Déficit zero: O que acontece se o governo mudar ou não cumprir a meta fiscal?
Na sexta-feira (27), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva jogou uma bomba no mercado. Durante um encontro com jornalistas, ele afirmou que “dificilmente” o governo chegará à meta fiscal de zerar o déficit público em 2024.
Lula ainda afirmou que “o mercado é ganancioso” e que fica cobrando uma meta que acredita que vai ser realmente cumprida. Ele também destacou que não é um problema se o Brasil tiver déficit de 0,5% ou 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB).
A declaração pegou mal com o mercado que passou a projetar um aumento do risco fiscal no governo do petistas. O Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, até tentou controlar os ânimos, mas não teve muito sucesso.
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Ontem, durante uma coletiva de imprensa para apresentar os novos diretores do Banco Central, Haddad destacou que o objetivo é garantir o equilíbrio das contas públicas e afirmou que dois fatores estão pressionando a equipe econômica: as subvenções do ICMS e a retirada da base Pis/Cofis do ICMS recolhido pelas empresas.
No entanto, ao ser questionado por mais de jornalista sobre a meta estabelecida no arcabouço fiscal, de zerar o déficit público já em 2024, Haddad desconversou e falou que a meta dele estava estabelecida.
“A minha meta está estabelecida […] Para o Ministério da Fazenda nós vamos levar medidas para que os objetivos do governo sejam alcançados”, disse.
Mudança da meta
Agora, o mais temido pelo mercado pode acontecer: o governo discute mudar meta fiscal de 2024 para déficit de 0,25% ou 0,5% do PIB, segundo informações obtidas pel’O Globo.
Conforme o jornal, aliados do presidente no governo propõem uma mensagem modificativa no projeto de lei das Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024, que ainda tramita no Congresso. Uma eventual mudança nesse objetivo poderia ser feita a partir de um pedido do governo para alteração do texto.
Integrantes do governo dizem que a fala do presidente ampliou discussão que já vinha ocorrendo, após ficar clara a necessidade de um expressivo corte de despesas para cumprimento a meta
O que diz o arcabouço?
Aprovado no início deste ano, o arcabouço fiscal determina uma meta de zerar o déficit público já no ano de 2024. Além disso, as metas para 2025 e 2026 são de superávit de 0,5% e 1% do PIB — com uma margem de 0,25% para cima e para baixo.
Caso as metas não sejam cumpridas, governo é obrigado a adotar medidas de contenção de gastos. Além disso, as despesas no ano seguinte poderão crescer apenas 50% em relação ao aumento das receitas do ano anterior (se a meta é atingida, as despesas podem avançar 70% do total variado na arrecadação).
A Fazenda criou uma série de medidas que ajudam a aumentar as arredações. No entanto, os projetos precisam passar pelo aval do Congresso, que não vem facilitando para a equipe econômica. Estão nas mãos dos deputados e senadores textos como a taxação de fundos offshore e exclusivos, taxação sobre apostas esportivas, reforma tributária, entre outros.
Lula ficou de se encontrar com Haddad e os líderes do Congresso para tentar agilizar algumas pautas. A taxação de fundos offshore e exclusivos, por exemplo, só passou pela Câmara dos Deputados depois que o presidente tirou Rita Serrano do comando da Caixa Econômica Federal para colocar um indicado do Centrão.
Crise fiscal gera tensão dentro do governo
Do lado político, a mudança ou o não atingimento da meta fiscal pode resultar em um racha dentro do governo. Segundo informações do Valor Econômico, a mudança da meta coloca Haddad e o chefe da Casa Civil, Rui Costa, em pé de guerra.
Enquanto Haddad tenta defender o equilíbrio fiscal e manutenção da meta zero, Rui Costa defende a revisão do número para 0,25% ou 0,5% do PIB. Oficialmente, a meta de déficit pode ser alterada por iniciativa do governo até a votação do parecer preliminar da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) pela Comissão Mista de Orçamento (CMO).
O deputado Danilo Forte, relator do projeto de LDO de 2024, já afirmou que está disposto a revisar a meta fiscal proposta para o ano que vem, caso haja consenso entre lideranças políticas.
Por outro lado, Haddad vem ganhando apoio do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. Ontem, ele disse que seguir em um caminho diferente do orientado pela equipe econômica “colocaria o país em rota perigosa”.
Como fica a economia?
Do lado econômico, a desconfiança com o fiscal pode contaminar a inflação e as decisões de política monetária. Os analistas do UBS BB apontam que, a princípio, as falas de Lula e discussão sobre a meta não são um risco iminente para a política fiscal, mas sim a médio prazo.
Pelas projeções do banco de investimentos, o défice primário nacional deve ser de 1,3% do PIB este ano. Além disso, a estimativa é de um déficit de 0,9% para o ano que vem, ante o consenso de -0,7% do mercado.
“É importante monitorar se os comentários se referem a uma crítica potencial que não é do objetivo, mas da própria regra de despesas. Se a regra de gastos for alterada, pensamos que seria um verdadeiro problema para os mercados”, aponta o relatório.
*Com Lorena Matos