alegou que a obra era necessária para conter o contínuo escoamento do rejeito e prometeu que o dique seria temporário (Imagem: Reuters/Ricardo Moraes)

Quando foi construído em 2016, o dique S4 provocou nos atingidos pelo rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana (MG), o receio de que a estrutura se tornasse definitiva. A estrutura alagou parte da área do município de Bento Rodrigues, uma das comunidades devastadas pela lama que vazou no rompimento da barragem da Samarco.

A mineradora alegou que a obra era necessária para conter o contínuo escoamento do rejeito e prometeu que o dique seria temporário. Passados exatos quatro anos da tragédia, o receio dos atingidos não só permanece como aumentou, já que o prazo para o descomissionamento não foi cumprido.

“Eles providenciaram para fazer o dique rapidinho. E agora para descomissionar tem esse atraso. Tem que tirar aquilo de lá imediatamente porque o nosso coração está ali dentro. E eles não estão mexendo em nada. Está lá do mesmo jeito. Por quê? “, questiona José do Nascimento de Jesus, o Zezinho do Bento, um dos membros da comissão de atingidos.

A construção do dique S4 foi autorizada em 21 de setembro de 2016 pelo então governador de Minas Gerais Fernando Pimentel, que justificou a medida alegando se tratar de obra emergencial.

O decreto assinado, que deu à mineradora a concessão de uma área de 56 hectares, tinha validade por três anos. Significa que a estrutura deveria estar descomissionada a partir de 21 de setembro desse ano, o que não ocorreu.

Procurada pela Agência Brasil, a Samarco informou em nota que o descomissionamento está sendo tecnicamente discutido com o governo mineiro e os órgãos competentes.

“A decisão de construir o dique S4 foi tomada após uma ampla e profunda discussão e análises técnicas”, acrescenta o texto. Ainda de acordo com a mineradora, a obra permitiu que o Rio Gualaxo do Norte, afluente do Rio Doce, ficasse dentro de parâmetros estabelecidos pelos órgãos ambientais.

Construção

A construção foi justificada como parte de um esforço para impedir que a lama, no primeiro período chuvoso após a tragédia, voltasse a escoar e poluir os mananciais da bacia do Rio Doce.

O dique S4 tem capacidade para armazenar 1,05 milhão de metros cúbicos de rejeitos. Na época, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) se opôs à construção, alegando que a área a ser alagada incluía uma parte de um muro colonial, anexo à Capela São Bento. Após a assinatura do decreto pelo governador, o órgão exigiu que fosse colocada uma proteção nas estruturas históricas que ficariam submersas.

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A construção foi justificada como parte de um esforço para impedir que a lama (Imagem: Facebook Oficial da Samarco)

O Conselho Municipal do Patrimônio Histórico de Mariana (Compat) lamentou a ausência de consulta e oficiou o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). O órgão sustentava que deveria ter sido ouvido, já que o processo do tombamento definitivo de Bento Rodrigues estava em tramitação.

O MPMG chegou a mover, sem sucesso, uma ação para que a Samarco fosse obrigada a realizar estudos capazes de indicar a real necessidade do dique S4 e de propor alternativas.

Uma segunda ação foi ajuizada para tratar de indenização aos proprietários de terrenos na área alagada. Segundo um relatório de atividades divulgado pelo MPMG nesta semana, esse processo ainda está em fase de especificação de provas. O próprio decreto assinado por Pimentel faz menção, em seu artigo 5º, à responsabilidade da Samarco e de suas acionistas Vale e BHP Billiton no custeio de indenizações.

Tombamento

O dique S4 não é a única fonte de preocupação dos atingidos em relação à comunidade devastada. Eles ligaram o alerta ao tomar conhecimento da minuta de um acordo elaborado pelo MPMG e o Ministério Público Federal (MPF). O documento sugere o tombamento de Bento Rodrigues, a desapropriação dos terrenos atingidos e a transformação da área em um “museu de território”.

O tema vinha sendo tratado há algum tempo no MPMG, que anunciou, em maio, ter recebido um dossiê elaborado pela Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). De acordo com a minuta, os moradores seriam indenizados pela desapropriação e o “museu de território” preservaria um local próprio para reunião e pernoite de ex-moradores.

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O dique S4 não é a única fonte de preocupação dos atingidos em relação à comunidade devastada

Entretanto, Zezinho do Bento, membro da comissão de atingidos pela barragem, lembra que o direito de serem reassentados no novo distrito que está sendo construído não tira dos moradores a posse dos antigos terrenos.

“Certo é que eles não podem definir sem a comunidade. Não doamos nosso terreno. Não existe desapropriação. Vai ter que ter segurança para fazermos o tombamento ou para criarmos um memorial. Nós não perdemos nenhum direito lá”, disse.

O Compat não foi convidado para participar de discussões em torno dessa minuta. O órgão, que é composto por representantes de órgãos públicos e da sociedade civil, discute o tombamento desde 2016, mas considera que uma proposta deve ser construída com os atingidos. Entre as ideias estão as de memorial, museu aberto ou um parque ecológico.

Até o momento, foram tombadas as igrejas de Nossa Senhora das Mercês, em Bento Rodrigues, e a de Santo Antônio, em Paracatu.

Segundo o MPMG, nada foi proposto à Samarco, ainda, e o que existe é uma discussão em termos de possibilidades, que deverão ser analisados juntamente com os atingidos para construção de uma solução conjunta.

Zezinho do Bento disse que os atingidos não são contra a construção de um museu para preservar a memória dos atingidos pela tragédia, mas que precisam participar das decisões. Há uma preocupação com a preservação do vínculo com o território. Mesmo após a tragédia, os moradores continuam indo ao município, inclusive para manter as tradições festivas, a exemplo da Festa de São Bento.

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