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Desmascarando os aspectos fundamentais do fluxo monetário do bitcoin

15 dez 2019, 13:00 - atualizado em 08 jun 2020, 15:21
Mercados
Não é recomendado confiar em apenas uma métrica antes de investir, pois, às vezes, as transações válidas se misturam com as inválidas (Imagem: Unsplash/@austindistel)

Ainda estamos nos estágios iniciais de pesquisa sobre os efeitos dos volumes de transação de bitcoin on-chain e em corretoras a fim de filtrar, de uma para outra, e separar o spam das transações válidas.

Apesar de não haver um acordo universal de uma métrica genuína, podemos reconhecer algumas das falácias da medição do volume de transações e da oferta/demanda do bitcoin, além de analisar os empenhos mais recentes de várias fontes a fim de apresentar volumes reais.

Enquanto muitos negociadores de cripto focam nos gráficos e nas análises técnicas, entender os aspectos fundamentais da verdadeira oferta/demanda em mercados sombrios com volumes falsos e moedas não utilizadas pode ser inválido para a negociação.

Encontrar uma métrica verdadeira de volumes de transação para bitcoin é algo bem difícil por conta da ofuscação de mixers (que misturam valores falsos e reais), quantias de transações não gastas (UTXOs) e configurações de privacidade.

Já que não existe demanda espontânea no mercado de cripto (por exemplo, poucos casos de uso além de especulação), então as métricas fundamentais como a relação de valor da rede para transações (NVT, na sigla em inglês) podem nos dar a impressão errada de utilização da rede se não separarmos a demanda real e a especulativa, além do fluxo monetário dos mineradores e das corretoras que, no momento, são os únicos “casos reais de uso” para cripto.

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Uma das possíveis métricas é a dificuldade de mineração e a taxa de variação de preço que oscila com o tempo (Imagem: The Merkle Hash)

Dificuldade de mineração vs. taxa de variação (ROC) osciladora de preço no Índice de Liquidação de Bitcoin (BLX)

Um dos fluxos monetários mais constantes e importantes no ecossistema dos bitcoins é o da indústria de mineração. Mineradores e operadores de corretoras são os únicos “players naturais” em cripto que precisam liquidar, regularmente, enormes quantias de bitcoin para financiar suas operações.

Entender quando essas grandes liquidações vão acontecer ou quando os mineradores vão esperar que os preços aumentem pode ser uma ferramenta útil para os negociadores.

Para tal, a BNC usou o Índice de Liquidação de Bitcoin (BLX) de dados de preço para rastrear a taxa de variação (ROC) do preço à vista global do bitcoin contra a mudança na taxa de dificuldade.

Isso é um diferencial para antecipar quando o preço vai atingir um determinado impulso acima da dificuldade de mineração desejável para um minerador (ou uma corretora) liquidar grandes quantias ou, em contrapartida, quando o preço estiver tão baixo que os mineradores devem esperar para que atinja um ponto de equilíbrio e entre em um território lucrativo.

A linha laranja assinala a taxa de variação do preço do BLX contra a taxa de variação na dificuldade de mineração. A linha cinza é o preço do bitcoin medido no eixo direito. O impulso do preço está atingindo níveis de “sobrecompra” em comparação aos custos de mineração quando entra em território positivo ou, quando a dificuldade de mineração aumenta mais rapidamente que o impulso de preço, a linha se move em direção à “sobrevenda”, ou seja, território negativo (Tradução feita a partir do gráfico fornecido pela Brave New Coin)

A taxa de dificuldade muda a cada 2016 blocos ou, aproximadamente, a cada 10-14 dias, e a variação de preço do BLX só é medida nos dias em que essa dificuldade mudou (a taxa de variação sendo a diferença entre ela e os 2016 blocos de preço anteriores).

Por exemplo, se a dificuldade mudasse hoje após 13 dias desde a última variação…

ROC (dificuldade) = (dif_hoje – dif_13diasatrás) / ROC dif_13diasatrás (preço) = (preço_hoje – preço_13diasatrás) / preço_13diasatrás

Os negociadores usam vários sinais de negociação de ROC, incluindo as divergências de preço e interseções de linhas centrais, mas, nesse caso, estamos focando simplesmente nos limiares de sobrevenda/sobrecompra para sinalizar a exaustão de compra e venda.

Entre abril de 2014 a 2017, o oscilador mostrou sinais de “sobrecompra” bem mais precisos, mas foi menos preciso nos sinais de “sobrevenda” (Tradução feita a partir do gráfico fornecido pela Brave New Coin)

Já que a dificuldade de mineração é uma função exponencial e os custos de entrada de energia para os mineradores são tão variáveis que encontrar um preço em equilíbrio para mineradores é um alvo constantemente em movimentação, usamos o ímpeto da dificuldade de mineração como uma variável proxy para os custos de mineração.

Encontrar pontos de exaustão no ímpeto de preço para custo com tal oscilador pode ser uma melhor variável proxy para o equilíbrio do que um alvo de preço específico.

Podemos notar que, desde outubro de 2017, o oscilador rompeu os limiares de sobrecompra na ROC (níveis de exaustão) em cerca de -20%, que se alinha com o preço mínimo em cerca de US$ 6 mil, sugerindo uma área de equilíbrio nessa época.

Geralmente, rompimentos positivos de limiares acima de ~8% antecedem uma liquidação em uma semana, exceto pela corrida entre dezembro e janeiro, que viu um aumento atípico tanto na taxa de preço como na de dificuldade, exageradas pelo spam de transações e especulação de corretoras.

Apesar de os osciladores serem mais úteis em mercados instáveis e menos úteis para negociação, essa ROC minimizou o ruído e, em relação a um pequeno tamanho de amostra, indicou uma mudança futura na tendência, de quatro otimistas e três pessimistas.

No entanto, a precisão é limitada com um pequeno tamanho de amostra e o reconhecimento que o preço é usado no indicador, além de ser a medida que estamos tentando prever.

Também há épocas em que o oscilador falhou em provocar mudanças na tendência, como em outubro de 2017, quando o sinal atingiu a sobrevenda sem mudanças na direção de preço e o aumento de preço parabólico em novembro e dezembro de 2017, quando o indicador falhou em atingir o limiar de “sobrevenda”.

Dias de bitcoins destruídos (DBD)

Quando afirmado nos gráficos da Blockchain.info e outros recursos de dados, a métrica “dias de bitcoins destruídos” (DBD) foi usada como um parâmetro para a movimentação de moedas velhas no ecossistema.

No entanto, por motivos desconhecidos, foi retirada de muitos sites, apesar de ainda poder ser encontrada da OXT.me e os dados brutos poderem ser baixados na Blockchair.

A métrica multiplica o valor de uma nova transação a uma carteira pelo número de dias que demorou para que a mesma quantia sair dessa carteira. Então, se alguém recebeu 100 bitcoins na segunda-feira e os gastou no domingo, os dias de bitcoins destruídos seriam:

Recebido: 100 bitcoins x 7 dias = 700 bitcoins destruídos

Apesar de não ser ciência pura, pode ser usada como um indicador-chave de desempenho (KPI) para atividade de rede e pode ser considerada uma alternativa para volumes de transações, já que exclui os spams de transação.

Grandes picos no DBD podem ser considerados como detentores a longo prazo que vendem (antigos) bitcoins para novos especuladores e uma queda no preço acontece em seguida.

Os maiores picos foram em agosto e novembro de 2017, seguidos da hard-fork (bifucarção drástica) financeira de bitcoin e a implementação do SegWit (“testemunha segregada”: atualização de protocolo implementada para fornecer proteção da maleabilidade de transações e aumentar a capacidade do bloco), respectivamente.

A métrica dos dias de bitcoin destruídos (DBD) foi muito abandonada por sites de dados on-chain, mas ainda pode ser encontrada na OXT.me como “BBD” (Imagem: Brave New Coin)

Contagens de transações confirmadas/diárias

O número ou a contagem de transações diárias é uma das métricas mais amplamente usadas para a saúde da rede bitcoin. Alguns a interpretam como uma demanda por atividade econômica e de bitcoin.

À primeira vista, parece uma maneira lógica de interpretar os dados, mas, se olharmos além das transações de bitcoin, poderemos ver que possuem entradas e saídas monetárias agrupadas em uma única transações, então devemos tomar cuidado ao analisar os números de transações diárias.

Transações por dia/contagem de transações diárias (Tradução feita a partir do gráfico da Blockchain.com fornecido pela Brave New Coin)

CoinMetrics, site de recursos de dados, alerta sobre o uso de contagem de transações de bitcoin para fazer a dedução de atividade econômica e sugere usar, em vez disso, uma métrica de “pagamentos por dia”, que leva em consideração as tão conhecidas “saídas de variação” (“satoshis” — bitcoins — enviados de volta ao remetente) em qualquer transação ao contar o número de saídas nas transações e subtrair uma para excluir a saída de variação.

Por trás das transações diárias de bitcoin: CoinMetrics faz uma analogia de usar o número de transações on-chain para avaliar a atividade econômica do bitcoin como um comparativo à medição da quantidade de correio postal enviado em um dia ao contar o número de caminhões de correio na estrada.

Caminhões (transações) estão cheios de caixas (saídas) que contêm inúmeras quantidades de correspondência (“satoshis’), então é impossível dizer quantas mensagens estão sendo entregues nesses veículos.

Cada transação de bitcoin tem uma entrada e uma saída, apesar de cada transação ter uma capacidade ilimitada de entremeios e cada bloco ser capaz de lidar com um número infinito de transações.

Na verdade, é uma das inovações mais subestimadas do bitcoin: cada transação pode ser um agrupamento de milhares de transferências individuais.

A métrica de pagamentos por dia conta o número de saídas de uma transação e subtrai uma (para excluir a saída de variação) (Tradução feita a partir do gráfico da Transactionfee.info fornecido pela Brave New Coin)

Quantias de Transações Não Gastas (UTXO)

Diferente da Ripple e da Ethereum, que operam em um modelo de conta/balanço, o blockchain do Bitcoin usa UTXO.

Similar às transações do mundo real, mais dinheiro é enviado em uma transação de bitcoin do que o necessário (exemplo: 1 bitcoin para um pagamento de 0,9 bitcoin), mas, em vez de o troco ser enviado de volta para você em bitcoins, é armazenado on-chain e acumulado com o tempo.

Uma pessoa pode esperar pelo troco em UTXOs para acumular e, quando as taxas de transação são baratas, repatriar a quantia acumulada.

Cada entrada de transação deve ir para a base de dados de UTXO para ser validada, senão é considerada como um gasto duplo ou uma tentativa de gasto de bitcoins que não existem.

Por trás do volume de transações: a CoinMetrics aconselha que os números de transações diárias de bitcoin poderiam ser, provavelmente, exagerados por um fator de 5-10 vezes. Isso sugere dois motivos para os blockchains de UTXO terem números inflacionados:

1. é difícil dizer quais saídas são verdadeiras e quais são variações;

2. grande parte do volume de transações de bitcoin vem de corretoras que fazem a movimentação de dinheiro, ou de mixers, e são difíceis de identificar. Bitcoin, diferente da Ethereum, funciona em um modelo UTXO, similar a como as transações são realizadas na vida real.

Volumes do lote de bitcoins

Lote é uma maneira de se usar os 2MB disponíveis do bloco para o processamento de transações da maneira mais eficiente possível. Geralmente, uma transação de lote é um grupo de três ou mais transações.

Quando um usuário envia transações frequentes ou várias transações no mesmo bloco, em vez de enviar 200 bytes de transações a cinco indivíduos, que totalizaria 1.000 bytes de espaço do bloco, elas podem agrupar todas as saídas em uma transação de 300 bytes.

Geralmente, o lote de transações acima de 4+ acontecem em corretoras, as menores variações de cor no gráfico acima (Tradução feita a partir do gráfico da p2sh.info fornecido pela Brave New Coin)

Já que as pessoas raramente têm motivos para agrupar muitas transações, os volumes de lote acima de 4+ são considerados por alguns como uma métrica de dominação de corretoras.

A inferência comum é que o crescente volume do lote de corretoras mostra que o bitcoin é usado mais para especulação do que para transações reais.

No entanto, essa visão pode ser muito simplista porque, no momento, as corretoras continuam sendo a melhor infraestrutura e o único caso de uso de negociação do mundo real para cripto até uma infraestrutura mercante ser lançada;

Por trás do lote: os volumes de transação de bitcoin também podem ser usados como uma maneira de filtrar o que as transações on-chain vindas de corretoras para discernir a quantidade total de bitcoins utilizados para especulação.

Isso se dá porque, atualmente, a maioria das grandes corretoras — mas não todas — agrupa suas transações para evitar um crescimento no preço das taxas de transações.

De acordo com um panorama mais recente dos volumes de lote, o volume das corretoras totaliza cerca de 35% da atividade on-chain.

De acordo com a CoinMetrics, apesar de as transações em lote totalizarem uma média de apenas 12% de todas as transações, elas movimentam 30%-60% de todos os bitcoins.

Para sustentar o preço, o bitcoin precisa de um grande número simultâneo de investidores a longo prazo para manter o ativo detido, além do número de transações diárias para também gerar impulsionamento a fim de criar demanda natural.

Quantidade de bitcoins armazenados ou perdidos

Para complementar os dias de bitcoins destruídos, podemos usar outra métrica para chegar a uma quantidade aproximada de moedas inativas armazenadas em “carteiras de investimentos”.

De acordo com uma pesquisa da Diar, a maioria dos bitcoins em circulação é armazenada em carteiras de investimentos:

“De forma impressionante, ⅓ dos bitcoins que estão em carteiras, com balanços acima de 200 moedas, nunca estiveram em uma transação gasta que, fora das carteiras das corretoras, poderia indicar ou chaves privadas perdidas, fornecimento real decrescente ou uma decisão muito forte pelos crentes nos criptoativos.”

(Tradução feita a partir do gráfico da Diar fornecido pela Brave New Coin)

Com outras commodities, como petróleo, aço, carvão etc., existe uma quantidade significativa de queima onde quer que o produto bruto do solo é consumido, o retirando de circulação para sempre.

Nesse sentido, o bitcoin é diferente, pois o produto bruto (apesar da entrada de energia) não é consumido. Em teoria, todos os bitcoins podem entrar de novo em circulação infinitamente.

Chainalysis estima que 30% do fornecimento de bitcoins estejam perdidos (Tradução feita a partir do gráfico da Chainalysis fornecido pela Brave New Coin)

Chainalysis, outra fonte de dados on-chain, estima que pelo menos 2,3 milhões de bitcoins e até 3,8 milhões de bitcoins estejam perdidos, enquanto 4 milhões ainda não foram minerados. Enquanto isso, a quantidade de bitcoins retidos para especulação subiu de 14% em abril de 2017 para 35% em abril de 2018,

Por trás da governança concentrada de bitcoins: de acordo com a Diar, mais de 87% de todos os bitcoins estão armazenados em carteiras com 10 bitcoins ou mais (cerca de US$ 65 mil), apenas um cumulativo de cerca de US$ 100 bilhões, que está em posse por 0,7% de todos os endereços.

O endereço de carteira mais rico, de acordo com a OXT, possui US$ 1,1 bilhão em bitcoins, e já recebeu 176 transações e enviou apenas 18 (transações de saída).

Dentre o top 20 de endereços mais ricos, existe apenas um que fez mais de 100 transações de saída (que parece ser uma corretora enviando transações em lote) e quase metade não realizou nenhum envio.

O número médio de transações de saída dentre os top 20 endereços foi 59; fora o segundo maior endereço (“fora da curva”), a média é de apenas 13 de transações de saída (Imagem: Brave New Coin)

Parece existir uma alta concentração absurdamente alta da saúde do bitcoin — apenas 0,1% dos endereços possuem 62% do fornecimento total.

Apesar de isso parecer ameaçador, do ponto de vista da manipulação de mercado, pode ser o caso de investidores que compram e retêm, já que 42% dos bitcoins retidos nas principais carteiras (mais de 200 bitcoins) não realizaram transações de saída no período pico de preços em de janeiro de 2018, e 27% dessas carteiras continuam a aumentar seu armazenamento.

Como destacamos acima, a pesquisa sobre demanda e fornecimento monetários no bitcoin está na fase inicial e ainda está sendo explorada. Reunir todos os recursos é algo valioso para aqueles que aproveitam os aspectos fundamentais do bitcoin.