Desenvolvedores da Ethereum discutem polêmico mecanismo de consenso programável
Na semana passada, desenvolvedores e contribuidores principais da Ethereum se reuniram para discutir um assunto bem controverso: EIP-1057, anteriormente conhecido como ProgPoW.
A mudança proposta para o algoritmo de hashing da Ethereum dividiu a comunidade, gerando tensão em ambos os lados.
Apoiadores querem que a Ethereum continue agradável para mineradores que usam unidades de processamento gráfico (GPU), enquanto opositores têm medo de que a mudança poderia atrapalhar aplicações existentes e diminuir a segurança da rede.
Alguns acreditam que o andamento da proposta poderia preparar o terreno para uma outra divisão de rede como de The DAO.
Desenvolvedores principais esperavam que esse debate acalmasse os ânimos da comunidade, que ficaram bravos nas últimas semanas após discussões anteriores entre desenvolvedores terem colocado lenha na fogueira sobre o tópico do ProgPoW.
A discussão uniu os representantes Kristy-Leigh Minehan (uma das criadoras do ProgPoW) e Michael Carter (educador em criptoativos), ambos a favor do ProgPoW, contra Martin Köppelmann (fundador da Gnosis, desenvolvimento de mecanismos de mercado) e Matt Luongo (CEO da Thesis, criadora de produtos e protocolos, e do Fold, aplicativo de reembolso).
A favor do ProgPoW
O sentimento geral de Minehan e Carter é que ProgPoW foi criado para manter a Ethereum resistente a ASICs (circuitos integrados de aplicação específica), assim tornando a rede mais disponível para uma ampla gama de dispositivos de mineração.
Seu objetivo também é prevenir uma situação futura em que um pequeno número de chips ASIC controlam a maioria da taxa de hash da Ethereum. Portanto, a missão bem-intencionada do ProgPoW é preservar a descentralização da rede.
Minehan também falou sobre o rumor de que mineradoras ASIC E3 da Bitmain vão parar de minerar ether no próximo mês por conta dos requisitos crescentes de armazenamento para mineradores de ether.
A pesquisa mais recente da equipe dela concluiu que cerca de 40% da taxa de hash da Ethereum vêm desses ASICs. Se as limitações de armazenamento se tornarem mais problemáticas do que o esperado, Minehan prevê que todo o poder de hash que ASICs E3 dedicam à Ethereum vai sair da rede.
Carter argumenta que toda essa queda livre no apoio de ASIC seria em “boa hora” para implementar uma mudança no algoritmo de mineração.
Embora haja chances de mineradoras ASIC serem lançadas para preencher a lacuna deixada por mineradoras E3, não é difícil ver a ironia em usar um evento futuro que pode evitar que a rede de mineradoras ASIC implementem uma mudança controversa de protocolo para se livrar de mineradoras ASIC.
A sobrecarga de armazenamento para mineradoras E3 poderia, teoricamente, tomar o protagonismo do ProgPoW sem péssimas consequências.
Contra o ProgPow
Köppelmann, por outro lado, questiona os evidentes benefícios de retirar ASICs à força da rede em comparação aos possíveis custos. ASICs podem impulsionar um nível de segurança da rede ao aumentar a taxa de hashes e, assim, o custo de um ataque de 51%.
Também não há garantia de um novo algoritmo de hashing ser resistente a um equipamento específico, já que qualquer fabricante de ASICs pode produzir um novo chip se houver a possibilidade de rentabilidade.
Martin declarou que seus receios em relação ao ProgPoW não são técnicos (apesar de um desenvolvedor de username @kikx recentemente ter descoberto uma vulnerabilidade no design do ProgPoW).
Para ele, é um problema de coordenação, já que convencer inúmeros mineradores independentes e operadores de nós a realizar uma bifurcação drástica (“hard fork”) já é uma tarefa social bem difícil.
Esse nível de dificuldade é composto se não houver um entendimento objetivo de como os benefícios de uma proposta compensam seus custos.
Luongo focou no processo de governança, ecoando o sentimento de muitos membros da comunidade que são a favor do status quo (de como era antes) ao considerá-lo em um “deslize de governança”. Ele mencionou quantos contribuidores e projetos, incluindo ele próprio, ficaram chocados ao descobrir que ProgPoW ainda estava sendo discutido.
A surpresa que não envolvia diretamente os desenvolvedores principais aponta para uma desconexão e para a necessidade em melhorar a comunicação entre os desenvolvedores e a comunidade.
Por fim, Luongo acrescenta que uma bifurcação em redes que fornecem suporte a inúmeros projetos com estado (stateful projects) está bem longe do ideal. Nem desenvolvedores nem usuários têm a palavra final no acontecimento de uma divisão de rede.
Em vez disso, as aplicações mais populares e valiosas da Ethereum, como Maker e Compound, teriam que determinar qual blockchain se tornaria o “blockchain principal”.
Chegaram a um acordo?
Ambas as duplas concordaram em dois pontos principais: (1) nenhuma mudança de protocolo vale a pena o risco de uma divisão da rede, e (2) ProgPoW se beneficiaria de uma melhor estratégia de marketing e de educação para usuários.
A maioria dos projetos e dos membros da comunidade querem minimizar o risco à plataforma, então uma proposta que visa mudar o design-base de segurança de uma rede de US$ 26 bilhões pode indicar o contrário.
Como resposta, alguns dos participantes da discussão falaram sobre a possibilidade de reformular o nome ProgPoW (por exemplo, “Ethash 2.0”) antes de apresentá-lo como uma solução contra a dominação de ASICs.
Ben DiFrancesco, fundador da ScopeLift (consultoria de engenharia de software para cripto), também falou sobre o que ele considera como “uma proposta de meio-termo”.
Em alto nível, DiFrancesco sugere que clientes devam implementar EIP-1057 (quando o código estiver pronto), mas não ativar a mudança de código. Por quê?
ProgPoW poderia agir como um mecanismo de proteção contra uma possível bifurcação iniciada por mineradores de ASICs para resistir à possível troca da Ethereum pelo mecanismo de consenso proof-of-stake (PoS). Por outro lado, permaneceria dormente, a menos que a mudança de rede fosse amplamente aceita.
A proposta de DiFrancesco parece ter agradado ambos os lados. Para os que são a favor do do ProgPoW, o novo algoritmo de mineração poderia ter um papel fundamental na proteção da rede e na facilitação da transição para a Ethereum 2.0.
Para os que são contra, essa proposta não faz com que projetos e membros da comunidade estejam sujeitos a uma mudança de protocolo que possa estar repleta de riscos.
O que vem por aí?
Os comentários sobre a proposta de DiFrancesco, do mecanismo de proteção, foram relativamente positivos. Até mesmo Ameen Soleimani, cuja reprovação pelo ProgPoW é bem-documentada, apoia o modelo de meio-termo. Isso representaria um caminho a se seguir menos polêmico a curto prazo.
Mas alguns membros parecem descontentes sobre como os desenvolvedores principais lidam com o processo de governança para EIP-1057.
Soleimani não mediu suas palavras durante a discussão, afirmando que a existência do ProgPoW é o resultado de mineradores de GPU buscando por lucros pressionando os desenvolvedores a alterar as dinâmicas de mineração a seu favor.
Outros contribuidores compartilharam da mesma opinião de Soleimani, já que o ProgPoW beneficia mais um grupo específico de mineradores do que outros.
Além disso, sua possível adesão “está favorecendo interesses específicos”. Para eles, a saga completa do ProgPow dá a entender que os desenvolvedores da Ethereum estão impondo sua vontade sem considerar as opiniões e preocupações da comunidade.
A discussão mostrou que o processo de governança “off-chain” (fora do blockchain) da Ethereum poderia ser um obstáculo em direção à descentralização.
Mas quando há um obstáculo, também há uma oportunidade: o dilema recente poderia resultar em um método mais eficaz de comunicação entre desenvolvedores principais e a comunidade, além do surgimento de interesse no processo de governança da Ethereum por usuários até então passivos.
Governança cripto deveria ser um modelo em constante evolução para que sua efetividade seja maximizada ao longo do tempo.
Em relação ao EIP-1057, a discussão terminou em aberto. ProgPoW não está oficialmente morto e pode até ressurgir sob um novo nome e EIP. Mas a discussão permitiu que lados contrários encontrassem algo em comum, ou seja, nenhuma mudança de protocolo vale a divisão da rede.
Com base nesse resultado, é provável que a resposta sincera da comunidade evite que desenvolvedores incluam EIP-1057 em uma das próximas bifurcações da Ethereum.