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Davos, Alemanha, nova lei e La Niña: As tendências do agro para 2024

23 jan 2024, 14:31 - atualizado em 23 jan 2024, 14:31
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Regulação do mercado de carbono, questões climáticas e a “quarta fase” da Lei do Agro são alguns dos temas no radar do setor  (Imagem: Unsplash/@jediahowen)

Na última coluna, a primeira do ano, tratamos sobre a análise SWOT do agro e a visão dos desafios e perspectivas para o setor em 2024.

A receptividade positiva para o tema nos obrigou a aprofundar ainda mais a análise.

Porém, tratando o tema de forma mais específica, sobre alguns pontos mais vinculados às questões legais, desdobramentos dos marcos regulatórios e fatores de ordem política que o agro, em maior ou menor grau, deverá enfrentar em 2024.

Quarta fase da Lei do Agro

Esse ano, entra em vigor a “quarta fase” da Lei do Agro, a Lei n. 13.986, de abril de 2020, que torna obrigatório o registro eletrônico de todas as Cédulas de Produto Rural (CPRs), emitidas pelos produtores rurais para financiamento de sua produção agropecuária em sistemas de aprovados pelo Banco Central do Brasil (Bacen). 

Até o ano passado, as CPR com valores de até R$ 50 mil não precisavam do registro para ter validade. Porém, desde o dia 1º de janeiro deste ano, não há mais a isenção de registros para as cédulas vinculadas a qualquer valor de emissão.

Portanto, espera-se no mercado como um todo um aumento considerável no número de registros dos títulos emitidos. Títulos esses, que no ano passado, somaram a quantia recorde de aproximadamente R$ 300 bilhões em estoques de títulos registrados.

Vale lembrar que os Fiagros, LCAs e CRAs, além de outros títulos, também tiveram incremento substancial em termos percentuais, de 170%, 49% e 28%, respectivamente, de 2022 para 2023, segundo último levantamento disponível do Ministério da Agricultura (Mapa).

Porém, vamos manter o ponto de atenção acerca da redução de expectativas da safra para esse ano, além dos riscos climáticos e potenciais problemas de entregas de produtos.

Efeitos nocivos das mudanças climáticas na variação de custos e preços

O “rebote” decorrente dos fenômenos “El Niño” e “La Niña” – o último, esperado para julho de 2024, com efeitos negativos para a produção agropecuária -, se reflete nas estimativas da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) divulgadas na semana passada.

Segundo o órgão, a produção total da safra de grãos em 2.024 deverá ficar em cerca de 306,4 milhões de toneladas, representando redução em relação à última safra.

Além dos efeitos das mudanças climáticas, há ainda o aumento significativo nos custos dos insumos do ano passado para cá e que, certamente, vai estrangular as margens do produtor rural causando diminuição da renda no campo.

Isso já se faz sentir no mercado como um todo, principalmente ocasionando a “quebra” de vários contratos de entrega de produtos, assim como de situações de “estresse teste” de garantias e estruturas jurídicas que apoiam operações de estruturação e de financiamento do agronegócio a partir dos novos instrumentos disponíveis no mercado, incrementados pelos números acima citados.

Dessa maneira, pedidos de Recuperação Judicial de produtores rurais e contencioso judicial na cadeia ampla do agronegócio, podem favorecer um sentimento de desconfiança e pessimismo que tende a atrapalhar a retomada da produção.

Não é positiva uma onda de renegociações forçadas judicialmente podendo redundar na vulneração de relacionamentos comerciais de longo prazo – entre os integrantes da cadeia – o que pode frustrar a disponibilização de novos recursos para o financiamento de safras futuras afetando, inclusive, o credit score de risco e afugentando novos investidores em Fiagros.

Tal cenário, tende a fazer com que os potenciais efeitos econômicos das quebras de contratos, queda de preços, margens e produtividade sejam mais duradouros e possam impactar negativamente safras futuras.

Gestão, muita paciência, “canja de galinha”, habilidade negocial e expertise na utilização das ferramentas jurídicas disponíveis para a repactuação dos contratos e refinanciamento aos produtores rurais e demais elos da cadeia podem fazer toda a diferença em uma conjuntura baixista como essa.

Regulação do mercado de carbono no outro lado da mesa

Além disso, eventuais margens e ganhos adicionais (renda no campo), que poderiam chegar ao produtor rural por conta da colocação no mercado de produtos agroambientais, como créditos de carbono, por exemplo, emitidos e lastreados por CPR -Verde e até por outros instrumentos jurídicos, podem não se tornar realidade para o produtor ainda nesse ano.

O atraso na entrada em vigor da regulação já aprovada no Congresso Nacional que tornaria obrigatório (regulado) e não apenas voluntário, o mercado de créditos de carbono no Brasil, pode representar mais um desafio prático nessa construção.

Isso ocorre porque ainda existem discussões no âmbito do Senado Federal, conforme atestou a própria ministra do Meio Ambiente em pronunciamento recente no 54º Fórum Econômico Mundial que ocorre em Davos, na Suíça, que podem inviabilizar essa mudança de paradigma para 2024.  

Como temos dito à exaustão por aqui, a regulação não resolve todos os problemas desse mercado – que ainda precisa de parâmetros tropicalizados para desenvolvimento das métricas para a nossa agricultura, além de outros fatores –, mas em um momento como este de aperto de margens de lucro e diminuição de produção, seria um alívio para os nossos produtores poder contar com essa possibilidade.

Assim, parece que aplicar qualquer viés ideológico ao tratamento da questão pelas autoridades constituídas nesse momento a despeito do olhar favorável do mundo à agricultura como “arma” de enfrentamento às mudanças climáticas, o que foi consolidado pelas discussões e consensos produzidos na COP-28 ocorrida no final do ano passado, mostra-se como um fator de preocupação a mais com a qual teremos de lidar em 2024.

Conclusão

Dito isso, continuamos olhando para o ano de 2024 e enxergando a gestão dos negócios na Cadeia Ampla do Agro, tanto “dentro” quanto “fora da porteira”, como o grande desafio a ser vencido no SWOT esmiuçado na coluna anterior. 

Adicionamos, além disso, que o nosso olhar sobre as oportunidades também se encontra focado na gestão, mas que, talvez, a distopia a ser enfrentada neste quesito, diz respeito ao olhar sobre as políticas públicas que em um ano eleitoral que estamos vivendo – localmente e em escala global – pode criar outras perspectivas impactando mais do que deveria na gestão dos negócios e nos melhores cenários e estimativas para o agro no ano. Ainda mais quando se trata de pensarmos no agronegócio como ferramenta para ajudar a assegurar a sustentabilidade das cadeias globais de fornecimento no curto, médio e longo prazos.

É dizer que os recentes comentários/posicionamentos de nossa atual ministra do Meio Ambiente em Davos dão uma ideia do quão difícil é misturar ideologia em uma discussão dessa natureza, principalmente, quando estamos tratando de um setor como o agronegócio brasileiro, que tem condições de se firmar como um dos principais facilitadores da implementação das políticas públicas de sustentabilidade em nível mundial.

Por isso, é importante ficarmos de olho no que está acontecendo na Alemanha ultimamente – que está sendo sacudida por manifestação de produtores rurais –, para não esquecermos que o desafio que nos foi posto é de produzir mais, melhor e com menor impacto ambiental fornecendo alimentos para a grande maioria da população nacional e mundial.

Comida de qualidade, abundante e mais barata, fibras e componentes sustentáveis para a indústria internacional, nova matriz energética para que nossos filhos e netos vivam com a mesma qualidade de vida e expectativas de futuro das gerações atuais.

Tudo isso faz parte de uma demanda tão central e tão para lá de óbvia nos dias de hoje, que torna-se difícil ignorá-la em nome de “bandeiras” defendidas por pouquíssimos privilegiados que muitas vezes não convivem ou não compreendem as necessidades básicas da população em geral e do mercado como um todo em relação aos novos paradigmas de produção sustentável. 

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