De volta ao velho continente? É hora de ser cauteloso com o rally das bolsas europeias; saiba por quê
Esse começo de ano tem trazido algumas surpresas para nós, investidores. E a ótima performance de alguns dos principais índices europeus, sem dúvidas, é uma dessas novidades…
Dentre as principais economias do continente europeu, apenas os índices da Espanha e da Itália seguem longe das máximas observadas no início dos anos 2000 e dos patamares atingidos antes da Grande Crise Financeira de 2008.
Por outro lado, os índices da Alemanha, Reino Unido e França já passaram as máximas desse ínterim. Isso, mesmo com as dificuldades enfrentadas por esses países nos últimos meses, principalmente por conta dos impactos decorrentes da guerra entre Rússia e Ucrânia.
Confira o desempenho dos índices europeus
Apesar de acreditarmos que essas economias ainda não estão livres de problemas relacionados a sua matriz energética, fato é que os percalços esperados pelos analistas para a última temporada de inverno não acabaram se concretizando (em grande parte por conta do clima ameno na região).
Para quem acompanha essa coluna há mais tempo, pode ver que conseguimos aproveitar uma pequena parte dessa valorização, com a sugestão de compra de algum ETF para expor o portfólio a essa região.
Os ganhos não foram grandiosos, é verdade — esses ETFs se valorizaram pouco mais de 3% (em reais) desde então.
Mas, ao menos, a parte do investidor que estava disposto a correr esse risco entregou, pelo menos, o retorno da Selic no período.
Europa deixa Ibov e Wall Street no chinelo
Quando comparamos com as variações do S&P 500 e do Ibovespa (IBOV), aí podemos dizer que a escolha pela Europa se mostrou uma melhor opção: enquanto o principal índice americano ficou no zero a zero, o índice brasileiro recuou mais de 9%.
Mas caso a guerra continue por mais algum tempo, e esses países enfrentem dificuldades para reabastecer os seus estoques de energia para o novo inverno, podemos ver um recuo nesses índices.
Além disso, a inflação segue sendo um problema relevante para essas economias. Na semana passada, os números divulgados no Reino Unido, de uma alta de 10,1% nos preços, veio abaixo da leitura do mês anterior (10,4%) mas acima das estimativas dos analistas (9,6%).
Ou seja: nos parece que essa empolgação levou os mercados para patamares demasiadamente otimistas.
Além disso, o recente rebote nos principais índices europeus, que valorizaram mais de 10% desde meados de março, parece ter reduzido o potencial de valorização na região na visão de alguns estrategistas.
Segundo uma pesquisa da Bloomberg, a média da projeção para o índice Stoxx Europe 600 é que ele encerre 2023 perto dos 450 pontos, ante os 463 pontos atuais. E a estimativa mais otimista acredita que o índice termine o ano nos 480 pontos.
Neste caso, entendo que possa ser uma boa encerrar aquela viagem de curta duração sugerida ao final de janeiro, com aqueles que seguiram a sugestão vendendo seus ETFs e esperando um ponto de entrada melhor no futuro.
Mas para aqueles com uma maior propensão ao risco, os patamares atuais de um país específico dá a oportunidade para uma operação short.
Vale lembrar que fazer um short não é uma operação simples e nem para todos os investidores, além de envolverem maiores riscos do que uma simples compra de um ativo.
Na França, a situação é ainda mais complicada dado os recentes protestos da população contra as medidas implementadas pelo presidente Emmanuel Macron — muitas vezes causando o caos para o país como um todo.
Mercado de luxo
Um ponto importante para se ter em mente é que essa ótima performance das bolsas europeias está calcada na forte valorização das empresas de consumo de luxo, como LVMH, Hermès e Kering. Essas companhias tiveram um impulso da reabertura chinesa, e suas ações tiveram altas superiores a 22% nesses primeiros 4 meses do ano (somadas, elas representam um terço da alta do CAC 40 no ano).
O problema, na nossa visão, é que apesar dessas empresas focarem em clientes de maior renda, que tendem a sofrer menos com uma desaceleração ou até mesmo recessão econômica, estão negociando por múltiplos bastante esticados em relação à média de mercado. A famosa “margem de segurança” passa longe desses cases.
A LVMH, por exemplo, está avaliada por 27 vezes seus lucros futuros para 2023; a Hermès negocia por impressionantes 53 vezes. Já a Kering é a única que tem um múltiplo mais comportado, na casa das 17 vezes.
Mas mesmo as outras empresas, de outros segmentos e públicos, também não estão tão baratas assim: a L’Oreal, por exemplo, negocia com um múltiplo Preço/Lucro projetado de 36 vezes; a Air Liquide, fabricante de gases industriais, está na casa das 25 vezes; a Airbus, que faz aviões, está valendo 23 vezes seus lucros para 2023.
Dessa forma, parece que novas altas para o índice dependeria de uma melhora nas condições macro que ainda nos parece distante. Entendo que uma posição vendida no iShares MSCI France ETF (B3: BEWQ39 | NYSE: EWQ) seja interessante para um futuro mais cauteloso das bolsas europeias.
Enzo Pacheco é formado em Administração pela Universidade Federal do Espírito Santo e pós-graduado em Operador de Mercado Financeiro pela FIA. Um entusiasta do assunto “investimentos” — tendo se interessado desde os tempos de universitário —, desde 2017 foca exclusivamente na análise dos mercados internacionais nas séries da Empiricus voltadas a esse propósito (Investidor Internacional e MoneyBets).