Delator do UBS caça tesouros escondidos em paraísos fiscais
Para John Christensen, Jersey era sua casa. Nascido na ilha cênica na costa sul da Inglaterra, o economista que trabalhava para o governo tinha uma vila na encosta com vistas para a França.
“Eu estava estabelecido”, disse Christensen no mês passado durante entrevista em um café de Londres. “Tínhamos um bom estilo de vida e muitos amigos.”
A boa vida terminou há duas décadas, quando Christensen revelou um esquema fraudulento de negociação de divisas envolvendo uma subsidiária do UBS em Jersey, o que resultou em sua mudança para Londres. Christensen, de 63 anos, passou a maior parte do tempo desde então desafiando governos e fazendo campanha contra o sigilo financeiro, inclusive em Jersey.
Representantes do UBS, que tem sede em Zurique, e do governo de Jersey não quiseram comentar.
Em 2003, Christensen cofundou a Tax Justice Network, um grupo de defesa independente que promove maior regulamentação dos paraísos fiscais. Ninguém sabe ao certo quanto dinheiro está escondido no exterior, mas economistas estimam algo entre U$ 5 trilhões e US$ 32 trilhões, ou mais de um terço de todo o PIB global. Christensen acredita que o valor estaria no topo desse intervalo.
“Vencemos muitos dos argumentos intelectuais e políticos”, disse. “E ainda não vemos isso acontecer na prática. Olhe onde estamos agora. As taxas de imposto sobre o capital colapsaram, a desigualdade disparou e estamos em um lugar muito escuro para a democracia em geral.”
Indivíduos abastados geralmente têm razões legítimas para usar centros financeiros offshore. Hedge funds dos EUA e outros gestores de recursos agrupam ativos em fundos das Ilhas Cayman para reduzir custos financeiros e administrativos.
Os paraísos offshore também podem oferecer proteção contra regimes políticos instáveis nos países de origem dos investidores. Por outro lado, a falta de transparência fez desses lugares um destino para cleptocratas, narcotraficantes e lavagem de dinheiro com o objetivo de esconder ganhos ilícitos.
Incentivados pela indignação pública após vazamentos de documentos confidenciais de escritórios de advocacia offshore, incluindo o Mossack Fonseca, do Panamá, os governos têm pressionando cada vez mais paraísos fiscais offshore para revelar detalhes previamente sacrossantos.
Mas isso também tem resultado em um jogo de gato e rato. Com os reguladores chegando em locais estabelecidos há muito tempo, os ricos avessos a impostos agora buscam arranjos em outros lugares, com Hong Kong, Londres e EUA entre os beneficiários.
A Rússia, juntamente com os países do Golfo e grande parte da América Latina, lidera o volume de dinheiro que cidadãos escondem no exterior.
O equivalente a 60% do PIB russo está no exterior, comparado com cerca de 15% na Europa continental e apenas uma pequena porcentagem nos países escandinavos, segundo Gabriel Zucman, professor de economia da Universidade da Califórnia em Berkeley.
Os russos abandonam cada vez mais um dos seus destinos favoritos: as Ilhas Virgens Britânicas, de acordo com os advogados de Moscou Sergei Alimirzoev e Mikhail Zimyanin.
O aumento da transparência financeira entre os governos e leis fiscais locais mais rígidas sobre empresas estrangeiras dificultam que russos ricos acumulem fundos livres de impostos no território anonimamente, disseram os advogados, que ajudam a criar contas no exterior para clientes.
A legislação adotada este ano nas Ilhas Virgens Britânicas e em outros paraísos fiscais também exige que empresas registradas localmente demonstrem atividade econômica real – incluindo a contratação de funcionários e aluguel de escritórios – sob o risco de pagarem multas.
Para ajudar a abolir o sigilo offshore, Christensen e a Tax Justice Network estão fazendo campanha para registros públicos de proprietários de empresas.
E os primeiros sinais de sucesso já podem ser notados. Os territórios do Reino Unido no exterior e as dependências da Coroa, de Jersey às Ilhas Virgens Britânicas, devem introduzir essa legislação até o final de 2023.
Mas a mudança não está acontecendo rápido o suficiente para Christensen.
“As forças aliadas levaram seis meses para planejar e realizar com sucesso os desembarques do Dia D”, disse Christensen no mês passado, depois que Jersey, Guernsey e a Ilha de Man anunciaram o mesmo cronograma para os registros públicos que os territórios do Reino Unido. “Thomas Edison levou dois anos para criar a lâmpada.”