Agronegócio

CVM define regras para CRA de varejo e reforça regras para securitizadoras

02 ago 2018, 11:59 - atualizado em 02 ago 2018, 12:01

Por Angelo Pavini, do Arena do Pavini — A Instrução 600, nova norma de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA), divulgada hoje pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), tem o grande mérito de trazer segurança jurídica para esse mercado, afirma Antonio Berwanger, superintendente de desenvolvimento de mercado da CVM. Até agora, era aplicada para essas operações a norma de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI), que nem sempre tem um “encaixe perfeito” com as ofertas de CRA, lembra ele. Os CRAs são títulos de renda fixa garantidos por recebíveis (duplicatas, notas promissórias e outras dívidas) emitidos por empresas ligadas ao agronegócio e que pagam juros que não estão sujeitos ao pagamento de imposto de renda para pessoas físicas.

Por isso, admite, o mercado ficou um bom tempo sem uma segurança jurídica sobre que tipo de ativo serviria de lastro para as operações de CRA, por exemplo, usando como referência decisões do colegiado ou consultas. “Consolidamos os conceitos e as resoluções da CVM tomadas até aqui sobre o assunto foram pavimentando esse caminho, definindo o que serviria de lastro para CRA e outros pontos”, diz. Isso vai reduzir a insegurança jurídica não só para o mercado, mas também para a própria CVM, com na hora de registrar e acompanhar as operações.

Avanços em CRA e CRI também

A nova norma traz também algumas obrigações e deveres importantes para as companhias securitizadoras, que são fundamentais para os CRAs e CRIs, lembra Berwanger. Elas têm papel relevante no fluxo de recebimento e pagamento e no controle dos recebíveis, que servem de garantia para os certificados. “Assim aproveitamos e regulamentamos essas atividades das securitizadoras e algumas coisas dos produtos, como as assembleias e seus quóruns”, afirma Berwanger, admitindo que a regulação do CRA foi além da do próprio CRI, que poderá ser revista também.

Alguns pontos do CRI já foram inclusive alterados, explica Bruno Gomes, gerente de investimentos estruturados, da CVM. As principais mudanças foram com relação ao regime informacional do CRI, que passou de trimestral para mensal. O CRA já nasceu mensal. E as informações contábeis de cada emissão também foram padronizadas, lembra Gomes. Agora, para cada emissão de CRI e CRA, a securitizadora vai ter de produzir um balanço separado e auditado. “Isso vale tanto para o CRI quanto para o CRA”, diz. Além disso, foram feitos esclarecimentos sobre a divulgação de atas e fatos relevantes, que serão divulgados separadamente para cada emissão, o que aumenta a transparência desse mercado.

Investidor de varejo

A norma traz também regras específicas para quando a oferta é destinada para o investidor de varejo, afirma Berwanger. “Buscamos dar mais segurança e mais proteção para o investidor de varejo”, diz. A estrutura dos CRAs ficou semelhante a um regime fiduciário, com patrimônio apartado da securitizadora, para garantir mais transparência. “Com isso, as contas do balanço patrimonial de cada emissão não se comunicam com o patrimônio da securitizadoras”, explica Bruno Gomes.

Restrições para recebíveis do próprio grupo

Uma norma importante diz respeito às vedações, mas elas se referem mais aos CRIs do que aos CRAs. A secutirizadora não pode adquirir direitos creditórios de empresas ligadas. O objetivo, explica Gomes, é evitar que as securitizadoras comprem recebíveis de incorporadoras que as controlam. “Grandes incorporadoras tinham securitizadoras que montavam CRIs e compravam recebíveis da própria incorporadora”, afirma Gomes. Por isso, a CVM criou a vedação, que já vale tanto para o CRI quanto para o CRA.

Ofertas até R$ 100 milhões

Berwanger destaca também a possibilidade dada pela norma de as securitizadoras realizarem ofertas até R$ 100 milhões sem contratação de um intermediário. “Era um pleito das securitizadoras quee busca reduzir o custo das operações que não são tão grandes e não precisam de esforços tão grandes para fazer a emissão”, comenta. Assim, as securitizadoras podem aproveitar a sua base de clientes. “Provavelmente serão mais ofertas com esforços restritos, não de varejo”, explica Berwanger.

Varejo mais seguro

A maioria dos CRAs emitidos foram para investidores qualificados, até pelas dúvidas sobre o uso das regras dos CRIs para varejo. Por isso, foram criados alguns critérios específicos para a oferta do CRA no varejo, explica Bruno Gomes. Entre eles estão a exigência de uma retenção de risco dos recebíveis pelo cedente ou por terceiros, a menos que o CRA esteja vinculado a um único devedor ou a vários devedores sob controle comum. Haverá ainda um limite de 20% de exposição por devedor do total emitido, a menos que ele seja uma companhia aberta ou instituição financeira. Os recebíveis também terão de ser performados, ou seja, a mercadoria já deve ter sido entregue ao comprador e o serviço prestado. E o CRA de varejo deve ter um cedente único, ou ter subordinação ou coobrigação pelos recebíveis, para que se saiba com facilidade quem é o devedor e seu risco. “O investidor de varejo vai entrar em um título com caraterísticas próximas de um título de renda fixa”, afirma Gomes.

Números com nomes agora

Foram criados ainda padrões de nomenclatura para as emissões de CRA para que elas possam ser mais facilmente identificáveis pelos investidores, explica Gomes. “Hoje o investidor vê só números das emissões, então buscamos padronizar essa numeração e estabelecer nomes, a partir do nome da securitizadora e do devedor único”, explica. A padronização pode ajudar depois a ajudar no mercado secundário de CRAs, que já existe, mas não é tão ativo.

Normas devem ser esboço para regulação de securitizadoras

Umas das preocupações da CVM ao regulamentar o CRA foi com o papel da securitizadora, explica Berwanger. “No CRI, elas não tinham nenhuma responsabilidade e vedação, nunca teve regra própria”, explica. Por isso, a norma de CRA já traz algumas vedações e regras. “Trouxemos a primeira regulamentação, o primeiro esboço para as securitizadoras dentro da norma do CRA”, afirma.

Essas normas estão dentro do que a CVM espera trazer para uma regulamentação específica para as securitizadoras, explica Berwanger. “As normas levam as securitizadoras mais para o mundo do administrador fiduciário do que do emissor”, afirma. Hoje, elas estão na norma de companhias abertas, mas seu papel deve ser de administrador fiduciário, que controla, presta contas, acompanha, mas não respondem com o patrimônio pela operação. “A ideia seria ter uma regra geral para as securitizadoras, mas adiantamos um pouco isso para o CRA e mais adiante trataremos de uma norma específica”, explica.

Anbima vê mais segurança e transparência

A regulamentação dos CRAs veio cem por cento dentro do que o mercado esperava, diz Flávia Palácios, coordenadora do grupo de trabalho de CRI e CRA da Associação Nacional das Instituições do Mercado Financeiro e de Capitais (Anbima). “Há muito tempo vínhamos usando uma instrução para emitir CRA que não era dele”, afirma, lembrando que, apesar  das semelhanças, cada recebível tem uma dinâmica específica. Faltavam assim normas que tratassem de questões particulares do produto. “Estávamos rodando com uma norma emprestada e agora a CVM consegue apresentar as questões concretas que estava vendo”, diz.

Flávia divide a norma em dois grandes pontos. O primeiro é trazer clareza sobre o que se entende como lastro do CRA. Para o mercado, isso traz uma segurança jurídica muito grande. “Concordando ou não, já se sabe o entendimento da CVM e não se tem mais receio de a CVM rejeitar determinado lastro”, explica.

Responsabilidade da securitadora

Outro ponto é sobre a atuação e deveres da companhia securitizadora, que veio mais detalhada, e é o segundo pilar da nova norma. “Ela é bem alinhada com intuito da Anbima, de trazer mais transparência ao mercado, ao estabelecer um regime informacional, transparência de dados e classificação do produto” explica Flavia. Com isso, a CVM deixa claro o escopo da companhia securitizadora, que que ela é emissora do papel, não é garantidora. “A responsabilidade pelo papel é do patrimônio separado do CRA, a securitizadora não tem responsabilidade financeira por ele, mas é responsável pela transparência e segurança.”

A norma também deixa mais claros os pontos para que o CRA ser oferecido a investidores de varejo, que eram semelhantes aos do CRI. “A norma deixa bem claro o que pode ir para o profissional, para o qualificado e para o varejo”, afirma.

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